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segunda-feira, 20 de setembro de 2021

SÃO BERNARDO de Graciliano Ramos

LIVRO 86



Essa obra de Graciliano Ramos (alagoano de Quebrangulo nascido em 1892 e falecido no Rio de Janeiro em 1953) foi bastante prestigiada, a ponto de ser adaptada, em 1972, para o cinema, filme dirigido por Leon Hirszman.

Trata-se, sobretudo, da história de um homem rude, Paulo Honório que o Autor assim se "qualifica", já no fim do romance:

"Madalena  entrou aqui cheia de bons sentimentos e bons propósitos. Os sentimentos  e os propósitos esbarraram com a brutalidade e o meu egoísmo." 

Paulo Honório havia decidido escrever um livro sobre sua vida. estava com 50 anos e pesava 89 quilos. Mãos rudes que não eram próprias ao carinho, dizia.

Quanto ao seu livro, tentou dividir a tarefa com seus companheiros de sempre, padre Silvestre, João Nogueira, letrado e Lúcio Gondin, jornalista, diretor do jornal "Cruzeiro".

Essa parceria não deu certo.

Então o livro foi escrito por ele, curtindo a solidão de sua viuvez. Madalena, sua esposa teria se suicidado, mas não há detalhes sofre a morte da mulher.

Não há notícias de seus pais. Sem muita clareza, é revelado que ele fora criado pela velha Margarida que morava tranquilamente na sua fazenda São Bernardo.

Paulo assassinara um certo João Fagundes a facadas por um caso envolvendo a mulher Germana. Esteve preso por quase 4 anos.

Como adquiriu a fazenda São Bernardo? Estava abandonada  e o herdeiro Luiz Padilha dela não cuidava, tinha vida desregrada, recebeu empréstimo de Paulo que por sua vez obtivera do agiota Pereira 100 mil reis. Não podendo Luiz Padilha pagar, com um pagamento complementar irrisório, Paulo Honório tornou-se proprietário da fazenda.

A partir daí, entra no grupo de "companheiros" o próprio Luiz Padilha que, de modo submisso, passou a trabalhar para Paulo Honório que o desprezava.

Então, a uma visita do governador na fazenda, este observara que não havia escola para o ensino básico.

Então, o mestre-escola designado por Paulo foi o próprio Luiz Padilha (!)

Havia uma pendência de divisas entre as terras do engenho de Mendonça e São Bernardo. A cerca na visão de Paulo Honório havia invadido áreas de sua propriedade. Depois de tratativas sem êxito, Mendonça foi assassinado a tiros. 

Mas, havia comentários surdos de que a morte de Mendonça fora obra de Paulo Honório. Com a morte do vizinho desde logo reinstalou a cerca  beneficiando sua propriedade. 

Numa "seção livre" no jornal "A Gazeta", Paulo Honório foi chamado de assassino. Por isso, mesmo explicando que se tratava de matéria paga, Paulo Honório agrediu o jornalista Costa Brito dono do jornal.

Paulo desmentia o envolvimento com esse assassinato.

Há o relato de um arremedo de revolução da qual a ela aderem o padre Silvestre e ninguém menos que Luiz Padilha. Sobre esse tema "meio fora de esquadro" disse o Autor sobre São Paulo (o livro é de 1934, escrito após a Revolução Constitucionalista de 1932):

"São Paulo havia de se erguer, intrépidos, em São Paulo ardia o fogo sagrado, de São Paulo, terra de bandeirantes, sairiam novas bandeiras para a conquista da liberdade postergada."

O juiz dr. Magalhães, o único da comarca (Viçosa - Alagoas) tinha lá suas manias e o história deixa transparecer que ele não produzia muitas decisões.

Pois foi na casa do juiz que Paulo Honório se encantou pela loira Madalena, bonita, professora, culta, escrevia bem. Conhecera, também, a tia da jovem, dona Glória ledora de romances.

Não muito tempo depois, Paulo Honório e Madalena se casam.

Dá-se, então, aquele confronto próprio das diferenças de formação educacional,

Madalena criticava o marido pelo modo bruto como tratava os empregado até deixando-os à míngua.

Sendo educada e interessada em assuntos fora dos rigores da fazenda, passou a ajudar o guarda-livros Ribeiro na sua administração e, com o tempo passou a criar amizades na fazenda, mas nada além de amizade.

Na sua rudeza, Paulo Honório passou a sentir um ciúme doentio.

A página de um longo texto que Madalena escrevera escapou pela janela. Paulo leu, entendeu pouco e achou que estava ali a prova do adultério.

Mas, assim não era. Tratava-se de uma longa carta de despedida a ele à sua morte iminente. 

