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sexta-feira, 3 de setembro de 2021

A CONSPIRAÇÃO FRANCISCANA de Jonh Sack


LIVRO 85


 


O livro é bem editado, a editora é boa, são 446 páginas mas o enredo do livro é patético. O livro não é bom.

Depois de ler livros com maior complexidade, resolvi por esse livro porque estava disponível. E uma pausa na busca de um passatempo. 

A história se desenvolve nos idos do quarto final dos anos 1200 e pouco mais. 

Tudo começa com uma conspiração inverossímil: os restos mortais  de São Francisco são, digamos, sequestrados escondidos em local secreto por uma ala de sua própria Ordem. Seriam as chagas de Cristo que marcaram seu corpo, uma fraude? O santo teria já sintomas da lepra?

Então, o monge Conrad, da ala espiritual da Ordem (1) que à risca seguia os ensinamentos de Francisco entre pobreza absoluta e meditação, recebe em seu retiro a visita de um jovem, Fabiano, que levara para ela uma pergaminho com mensagem cifrada de seu instrutor Leo.

Mas, com o teor do pergaminho indecifrável, Conrad acompanhado do jovem Fabiano resolve ir para Assis lá, consultando a biblioteca do Sacro Convento tentaria decifrar a mensagem.

Nesse meio tempo, descobre que Fabiano, na verdade era uma menina, Amata. Ele teme as tentações próprias de uma mulher, ainda que jovem, no seu convívio e durante toda sua viagem.

O livro não revela como conviveram nas horas de aperto quando os sexos tem modos diferentes de atender às pressões físicas naturais.

No caminho, numa parada num lugarejo encontram Japone delirante que acaba por se unir a eles e mais o noviço Enrico designado com aspirante do Sacro Convento, devendo cumprir os rigores dos sacrifícios no templo...

Então, os três  e a jovem Amata partem para Assis.

Amata quando mais jovem fora violentada por um tio, um bispo evento que a torna revoltada mas ao mesmo tempo revela um apelo erótico. Tira o jovem Enrico de seu repouso e permite ele a toque nos seios.

Mas, nesse mesmo instante, na noite fechada, são eles atacados de modo violento por religiosos que visavam, principalmente Conrad -saberiam os mandantes que ele dispunha da mensagem cifrada de Leo?

Nesse embate, Amata que sempre tinha em sua manga uma faca, esfaqueia um dos atacantes que morre, mas mortalmente ferido o jovem Enrico que logo depois morreria. 

Amata sofre muito com a morte do jovem. Se não o tivesse tentado  seduzir, ele estaria vivo? Seria surpreendido pelo ataque?

Seu corpo é levado por meio de esteira improvisada de galhos por Conrad e Jacopone, entregando o corpo no Sacro Convento para o qual seria um noviço a serviço da congregação.

Nesse fase, desaparecem Amata e Jacopone, mas eles são primos.  

Amata reaparecerá depois de estar abrigada com as Damas Pobres,  como herdeira da viúva Donna Giacoma que sai em defesa da jovem, num verdadeiro discurso feminista quando Conrad tenta depreciá-la pelo que se dera com Enrico. Ela fora violada e passara por muitas dificuldades:

- Mulheres precisam de amor - continuou  Dona Giacoma - Precisamos ser amparadas e tocadas e ouvir que somos especiais entre todas as outras mulheres.

Mas, uma situação real para religiosos se refere ao teor de versículos do Eclesiastes:

"Não contemple a beleza de todo o corpo e não se deixe ficar junto às mulheres. Pois das roupas sai a graça e da mulher a iniquidade do homem. Mais como uma rede, e suas mãos são algemas. Quem agrada a Deus livra-se dela; o pecador, porém, será preso por ela."

Chegando a Assis Conrad passa a frequentar  biblioteca do Sacro Convento a procura de indícios para resolver o pergaminho de Leo, pesquisa que contraria o poderoso e soberbo frei Bonaventura. 

O Frei o adverte que suas pesquisas na biblioteca do Sacro Convento não seriam toleradas. E se reiterasse seria castigado severamente

Conrad fica sabendo que a viúva Donna Giacoma ajudara Léo em escrever o pergaminho com a mensagem cifrada, mas nada indaga à mulher que informação tinha ela sobre a mensagem (?)

Pois ela, a viúva, presenciara até mesmo o sequestro dos restos mortais de São Francisco. Ela também verificara no santo, as chagas e ferimentos que vitimram Jesus Cristo na crucificação. 

Conrad reitera a pesquisa, é pego por asseclas de Frei Bonaventura sendo encarcerado e lá e cegado de um olho com ferro em brasa, enfrentando dor excruciante. Na prisão, situada nos porões de templo encontra outra vítima da crueldade de Bonaventura, Giovanni de Parma, universalmente  reverenciado o deposto ministro geral que lá estava preso havia 16 anos.

Nessas masmorras Conrad, tal a sua fé e renúncia, tem uma experiência espiritual. Revestido por luzes ele sente toda a felicidade interior.

Essa experiência transcendente, assistida pelo carcereiro Zefferino, porque as luzes que envolveram Conrad iluminaram os corredores turvos da prisão, passa a respeitá-lo.

Conrad, depois de dois anos encarcerado e Giovanni são libertados pelo papa Tebaldo depois que Bonaventura é desmascarado num concílio da Igreja quando denunciado de suas crueldades e inclusive em manter em prisão seus desafetos religiosos. As denúncias são de tal gravidade que ele morre em pleno concílio.

