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terça-feira, 9 de janeiro de 2018

O LIVREIRO DE CABUL de Åsne Seierstad

Livro 35


Åsne Seierstad é uma jornalista norueguesa que, a serviço de sua profissão em Cabul, visitou uma família afegã típica e “se convida” a permanecer em sua companhia, por três meses para conhecer os costumes, as dificuldades e o dia a dia que todos enfrentavam.

Ela não descreve, nesses três meses como se acomodou com as mulheres afegãs da família do livreiro.

Eu neste caso não posso transcrever trechos mais significativos do livro por causa dos direitos autorais, mas vou tentar pela lembrança de suas páginas, dizer algo mais significativo que para mim foi um misto de perplexidade, mal estar e emoção.

Gostei do livro.





















Åsne Seierstad visitava Cabul logo após a expulsão do talibã que fora um atraso de vida para os afegãos. Sem eles, esperavam os afegãos nova vida, mais liberdade e progresso até mesmo na vestimenta. Mas, no tocante às mulheres, quão oprimidas eram elas talvez ainda pelo ranço talibã pelo cumprimento radical dos mandamentos da sharia – código de leis islâmicas.

O vendedor de livros de Cabul, nome fictício adotado, Sultan Kahan tinha ideias importantes em retomar a literatura, os livros de história e cultura afegã, proibidos pelo talibã. 

Nos tempos de domínio talibã, a maioria dos seus membros analfabeta, era comum a queima de livros ditos proibidos e até cartazes encontrados nas suas livrarias.

Livre dos talibãs, além de livreiro passara a ser editor.

E nesse objetivo trabalhava muito.

Para manter suas livrarias, porém, exigia, sem aceitar qualquer restrição dos filhos que eles trabalhassem doze horas por dia sem descanso. Um dos seus filhos, de 12 anos praticamente não via a luz do sol porque trabalhava na livraria de hotel semidestruído, 12 horas por dia.

Para se sentir uma mulher afegã, relata a autora que não poucas vezes usou a burca, vestimenta que passou a odiar porque uma peça que apertava, dava dor de cabeça e se enxergava mal através da rede bordada.

As mulheres eram de muitas maneiras, psicológica e moralmente massacradas porque não poderiam sair sozinhas. 

Se nascesse um menino, festa na família. Se nascesse menina, a indiferença.

Elas não escolhiam seus maridos. Havia uma negociação entre a família do noivo e da noiva. Se houvesse o acerto financeiro, isto é, a entrega de recursos à família da noiva, o pagamento das festas, a compra de suas roupas, o acordo era fechado. Os homens da casa mandavam.

Mesmo assim, muitos casamentos se acomodavam, 'davam certo'. Mas o marido poderia casar uma segunda ou terceira vez.

Um dos personagens que aparece no livro depois de dois casamentos, já com mais de 70 anos diria que precisaria de uma terceira esposa porque as outras duas haviam envelhecido.

O próprio livreiro, embora bem casado, resolveu se casar com um jovem muito bonita de 16 anos, tímida e analfabeta contrariando toda sua família e sua primeira esposa – que depois de adaptou à situação irreversível. 

Sendo o filho mais velho, órfão de pai, mantinha a família toda, incluindo a própria mãe, num regime severo.

Há dois episódios que revoltam e emocionam.

O primeiro foi o do marceneiro que roubou cartões postais com estampas diversas escolhidas pelo livreiro.

Esse marceneiro era muito pobre, sustentando precariamente família grande, Sultan não o perdoa e exige que ele confesse a quem vendeu os tais cartões. Enquanto, na frente de toda a família, seu pai o açoitava sem dó, inconformado pelo filho ladrão. Mesmo assim toda sua família, esposa e avó imploravam o perdão, abaixando-se aos pés de Mansur, o filho mais velho do livreiro que não pode perdoar porque o pai não permitia.

O marceneiro, mesmo confessando a quem vendera os cartões e se o fizesse teria a liberdade foi preso cumprindo pena de três anos.

A outra cena que menciona é a personagem Leila, a irmã mais nova de Sultan Kahan era tratada com descaso pela família mesmo sendo a verdadeira criada que limpava a casa várias vezes pelo pó em suspensão permanente em Cabul além de preparar toda a comida ansiava uma saída para se libertar da verdadeira escravidão, numa casa pequena de quatro cômodos.

Sempre com muito medo tentou ser professora de inglês sem conseguir muito pela burocracia afegã e, nesse período teve um pretendente fora do círculo familiar ou escolha de sua família.

Tudo ficou sem resposta quando sua mãe (Bibi Gul) brigou com o filho Sultan e deixou a sua casa acompanhada de seus filhos, incluindo Leila que até ali nada havia obtido.

Surpreende saber que na região da cidade de Khost a leste do país, na qual as mulheres são trancafiadas em casa, não podendo se expor, haja a prática homossexual a ponto de dois comandantes por ciúmes de um dos rapazes amantes, resultando em dezenas de mortos.

Lendo o livro se concluiu que Sultan Kahan fora um chefe de família despótico, colocando seus negócios de livros e a segunda esposa acima de tudo e de todos. 

Inconformado pelo teor do livro acionou a Autora na Noruega, em busca de reparação judicial. 

Mas, por causa do livro, passou a dar folga de um dia por semana aos seus filhos.

O livro foi lançado em 2002 e se tornou um best seller. Hoje (2017/2018), a paz, a modernização – trocar as armas por computadores - que contava o povo afegão, tão sofrido, vivendo num país praticamente destruído não parece tenham obtido.

Notícias recentes informam ataques a bombas violentos promovidos pelo talibã e EI – estado islâmico.

As interpretações divergentes ou distorcidas do Alcorão tem resultado em atentados que provocam  vítimas entre os próprios islâmicos sem que haja preocupação com o modo como seguiam os mortos as doutrinas do dito livro sagrado.


Estátua de Buda 

O talibã dinamitou em março de 2001 a estátua de Buda de 1500 anos, com 53 metros de altura no Vale de Bamiyan, Afeganistão. Era considerada patrimônio da humanidade.  Esse ato foi uma afronta às crenças e cultura ocidentais.

A estátua antes e o vazio depois da destruição.








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