Translate

sexta-feira, 17 de abril de 2020

CRIANÇAS DE GROZNI de Åsne Seierstad

  [Um retrato dos órfãos da Tchechênia]

LIVRO 70























Grozni é a capital da Chechênia.

Sim da Chechênia um estado que faz parte da Federação Russa. 
Ora, um região tão distante. Qual o interesse?

Mas, o livro de Åsne Seierstad embora possa ter alguns páginas além do necessário (são mais de 400 páginas), houve momentos  bastante interessante porque, sobretudo, revela costumes muçulmanos moderados da Chechênia e dos próprios russos que se expostos durante conflitos sangrentos.


A Autora muito jovem, nascida no ano de 1970 com poucos mais de 20 anos, se embrenhou naquela região de conflitos, tragédias e ódios como jornalista, correspondente de guerra


Ela é autora da obra "O Livreiro de Cabul" livro que se tornou um best-seller até porque o indigitado livreiro contestou seu relato. (*) 

 https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi3CyFYlXMaEjEPSRkiCzLbRrLWsCbAOR_aEtcA03MyiRWG5tTQo5DwoJXsnaBuM1R2Ky0iIQfKzqN2QiVFoadkBq_bRdiSmpPNW3CES0h8ZS_XBF2Qxb107mIB8aYrYcvjjvwtnEhTpFBO/s320/Chechenia+1.jpg 

O povo da Chechênia durante a 2ª Guerra mundial, em 1944 foi acusado de estar aliado aos nazistas (chamados de fascistas no livro). Por essa desconfiança,  1/3 de sua população, por ordem de Stalin, coordenado pelo "carrasco" Beria foi deportado para a Sibéria em condições degradantes.

Somente em 1956, com a ascensão de Nikita Kruschev é que os sobreviventes puderam retornar à "pátria".

A Rússia em 1994 decidiu invadir a Chechênia que declarara sua independência 3 anos antes.

A invasão no geral foi um desastre, uma fragorosa derrota do exército russo surpreendido pelas forças chechenas muito além do esperado, que usaram granadas atiradas do alto dos prédios, incendiando os tanques russos. À fuga os soldados russos foram massacrados.


É que segundo revelado por altas fontes militares, o comandante russo Gratchov (Boris Ieltsin estava internado) teria resolvido atacar Grosni, a capital, por um capricho, após uma bebedeira.


Esse desastre humilhante foi transmitido pela televisão russa.


Em 1996 foi assinada a paz entre a Rússia e a Chechênia. Do ponto de vista político, a Chechênia tornara-se independente.

Mas, a paz fora relativa, porque ataques russos desde 1999 em solo checheno, revidavam escaramuças chechenas. O governo não conseguia controlar seus radicais. Mas, a Autora não diz isso.

Na sequência, violências extremas se deram por atos terroristas radicais chechenos, geralmente muçulmanos.

Em 2002, na invasão terrorista de um teatro nas imediações de Moscou, resultou em 200 vítimas. Um outro, mais grave, em 2004, ao invadir uma escola em Beslan com 1000 alunos (crianças), os terroristas executaram 314 pessoas a maioria crianças e ferindo cerca de 700 outras.

Já sob o poder de Vladmir Putin, nomeado que fora por Ieltsin, o conflito assumiu grandes proporções com milhares de vítimas de lado a lado e a capital Grozni destruída pelos russos e, nos seus escombros, as tragédias e o ódio mútuo entre os contendores.

O livro de Seierstad foi escrito em 2007. Ela revela que por ordem de Putin dera-se a reconstrução da Grozni e da Chechênia, a ponto de membros ligados à cúpula do governo checheno ou meros servidores o terem em boa conta, porque além das melhorias que patrocinava, houvera a paz relativa com governo nomeado e subordinado a Moscou. Desde então, 2007 até agora, a Chechênia e governada por Ramzan Kadyrov que a Autora entrevistou cujo teor da entrevista consta do livro.


Não vou a detalhes da obra com transcrições porque as advertências na edição, as impedem expressamente.

A Autora esteve pelos idos da primeira guerra Rússia-Chechênia em 1994/1996 viajando pelos dois países. Voltou depois em 2006 quando colheu mais informações e relatos das pessoas diretamente influenciadas pelos conflitos, convivendo com elas por algum tempo. 

Esse o "caldo de cultura" da obra da Autora norueguesa.


Para viajar à Rússia e à Chechênia, muitas vezes a Autora, clandestinamente, alojou-se em modestas casas de ex-insurgentes, daquelas vítimas irrecuperáveis física e moralmente, ou que perderam membros da família, sofreram prisões ilegais e sem causa vivendo com elas todas as angústias do ódio e da reparação impossível. Essas experiências humanas colhidas tinham por objetivo constituir um quadro para o livro.


Mas, e as crianças de Grozni?


Um relato emocionado dos atos de caridade incondicional do casal Hadizat e Malik que atenderam a pedido da nova "administração de paz" da cidade, receberam algumas crianças que dormiam nas ruas porque perderam os pais, os parentes e não tinham onde ficar. Com o tempo, com a ajuda das autoridades locais, ganhando dois apartamentos para tanto, cuidavam de 50 crianças incondicionalmente.


Hadizat e Malik foram apelidados de os anjos de Grozni!


Mas, é relatada a tragédia dos irmãos Timur e Liana que perderam os pais durante a guerra que a Autora parece estabelecer como uma média dos efeitos danosos sobre muitas dessas crianças.


Timur e Liana foram viver com um tio, um sujeito alcoólatra que chicoteava a ambos para que obtivessem algum dinheiro, diariamente. Liana fora violentada sem parar por esse tio.


Timur antes de chegar à casa de Hadizat era malvado, matava cachorros a pedradas e Liana por todos os traumas pouco conseguia aprender na escola. Ela roubava tudo o que podia da casa, trazendo muitos transtornos e desgostos a Hadizat que não a punira nunca severamente. 


Liana dizia que não conseguia parar de roubar. Timur, seu irmão, que prometia, um dia, matar o tio violento, deixara de a considerar sua irmã por causa desses roubos constantes.


Mas, Liana entregando a Autora um bilhete, pediu desculpas emocionadas à mamãe Hadizat que muito fazia por ela.


MORAL DA HISTÓRIA


Pelo que eu saiba aquele ódio pós guerras, depois de mais de um década pode ter arrefecido.


Mas, é justo perguntar: como estarão todas aquelas crianças que se assustavam, não dormiam ao ouvir os motores de um avião, de uma explosão, de se deparar com soldados fardados? Que faziam xixi na cama de medo? 


Como estarão hoje? Sobreviveram a esses traumas?


Nas guerras, as crianças são sempre as maiores vítimas. Uma frase padrão para essas tragédias.


Ah, sim, no geral gostei do livro.


(*) Acessar: O Livreiro de Cabul