Mas, houve, também, os pedidos de Orfeo ao papa de quem fora um servidor em suas viagens.

Nesse meio tempo Amata, já proprietária da rica moradia da víúva Donna Giacoma que antes de falecer transferira a ela sua riqueza, fora aconselhada a se casar.

Um pretendente truculento tentou raptá-la, usando da violência anunciando que com ele Amata se casaria imediatamente,

O modo como ela fora conduzida para fora de seu palácio chamou a atenção de pessoas por perto entre eles de novo Jacopone e um certo Orfeo.

Ambos a salvam.

Ela se apaixona logo por Orfeo mas sabia que ele era filho de uma família que assassinara seus pais.

Mas ela descobre que ele era rejeitado pelo pai e, portanto, inocente. E se casam com muita paixão.

Jacopone, por sua vez, é pai de um menina, Terezina, que ele abandonou com o falecimento da esposa. Ela vivia com o tio Guido. No final do livro revelaria sua veia poética, competindo com Dante Alighieri (!?)

Conrad liberto da prisão, alquebrado, envelhecido, com dificuldades de visão, com as marcas dos grilhões, vai cumprir missão que achava própria para se aproximar da santidade de São Francisco e, sem duvida, as páginas descrevendo o ambiente e o sofrimento do doentes e a vida terrível que levavam, são bastante expressivas.

No leprosário, Conrad chegara à conclusão que São Francisco, por lesões no corpo, perda de visão e crostas maculares nos pés e mãos que ele poderia estar doente com lepra.

Mas, honrado pelo papa num encontro previamente acertado, ele proíbe Conrad de divulgar essa sua crença, isto é, de que Francisco havia adquirido a doença, mesmo que ainda no seu início.

Como foi resolvida a a decifração que não houve do pergaminho de Leo? Ora, não foi resolvida porque o pergaminho fora destruído por um incêndio nas instalações da mansão da Amata. Revelaria o pergaminho onde estavam escondidos os restos morais de Francisco? As cinzas nada mais inspirariam, Saída engenhosa do Autor...

Mas, o Autor não deixou essa dúvida quanto ao paradeiro dos restos mortais de Francisco. Não, essas "relíquias" seriam descobertas em 1818 por acaso numa escavação nos baixos da própria Igreja de São Francisco. (*)

O livro tem pesquisa e a realidade se confunde demais com a ficção. Na orelha da capa, há um comentário afirmando que o livro teria a força narrativa de "O Nome da Rosa" de Umberto Eco. Para mim, nem de longe. É um livro atraente que não vai além de agradável passatempo. Atraente e ruim.


Referências

1- O grupo dos Espirituais mantinham-se fieis às regras de São Francisco, seguindo Jesus Cristo, "despido da cruz; o grupo dos Conventuais, "carregam todas as bagagens deste mundo",

(*) Sobre São Francisco de Assis,  acessar: https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2017/06/5-sao-francisco-de-assis.html




  


segunda-feira, 28 de junho de 2021

A ILÍADA de Homero

 Livro 84

(V. obs. no final)

Quando foram escritas "A Iliáda" e a "Odisseia", por Homero? No século X antes de Cristo? ou no 7º século? 

Estudiosos chegam a admitir que Homero nunca existiu e que essas obras foram escritas por vários autores ou, por outra, elas são constituídas de textos de poemas diversos compilados.

No andamento da leitura, em determinadas narrativas parece haver alguma desconexão, mas isso não tira o interesse por ambas as obras.

O volume que li da "A Ilíada", não é em verso, mas em prosa numa tradução esmerada.

A obra para quem a ler integralmente, pode se surpreender. 

Desfilam em suas páginas os deuses que influenciam diretamente os acontecimentos da guerra, atuam protegendo ou os gregos ou os troianos, saido dessas posições até mesmo contatos ríspidos no Olimpo:

Zeus, o deus pai dos tem interferência direta nos combates, outros deuses, protegendo os troianos na figura de Heitor enquanto que do lado dos gregos, Heras, "a dos olhos bovinos",  irmã e esposa do próprio Zeus, "o ajuntador de nuvens" e Poseidon - "o abalador da terra". Mas, não só, outros participam influenciado no desfecho de lutas e batalhas.

[Três mil anos das obras escritas por Homero, e ele descreve desavenças sérias entre Hera e Zeus, irmãos e cônjuges. Coisas do tipo: "traiçoeiro", acusa Hera,  Em outro trecho, agora o qualificativo de Zeus: "Louca, és sempre desconfiada, nem eu escapo de ti". E as divergência do casal não param aí].  

Os deuses, então, menos que paz, incitam a guerra porque entre eles há no apoio aos guerreadores adversários.

Heróis da narrativa, que se destacam: 

Ulisses, "de muitos ardis" sempre citado pelo protagonismo na construção do "cavalo de Troia", que como presente "de grego" foi introduzido livremente na cidade inimiga  levando em seu "corpo", soldados gregos que dele saíram propiciando o ataque e a destruição da também denominada Ílion,

O que surpreende em "A Ilíada", porém, é que nas suas 421 páginas, Ulisses aparece como um personagem de pouca expressão ou participação nos combates. Não há referências ao "cavalo de Tróia" na obra. Disso falarei a frente. 

Aquiles "dos pés ligeiros", sim, é o protagonista, mas nada em relação ao seu calcanhar vulnerável. É um herói sanguinário que não faz concessão aos inimigos que derruba: ou a morte pela lança, ou a morte quando fisicamente dominados.