O casal teve um filho. Paulo Honório não morria de amores por ele e o livro não dá um destino ao menino do ponto de vista da escolha da vida futura.

Dona Glória, tia de Madalena, já sem a sobrinha, um dia avisa que vai embora e vai.

A solidão bate forte e até mesmo a produção da fazenda, algodão, deixara de ter a comercialização de antes.

E com tudo isso o livro vai sendo escrito por Paulo Honório em meio ao chirriar arrepiante das corujas. Ele manda exterminá-las ao que parece mais por superstição. Não tenho por hábito interpretar passagens escritas pelo Autor, porque há o risco de pensar o que o ele não pensou.

É isso em 156 páginas, mas, claro que há mais do que essas linhas. Estas notas são um incentivo à leitura.

Se gostei do livro? Não.




sexta-feira, 3 de setembro de 2021

A CONSPIRAÇÃO FRANCISCANA de Jonh Sack


LIVRO 85


 


O livro é bem editado, a editora é boa, são 446 páginas mas o enredo do livro é patético. O livro não é bom.

Depois de ler livros com maior complexidade, resolvi por esse livro porque estava disponível. E uma pausa na busca de um passatempo. 

A história se desenvolve nos idos do quarto final dos anos 1200 e pouco mais. 

Tudo começa com uma conspiração inverossímil: os restos mortais  de São Francisco são, digamos, sequestrados escondidos em local secreto por uma ala de sua própria Ordem. Seriam as chagas de Cristo que marcaram seu corpo, uma fraude? O santo teria já sintomas da lepra?

Então, o monge Conrad, da ala espiritual da Ordem (1) que à risca seguia os ensinamentos de Francisco entre pobreza absoluta e meditação, recebe em seu retiro a visita de um jovem, Fabiano, que levara para ela uma pergaminho com mensagem cifrada de seu instrutor Leo.

Mas, com o teor do pergaminho indecifrável, Conrad acompanhado do jovem Fabiano resolve ir para Assis lá, consultando a biblioteca do Sacro Convento tentaria decifrar a mensagem.

Nesse meio tempo, descobre que Fabiano, na verdade era uma menina, Amata. Ele teme as tentações próprias de uma mulher, ainda que jovem, no seu convívio e durante toda sua viagem.

O livro não revela como conviveram nas horas de aperto quando os sexos tem modos diferentes de atender às pressões físicas naturais.

No caminho, numa parada num lugarejo encontram Japone delirante que acaba por se unir a eles e mais o noviço Enrico designado com aspirante do Sacro Convento, devendo cumprir os rigores dos sacrifícios no templo...

Então, os três  e a jovem Amata partem para Assis.

Amata quando mais jovem fora violentada por um tio, um bispo evento que a torna revoltada mas ao mesmo tempo revela um apelo erótico. Tira o jovem Enrico de seu repouso e permite ele a toque nos seios.

Mas, nesse mesmo instante, na noite fechada, são eles atacados de modo violento por religiosos que visavam, principalmente Conrad -saberiam os mandantes que ele dispunha da mensagem cifrada de Leo?

Nesse embate, Amata que sempre tinha em sua manga uma faca, esfaqueia um dos atacantes que morre, mas mortalmente ferido o jovem Enrico que logo depois morreria. 

Amata sofre muito com a morte do jovem. Se não o tivesse tentado  seduzir, ele estaria vivo? Seria surpreendido pelo ataque?

Seu corpo é levado por meio de esteira improvisada de galhos por Conrad e Jacopone, entregando o corpo no Sacro Convento para o qual seria um noviço a serviço da congregação.

Nesse fase, desaparecem Amata e Jacopone, mas eles são primos.  

Amata reaparecerá depois de estar abrigada com as Damas Pobres,  como herdeira da viúva Donna Giacoma que sai em defesa da jovem, num verdadeiro discurso feminista quando Conrad tenta depreciá-la pelo que se dera com Enrico. Ela fora violada e passara por muitas dificuldades:

- Mulheres precisam de amor - continuou  Dona Giacoma - Precisamos ser amparadas e tocadas e ouvir que somos especiais entre todas as outras mulheres.

Mas, uma situação real para religiosos se refere ao teor de versículos do Eclesiastes:

"Não contemple a beleza de todo o corpo e não se deixe ficar junto às mulheres. Pois das roupas sai a graça e da mulher a iniquidade do homem. Mais como uma rede, e suas mãos são algemas. Quem agrada a Deus livra-se dela; o pecador, porém, será preso por ela."