A obra revela outros heróis, como Agamenon - "rei dos homens" -, Diomedes, os dois Ajax, Pátroclo e mesmo Menelau entre os gregos, chamados na obra também como aqueus e entre os troianos, principalmente Heitor, "semelhante aos deuses" e Enéias. 

Enéas poderia ter sido morto por Diomedes, mas foi protegido pelo deus Apolo.

De certa maneira, Menelau foi aconselhado por Agamenon, seu irmão, a não se expor muito nas batalhas.

Menelau é lembrado por causa da Helena, sua mulher vítima de sequestro consentido (?) e Páris, também chamado no obra de Alexandre, o raptor. Helena se fixou bem em Tróia mas arrependida como veremos.

No bom texto da dobra da capa, lê-se que

"Estamos diante de Troia. A guerra já dura nove anos. Páris ou Alexandre, príncipe de Tróia havia sequestrado durante sua visita, a mulher de Menelau, rei de Esparta, Helena, a mais bela das mulheres. Menelau recorre  aos outros líderes gregos  e vai atacar a famosa cidade."

Há, aqui, no meu modo de ver, imprecisões de datas que afetará até a ausência de Ulisses de sua pátria, Ítaca, em vez de 10 anos - lapso sempre citado, mas beirando 20 anos.

Mas, vou explicar essas contradições de datas linhas a frente

A narrativa começa com um desentendimento severo entre Aquiles e Agamenon, rei dos homens, que o obriga a lhe entregar um "troféu" de guerra, uma linda mulher, Briseis, virginal,  

Aquiles obedece, os deuses intervém e não se dá a violência entre eles, mas Aquiles guarda um ódio mortal contra Agamenon a ponto de não participar das batalhas ao lado dos aqueus (gregos), Aquiles chora muito esse evento, sendo consolado por sua mãe, a deusa Témis que chegara mesmo a Zeus, pedindo a proteção ao filho ultrajado, "cujo destino é bem curto".

De um modo ou outro, Aquiles seria decisivo na guerra. Ele só entrará nos combates, com sua poderosa lança e armadura de bronze muito forte, quando seu companheiro e amigo muito estimado, Pátroclo fora morto por Heitor.

Zeus dissera que Heitor seria morto por Aquiles e tal se confirmaria após muitas rusgas entre eles com deuses interferindo protegendo um ou outro.

Boa parte do livro se refere a descrição de batalhas sangrentas porque as vítimas caiam a poder de lanças de bronze ou de espadas.

Não havia compaixão de parte a parte, ninguém era perdoado na hora do confronto. A glória era abater o inimigo e mais a glória seria exaltada se a vítima tivesse  fama de lutador invencível. E a obtenção da armadura do morto era o troféu.

Algumas descrições às vítimas de lança certeira:

● A lança atingiu o nariz da vítima, junto dos olhos e passou pelos dentes, cortando a língua sob a raíz e a ponta apareceu sobre a mandíbula...

Ou então,

● ...atirou uma seta de sete pontas, quando ele se retirava, atingindo á nádega direito do inimigo. A seta penetrou na bexiga, embaixo do osso. Ele caiu e o sangue ensopou a terra... 

E mais,

● A pontiaguda lança atingiu a testa do combatente e os miolos se "dispersaram do lado de dentro" e ele morreu. 

Com Ulisses, Agamenon e Diomedes feridos, com a ajuda dos deuses e com Heitor protegido por alguns deles, inclusive por Zeus, os troianos se aproximam ameaçadoramente dos redutos gregos inclusive incendiando seus "côncavos" navios.

Então, Pátroclo, aliado e companheiro de Aquiles, chega até ele implorando que entre na guerra para vencer os troianos.

Aquiles não se emociona, mantém ainda o rancor pelo ato de Agamenon em retirar dele, a bela Briseis, "troféu" de conquista de batalha, a tal ponto em recusar até valiosos presentes dele na tentativa de reparar a humilhação que lhe impusera.

Então, incentiva Pátroclo a partir para a batalha e para isso cede-lhe sua armadura e armas.

Pátroclo assim age e vai matando muitos troianos, até ser morto por Heitor, "o matador de homens."

Há, então, uma disputa  pelo corpo de Pátroclo: os troianos o querem como troféu e os aqueus o querem para a devida cerimônia fúnebre.

Conseguido o corpo, os aqueus informam da morte do amigo a Aquiles. Este porque chorão como era, se emociona e chora copiosamente e prepara as cerimônias fúnebres.

Decide partir para a guerra, sabendo que era temido pelos inimigos. O deus Hefestos fabrica nova armadura e armas para Aquiles a pedido de sua mãe Tétis.

Ao saberem da entrada de Aquiles, os pais de Heitor (Príamo e Andrômaca) , que já choravam a perda de filhos na guerra, imploraram: 

- Heitor, querido filho, não enfrentes sozinho aquele homem. longe dos outros, para que não encontres sem demora o teu destino, abatido pelo filho de Peleu, eis que aquele homem cruel é muito mais forte. 

Não demoraria, e Heitor, enfrentando Aquiles seria morto por um golpe de lança que atravessaria facilmente seu "macio pescoço". Heitor ainda teve tempo de pedir a Aquiles, em nome dos seus pais, que não o deixasse como alimento dos cães gregos.

Mas, Aquiles, com desprezo e rancor:

- Cão, não me supliques pelos meus joelhos e por meus país.

Morto Heitor, uma grande consternação em Troia, o desespero de seus país, tudo agravado pela modo como agiu o algoz, arrastando o corpo do morto em volta do túmulo de Pátroclo.

Zeus e outros imortais, apiedan-se daquele modo de agir de Aquiles. Então, Zeus chamou a deusa Tétis para que levasse uma mensagem ao filho, determinando que ele entregasse o corpo de Heitor aos seus pais.

Assim se deu, observando Tétis que Aquiles já chorara demais pela morte de Pátroclo:

- Meu filho, por quanto tempo consumirás teu coração chorando e sofrendo, sem pensar no alimento e no leito? Coisa agradável é deitar-se com uma mulher para o amor.

Príamo por mensageira de Zeus foi informado que deveria ir aos redutos gregos com ricos presentes a título de resgate e levasse para Troia o corpo de Heitor. 

Vacilando muito, o velho Príamo, assim fez. Tratado com frieza mas com respeito, acabou por levar o corpo do filho à sua cidade, dando-se, então, a cerimônia fúnebre.

O livro "A Ilíada" assim se encerra no relato dessa cerimônia, sem narrar o desfecho da guerra...

E O CAVALO DE TROIA, O FAMOSO "PRESENTE DE GREGO"?

Não há menção sobre essa lenda na "A Ilíada".

Mas, retornemos à "Odisseia" do mesmo Homero. Comentário de Menelau às lembranças de Helena de volta ao lar grego sobre Ulisses e o "cavalo de Troia":

"(...) Conheci por experiência os pensamentos e a bravura de muitos heróis, percorri o vasto mundo nunca, porém, meus olhos viram quem possuísse um coração como o do paciente Ulisses. Atentai no que ousou e empreendeu este homem enérgico, dentro do cavalo de madeira, onde os mais valentes dos Argivos (gregos) estávamos emboscados, para levar extermínio e morte aos troianos." (*)

E na "Eneida" de Virgílio que narra a fuga de Eneias da Troia destruída:

"Já fatigados da guerra e repelido pelos fados (destinos), no correr de tantos anos, os chefes gregos, por inspiração de Minerva, constroem um cavalo, tão grande como um monte, tecendo-lhe os costados de pranchas de abeto, e fazem divulgar ser aquilo um voto pelo seu feliz regresso. Dentro, no bojo escuro lhe metem escondidos guerreiros e de armada soldadesca enchem-lhe o ventre e todas as cavidades." (**)

HELENA

A guerra de Troia está muita acima do ousado sequestro da linda Helena, esposa de Menelau, por Páris (Alexandre).

Claro que na obra de Homero, há referências a essa ato ousado (e consentido) de Páris, pensado pelo seu próprio irmão, Heitor. Diz ele:

"E se eu pusesse no chão meu escudo e o pesado elmo e fosse ao encontro do admirável Aquiles e prometesse entregar Helena aos filhos de Atreu (Agamenon e Menelau), para que a levassem e, com ela, todos os bens que Alexandre trouxe nos côncavos navios para Troia que foi o começo de toda a guerra..."

Escreveu Virgílio na sua "Eneida":

"Não lances a culpa à formosa e odiada Helena nem a Páris tampouco; foi a inclemência dos deuses que destruiu a poderosa Troia."

Em todas as linhas de "A Ilíada", Helena era qualificada como a esposa de Páris (ou Alexandre), mas quando chamada carinhosa por seu sogro Príamo para ver em batalha seus  irmãos e conhecidos gregos, inclusive Agamenon, seu cunhado, ela mostra arrependimento por estar em Troia, mas não fora forçada a seguir o troiano, seu marido:

- Oh! oxalá a negra morte tivesse me tomado quando segui teu filho até aqui, deixando meus aposentos, meus irmãos, meu filhinho e o grupo alegre de minhas companheiras. Já, porém, que tal não se deu, eu me consumo com o pranto."  

Na solenidade fúnebre de Heitor - e aqui uma questão de datas - Helena agradece o falecido pelo modo carinhoso como fora sempre tratada por ele, reafirma que melhor tivesse perecido em seguir o marido Páris, dizendo:

"Eis que faz vinte anos que aqui estou e deixei minha pátria.

Vinte anos! Esse tempo posterga muitos eventos situados na obra de Homero!

Referindo aos feitos de Ulisses, relatados na "Odisseia" explica Helena:

"E após ter massacrado muitos troianos com o bronze de afiada ponta, voltou a reunir-se aos Argivos (gregos) de posse de muitas informações. Então as outras mulheres troianas soltavam lancinantes lamentações, mas eu exultava de alegria, porque meu coração já era outro. Ansiava por voltar para casa e lamentava a cegueira com que Afrodite me ferira ao conduzir-me para lá, longe da pátria. deixando atrás de mim a filha (n' "A Iliada" ela se refere a filhinho), o tálamo (leito nupcial) e o esposo, que a ninguém é inferior em espírito e beleza".

Não parece muito claro a fidelidade de Helena a Menelau. Tome-se o exemplo de Penélope, a esposa de Ulisses.

Mas, tudo isso é literatura rica e fantástica.


Referências:

(*) Para acessar: Odisséia de Homero

(**) Para acessar: Eneida de Virgílio

Observação: Esta resenha / comentários está melhor desenvolvida no reunião das três obras, Ilíada e Odisseia de Homero e Eneida de Virgílio. Os textos foram revisados e ampliados.