Chegando a Assis Conrad passa a frequentar  biblioteca do Sacro Convento a procura de indícios para resolver o pergaminho de Leo, pesquisa que contraria o poderoso e soberbo frei Bonaventura. 

O Frei o adverte que suas pesquisas na biblioteca do Sacro Convento não seriam toleradas. E se reiterasse seria castigado severamente

Conrad fica sabendo que a viúva Donna Giacoma ajudara Léo em escrever o pergaminho com a mensagem cifrada, mas nada indaga à mulher que informação tinha ela sobre a mensagem (?)

Pois ela, a viúva, presenciara até mesmo o sequestro dos restos mortais de São Francisco. Ela também verificara no santo, as chagas e ferimentos que vitimram Jesus Cristo na crucificação. 

Conrad reitera a pesquisa, é pego por asseclas de Frei Bonaventura sendo encarcerado e lá e cegado de um olho com ferro em brasa, enfrentando dor excruciante. Na prisão, situada nos porões de templo encontra outra vítima da crueldade de Bonaventura, Giovanni de Parma, universalmente  reverenciado o deposto ministro geral que lá estava preso havia 16 anos.

Nessas masmorras Conrad, tal a sua fé e renúncia, tem uma experiência espiritual. Revestido por luzes ele sente toda a felicidade interior.

Essa experiência transcendente, assistida pelo carcereiro Zefferino, porque as luzes que envolveram Conrad iluminaram os corredores turvos da prisão, passa a respeitá-lo.

Conrad, depois de dois anos encarcerado e Giovanni são libertados pelo papa Tebaldo depois que Bonaventura é desmascarado num concílio da Igreja quando denunciado de suas crueldades e inclusive em manter em prisão seus desafetos religiosos. As denúncias são de tal gravidade que ele morre em pleno concílio.

Mas, houve, também, os pedidos de Orfeo ao papa de quem fora um servidor em suas viagens.

Nesse meio tempo Amata, já proprietária da rica moradia da víúva Donna Giacoma que antes de falecer transferira a ela sua riqueza, fora aconselhada a se casar.

Um pretendente truculento tentou raptá-la, usando da violência anunciando que com ele Amata se casaria imediatamente,

O modo como ela fora conduzida para fora de seu palácio chamou a atenção de pessoas por perto entre eles de novo Jacopone e um certo Orfeo.

Ambos a salvam.

Ela se apaixona logo por Orfeo mas sabia que ele era filho de uma família que assassinara seus pais.

Mas ela descobre que ele era rejeitado pelo pai e, portanto, inocente. E se casam com muita paixão.

Jacopone, por sua vez, é pai de um menina, Terezina, que ele abandonou com o falecimento da esposa. Ela vivia com o tio Guido. No final do livro revelaria sua veia poética, competindo com Dante Alighieri (!?)

Conrad liberto da prisão, alquebrado, envelhecido, com dificuldades de visão, com as marcas dos grilhões, vai cumprir missão que achava própria para se aproximar da santidade de São Francisco e, sem duvida, as páginas descrevendo o ambiente e o sofrimento do doentes e a vida terrível que levavam, são bastante expressivas.

No leprosário, Conrad chegara à conclusão que São Francisco, por lesões no corpo, perda de visão e crostas maculares nos pés e mãos que ele poderia estar doente com lepra.

Mas, honrado pelo papa num encontro previamente acertado, ele proíbe Conrad de divulgar essa sua crença, isto é, de que Francisco havia adquirido a doença, mesmo que ainda no seu início.

Como foi resolvida a a decifração que não houve do pergaminho de Leo? Ora, não foi resolvida porque o pergaminho fora destruído por um incêndio nas instalações da mansão da Amata. Revelaria o pergaminho onde estavam escondidos os restos morais de Francisco? As cinzas nada mais inspirariam, Saída engenhosa do Autor...

Mas, o Autor não deixou essa dúvida quanto ao paradeiro dos restos mortais de Francisco. Não, essas "relíquias" seriam descobertas em 1818 por acaso numa escavação nos baixos da própria Igreja de São Francisco. (*)

O livro tem pesquisa e a realidade se confunde demais com a ficção. Na orelha da capa, há um comentário afirmando que o livro teria a força narrativa de "O Nome da Rosa" de Umberto Eco. Para mim, nem de longe. É um livro atraente que não vai além de agradável passatempo. Atraente e ruim.


Referências

1- O grupo dos Espirituais mantinham-se fieis às regras de São Francisco, seguindo Jesus Cristo, "despido da cruz; o grupo dos Conventuais, "carregam todas as bagagens deste mundo",

(*) Sobre São Francisco de Assis,  acessar: https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2017/06/5-sao-francisco-de-assis.html