Acessar: ILÍADA, ODISSEIA E ENEIDA

 



sábado, 17 de abril de 2021

ASSIM FALOU ZARATUSTRA de Friedrich Nietzsche

 LIVRO 83


Esse livro está comigo há bom tempo. Vinha adiando sua leitura por achar que perderia tempo em lê-lo e obrigar-me a "interpretar" o pensamento do autor, muito considerado - até demais - por palestrantes e conferencistas que têm por princípio mencionar em suas explanações, filósofos que se destacaram em suas vidas, refletindo com profundidade sobre questões metafísicas.

Então, no caso de Nietzsche é comum esses conferencistas, para fundamentar seu próprio pensamento se referirem a "Nietzsche disse isso", "Nietzsche se baseou nisso" e por aí vai. 

Nunca ouvi referências a explanações contidas nas páginas do livro. "Assim falou Zaratustra" é mencionado apenas no tocante às críticas "consagradas" aos valores tradicionais e especialmente ao cristianismo e aos sacerdotes. Dá-se, nessa linha, a repetição de chavões que ressalta essa posição exacerbada do autor:

"Quebrai, quebrai as antigas tábuas vós que aspirais ao conhecimento".

No diálogo havido com um santo ancião que respondera na sua morada no bosque louvar a Deus e fazer cânticos, ao se separarem, rindo como duas crianças, Zaratustra, ao ficar sozinho, "falou assim ao seu coração":

"Será possível que este santo ancião ainda não tenha ouvido no seu bosque que Deus já morreu?"

Afirmação descabida porque afinal de contas o ancião era um santo homem que acreditava em Deus e chega Zaratrusta que reconhecera a santidade para dizer que Deus morrera. São inúmeras as contradições num livro contraditório e às vezes desprovido de senso.

E aos pregadores da religião:

"Isso porque, "conheço demasiado esses homens semelhantes a Deus. Querem que se acredite neles e que a dúvida seja pecado. Também sei de sobra no que eles creem mais."

Há referência velada a Jesus a quem chama de hebreu que morreu cedo demais porque só conhecia  as lágrimas e as tristeza do hebreu, "juntamente com o ódio dos bons e dos justos; por isso o acometeu o desejo da morte."

E pergunta:

"Por que não ficou ele no deserto, longe dos bons e dos justos? Talvez houvesse aprendido a viver e amar a terra e também o riso!" Se não morresse retratar-se-ia de sua doutrina com mais idade. "Era bastante nobre para se retratar!" (?)

Por isso, proclama que "Deus está morto", um conceito que tantos mencionam, mesmo que no conjunto da obra, haja um sentido de religiosidade sutil porque sem a divindade sobram exatamente quais valores? Não é por menos que seus hóspedes, "homens superiores" num dado momento, em sua caverna, claro que uma imagem distorcida, passam a adorar um burro. Mas, Zaratustra, repudia essa "solenidade".

E nessa direção, proclama o "sentido da terra" e o surgimento do Super-homem uma figura que, afinal de contas, vaga pelos seus textos confusos dai serem considerados "difíceis"... não me acusem de não os "interpretar", porque se trata de múltiplas páginas desconexas. Vai melhorar na quarta parte do livro em crônicas que possuem mais sentido. Mas, há contradições. A confirmação do delírio.

O homem superior como chamado na outra obra do autor "O Anticristo" é um personagem que despreza a compaixão e neste de Zaratustra, há ambiguidades no tocante "aos bons sentimentos" a serem devotados entre os homens, embora fale ele em amor pelos homens e na parte final da obra ele demonstre "amor" pelos seus hóspedes, estes que exatamente  chama de "homens superiores".

À pergunta indesejada: "Como se conserva o homem?"

Zaratustra ao responder pergunta: 

"Como será o homem superado? O Super-homem é o que me preocupa; para mim ele é o primeiro e o único, e não o homem; não o próximo, o mais pobre, nem o mais aflito; nem o melhor. Meus irmãos o que eu posso amar no homem é ele ser uma transição e um ocaso. E em vós também há muitas que me fazem amar e esperar."

Um homem a ser esperado, seu Super-homem que ao olhar para a as eventualidades da vida, seria não menos frágil. É é um "ser" a ser adorado?

 Nietzsche foi um frágil.

O que resta do seu Super-homem? Quem é ele?

Mas, mesmo assim, "quero ensinar aos homens o sentido da sua existência, que é o Super-homem, o relâmpago que brota da sombria nuvem homem."

E também, "não vos basta reconciliar-vos com aquele que matais. Seja a vossa tristeza amor ao Super-homem; assim justificais a vossa sobrevivência!"

Nietzsche em seu Zaratustra proclama que a alma, a qual ele menciona constantemente no livro todo, é apenas alguma coisa que habita o corpo mortal.

Ao acrobata nos seus últimos momentos de vida após a queda do equilíbrio ele diz:

"Amigo", respondeu Zaratustra, "palavra de honra que tudo isso de que falas não existe, não há demônio nem inferno. A tua alma ainda há de morrer mais depressa do que o teu corpo; nada temas".

Mas, como o homem "carrega" uma alma, ele diz:

"A cada alma pertence um mundo diferente; para cada alma, toda outra alma é um além-mundo." (?)

E também, "a interpretar":

"Tudo se destrói, tudo se reconstrói, eternamente se edifica a própria casa da existência. Tudo se separa, tudo, tudo se saúda outra vez, o anel da existência conserva-se eternamente as estações da existência."

Seus animais com ele confabulam dizendo que bem sabem quem é  Zaratustra e o que deverá ser: "tu és o mestre do eterno retorno, é este agora o seu destino"

E a grande revelação no tocante às vidas múltiplas: "que todas  as coisas voltam eternamente a nós com elas; que nós temos já existido uma infinidade de vezes, e todas as coisas conosco."

Esses trechos fariam sentido mesmo numa obra kardecista.

O personagem Zaratustra  exalta o Sol, seu brilho inspirador,  a noite calma e ele em sua agradável solidão, o céu, as montanhas onde fica sua caverna, seu animais de estimação e "conselheiros", a águia e a cobra,  mas ele não ousa adentrar no "inexplicável" Universo e suas decorrência. Como se explicam esses fenômenos?

Com Zaratustra, nada com a metafísica.

Na obra há uma página bonita sobre as mulheres, mas não deixa de acentuar:

"Tema o homem a mulher, quando a mulher odeia: porque no fundo, o homem é simplesmente mau, mas a mulher é perversa."

Mas, também,

"A felicidade persegue-me. Deve-se isto a eu não correr atrás das mulheres. Que felicidade é a mulher".

"E algumas invenções são tão boas que, como o seio da mulher, são úteis e agradáveis ao mesmo tempo."

O nome do livro:

O escritor Janko Lavrin (**) explica o porquê do "Zaratustra" na obra de Nietzsche:

"O profeta Zaratustra (ou Zoroastro) fundou outrora uma religião na qual a moralidade era um fenômeno metafísico e um fim em si mesmo. Mas Nietzsche, que rejeitava a ideia de qualquer moral metafísica, restaurou Zaratustra com o objetivo de fazê-lo corrigir o erro cometido por Zoroastro ao fundar a religião do Zandavesta."


Quando o livro escrito entre 1883 a 1885  Nietzsche já vinha sofrendo fortes distúrbios mentais, provenientes do possível avanço da sífilis que teria adquirido na juventude. Sua visão começou a ser afetada e seu estado mental dificultava ele próprio redigir páginas de suas obras, obrigando-se a ditá-las para amigos que o apoiavam.

Há alguma influência desses distúrbios no "Assim falou Zaratustra?

Por cerca de 11 anos, de 1890 até sua morte em 1900 seus distúrbios mentais chegaram a extremos e o fizeram "vegetar" cuidado pela mãe dedicada e depois pela irmã quando da morte daquela. (Ver relato na resenha do livro "O Anticristo) (*),

O autor Janko Lavrin, a par de qualificar "Assim falou Zaratustra" como obra-prima de  Nietzsche acentua que fora "ele honesto ao tratar da bancarrota dos valores tradicionais no mundo de hoje, naquele mundo que nos foi legado pelo cristianismo e pelo humanismo" (**).

Humanismo? Pela conceituação tradicional de "humanismo" não me parece adequado ter a obra combatido esse legado do passado. 

Notas finais

Não se sintam pouco a vontade, meus amigos, ao ouvirem de seus palestrantes preferidos aquelas afirmações enfáticas de que "Nietzsche defendeu isso ou aquilo, desautorizou Sócrates". 

Na minha visão modesta "Assim falou Zaratustra"  é uma obra confusa e contraditória que o leitor médio dela não precisa. Há muita coisa melhor a se pôr a ler do que esse delírio do autor.

O autor Janko Lavrin se refere à bancarrota dos valores tradicionais tratados por  Nietzsche. Nada mudou nos dias de hoje e com o avanço dos "evangélicos comerciantes" há por eles a dominação às pessoas humildes que se apegam a valores dessas "religiões" que as dominam e as exploram. Devem ser denunciados.

Do livro de  Nietzsche para mim sobrou pouco. Me parece que há certo pedantismo intelectual em mencionar constantemente seu nome para fundamentar conceitos em palestras e conferências. Conceitos retóricos que nada produzem que não seja demonstrar um tipo de cultura dispensável.


Referências:

(*) Acessar: "O Anticristo" de Nietzsche

(**) Janko Lavrin,  "Nietzsche, uma introdução biográfica" (Edições Bloch - )

segunda-feira, 29 de março de 2021

A CASA DOS ESPÍRITOS de Isabel Allende

 LIVRO 82




O livro, na edição que tenho, contém 462 páginas. Esta resenha pode ter alguma falha de menor monta, porque são muitos os argumentos e personagens. Algo pode ter escapado.

Vou dizendo logo que gostei muito. É a saga da família constituída por Esteban Trueba que teve como origem a família Del Valle por causa de duas filhas: Rosa e Clara.

Rosa era de uma beleza rara, seus cabelos verdes, olhos amarelos. Parecia uma boneca celestial que, pelo seu modo de ser, "não era deste mundo" e, por isso, não poderia aqui permanecer por muito tempo.

Severo Del Valle e Nívea eram seus pais, aliás pais de 15 filhos dos quais 11 sobreviveram.

Ao ver Rosa, um humilde garimpeiro, Esteban Trueba se apaixona por ela e ela o aceita como pretendente. Ele passa a trabalhar muito em sua mina para enriquecer e obter condições ideais para o casamento.

Severo era maçom e ateu e pensara em ingressar na política .

Rosa, nesse período, adoecera, febril, então Nana, a criada e cuidadora dos filhos do casal, deu-lhe uma limonada, por recomendação médica, meio quente e açucarada misturando um pouco de licor para que suasse. Mas, foi misturado com um pouco do melhor aguardente  que fora remetido como presente ao pai, Severo.

Esse aguardente estava envenenado e Rosa faleceu.

Em desespero, Esteban sem entender a morte da futura noiva, se embrenha na mina e resolve recuperar sua propriedade rural, "Las Tres Marias", herança de sua família.

Lá de modo autoritários, sem melhorar muito a vida dos colonos, construiu para eles casas de tijolos e, com o tempo começou a enriquecer.

Mas, a personagem principal era Clara, outra filha do casal Severo-Nívea. Clara, desde criança demonstrara poderes de telecinese, isto é, mover objetos com a força mental. Então, ela fazia o saleiro circular pela mesa. Ela era entre os filhos, a mais querida dos pais.

Depois, se envolveria com espíritas, rosacruzes, esotéricos, praticando seções em que movia mesa de três pés, se comunicava com espíritos e tinha a intuição de perceber eventos futuros.

Um dia, já jovem anunciou que se casaria e que seu noiva a procuraria.

Assim se deu. Era ninguém menos do que o próprio Esteban Trueba.

Mas, enquanto praticava sua autoridade perante os colonos, num dado momento passou a se tornar verdadeiro estuprador das jovens  humildes, filhas dos colonos que lá trabalhavam.

A primeira a qual abusou foi Pancha Garcia cujo neto se chamaria Esteban Garcia que na historia terá um papel muito forte pela violência praticada e pela revolta de nada ter recebido do avô que, na verdade, soube da existência dele, mas não sabia que fosse seu neto.

Quando as jovens violentadas apareciam com o filho no colo, ele as expulsava, dando-lhe algumas notas de dinheiro.

Trueba constrói uma mansão, a "casa da esquina", e se casa com Clara.

A irmã de Trueba, Férula, solteirona, que sempre cuidara da mãe doente até o seu falecimento pensa em morar onde morasse o irmão e sua esposa Clara. Preocupada com o que pensaria Clara de sua presença, adivinhando os pensamentos da cunhada, disse que ela moraria com eles pelo tempo que desejasse. 

Férula passou a ter um amor especial por Clara, até porque esta era "especial", com seus poderes de mexer objetos com a mente, conversar com os espíritos.

Do casamento Clara-Trueba nasceu Blanca, que se especializou em trabalhos com argila, vendia suas peças e ensinava crianças e mongoloides na arte.

Na propriedade rural, quando criança brincava muito com o filho do administrador, um menino, o Pedro Terceiro Garcia. À medida que cresceram se tornaram amantes apaixonados. Sempre que Blanca ficava na "Las Tres Marias", ela chegava a pular a janela para se encontrar com o amante à beira de um rio.

Os pais de Clara, Severo-Nívea morrem num acidente de carro, muito primitivo com freios ruins. Nesse acidente, a mãe Nivea foi decapitada e sua cabeça não era encontrada nas imediações da tragédia.

Clara, com seus atributos espirituais, grávida de gêmeos, com muita dificuldade de movimento, resolveu buscar a cabeça da mãe e a encontrou num local mais distante do acidente. Essa cabeça foi "guardada" nos porões da mansão.

Os gêmeos eram Jaime e Nicolas. Jaime se tornaria médico dos pobres e Nicolas, um excêntrico que se aproximou de filosofias orientais e se tornou vegetariano.

A autora, creio que a todos os vegetarianos é muito irônica, hilária referindo-se ao personagem Nicolas: 

"Tornara-se vegetariano. Não provava carne, nem ovos ou leite; sua dieta era a de um coelho e, pouco a pouco, seu rosto ansioso foi ficando parecido com um desses animais."

Nicolas se interessara, também, por temas espiritualistas e passou a visitar as três irmãs Moro, amigas de sua mãe, muito instruídas nesses assuntos. E, nessas visitas conheceu Amanda e seu pequeno irmão Miguel.

Amanda fica grávida no relacionamento com Nicolas. Ele oferece o casamento mas ela o recusou, por não amá-lo suficientemente. Então, partem para o aborto que seria praticado por Jaime, ainda estudante de medicina, depois de relutar muito. 

Pedro Garcia era pai do administrador da fazenda modelo de Trueba, Pedro Secundo Garcia e avô de Pedro Terceiro Garcia e bisavô de Esteban Garcia.

Pedro Garcia era uma espécie de curandeiro. Num terremoto havido na propriedade "Las Três Marias", Trueba foi soterrando pelos escombros da casa que ruiu.

Muitas fraturas e então, Pedro Garcia, orientou o modo como Trueba deveria ser conduzido. Esteban Trueba se recuperou mas nunca mais teve a mobilidade física de antes. Desconfiava que diminuíra de tamanho.

DESFECHOS.

Clara ao defender a filha Blanca pelo seu relacionamento com o Pedro Terceiro Garcia, e dizer ao marido que ela se deitava com o jovem colono por amor e não como ele que se aproveitava das meninas, recebeu um soco no rosto que a atirou longe. Perdeu vários dentes e nunca mais falou com o marido. Fez uma dentadura de porcelana que não lhe era confortável. Então, a mantinha pendurada num cordão em volta do pescoço,

Estaban Trueba que a amava demais fez de tudo para que voltassem ao relacionamento normal, mas Clara faleceu sem que isso acontecesse.

Quando Clara faleceu, a cabeça da mãe Nívea foi enterrada com ela no mesmo féretro.

Na casa, a presença "espiritual" de Clara era sempre sentida, especialmente pelo viúvo Esteban.

Quando soube que Blanca estava grávida, Trueba resolveu assassinar o jovem colono que se mantinha escondido, Foi denunciado pelo menino Esteban Garcia para receber uma recompensa. Trueba encontra Pedro enquanto ele dormia. Aponta a arma e não atira imediatamente. Dá tempo de Pedro se defender. Com um machado, Trueba acerta sua cabeça e decepa três dedos. Mas Pedro consegue escapar ensanguentado e sobrevive.

Com o tempo, se tornaria um cantor de sucesso.

Trueba não dá a gratificação ao menino Garcia pela delação, Trueba o afasta dizendo que ele não merecia porque praticara um ato covarde.

 ● Apareceu no meio da história um francês sofisticado o conde Jean de Savigni com seus jeitos educados, roupas diferenciadas, que a Esteban Trueba fizera propostas inviáveis de negócio e fora ele quem denunciara Blanca em seus encontros com Pedro Terceiro.

Estando Blanca grávida, Trueba já aborrecido com as práticas do francês que inclusive fora seu hóspede gratuito, o agarra e o obriga se casar com Blanca com quem tinha amizade do dia a dia.

O casamento suntuoso ocorre, sem que houvesse a sua consumação íntima. Blanca foge da mansão do marido ao constatar que os criados estranhos contratados pelo conde dela debochavam nas suas costas e, por fim, ao ingressar num quarto "secreto" do francês no qual poderia ser um local de rituais de magia negra com cenas eróticas e com imagens dos próprios criados. Seria, além de tudo, o francês, homossexual?  O leitor que decida.  

A muito custo conseguiu  chegar à casa dos pais depois de horas de viagem de trem e dá a luz a uma menina, Alba.

 ● Férula, irmã de Estevan Trueba, aproxima-se de Clara e se deita ao seu lado. Trueba se depara com essa cena e se convence que sua irmã pode ter inclinações lésbicas. Ele a expulsa da casa mas sempre lhe garante o sustento remetendo valores em dinheiro tendo como portador um padre.

Então, uma noite Férula aparece perante Clara - Trueba e Blanca. Todos admirados, mas Clara impede a aproximação e informa que sua cunhada havia morrido. Todos rumam para a casa onde morava, muito pobre - ela não usara o dinheiro remetido pelo irmão - sendo providenciado, então, seu sepultamento.   

Clara falecera quando Alba tinha sete anos.

● Alba na universidade começa a se relacionar com Miguel que assumira, politicamente, posição esquerdista.. 

Miguel era irmão de Amanda.

NAS ELEIÇÕES VENCE A ESQUERDA.

 ● Trueba, rico e influente se elegera senador da extrema direita.

Mas, nas eleições seguintes vence um presidente da esquerda, socialista, que passa a promover mudanças sociais, inclusive a reforma agrária.

A fazenda "Las Três Marias", pela reforma agrária, é passada aos colonos.

Irascível como era, tenso, Trueba resolve ir até a sua propriedade e lá, é detido e humilhado pelos colonos.

Pedro Segundo Garcia fazia parte do governo. Como não conseguia libertar seu pai, nem os carabineiros, Blanca buscou ajuda de Pedro.

Então, em contato com os "companheiros", conseguiu libertar o senador que resmungou muito mas saiu da "detenção" de sua própria propriedade.

Tem início, então, um processo de conspiração ostensiva contra governo de esquerda, tendo como um dos líderes, o próprio Trueba. 

Começam a faltar alimentos nos supermercados, tudo para esvaziar o ânimo do novel governo,

O governo cai e o presidente é assassinado.

Jaime era íntimo do presidente com quem jogava xadrez.

Jaime, por se negar a delatar quem quer que fosse, embora bastante considerado por ser médico competente, junto com outros prisioneiros foi fuzilado num campo e os corpos destroçados pela explosão de dinamites.

Sua morte foi comunicada por um carabineiro, pela gratidão que tinha ao médico que salvara sua mãe.

O senador Trueba concorda em esconder Pedro Terceiro Garcia em sua mansão e, com contatos que ainda tinha, conseguiu um salvo-conduto que permitiu que ele fosse exilado no Canadá. Com ele seguiu Blanca e por lá ficaram.

Alba, neta de Trueba, por namorar Miguel, foi presa começando interrogatórios para que denunciasse seu paradeiro. Ela se recusou até por não saber onde ele se escondia.

Foi então, encaminhado ao carabineiro Esteban Garcia - neto de Trueba, embora o senador não soubesse - que com truculência submeteu-a torturas degradantes, violações, a ponto de pensar em morrer. Recebeu a visita de sua avõ Clara que a incentivou a suportar a tudo porque teria que viver para relatar tudo o que passava.

● Alba conhecera Garcia quando criança quando ele esteve na casa do avô solicitando uma recomendação para que se tornasse carabineiro. O senador acedeu imaginando que o nome Esteban fosse uma homenagem ao seu próprio nome por ser o patrão da fazenda modelo. Mas, não, seu nome tinha a ver com o avô.

Sabendo da prisão da neta, fez todos os contatos possíveis para localizá-la e libertá-la. Foi humilhado por um oficial que a custo o recebeu e além de não o atender, ainda retirou seu carro oficial de senador, sendo conduzido de volta, de favor, por carabineiros, num jipe. 

Então, por sugestão mesmo de Pedro Terceiro, procurou Trânsito Soto, uma prostituta a quem Trueba ajudara no passado e que era agora dona do Hotel Cristóbal Colon, de "alta rotatividade" que conhecia "todo mundo". Trueba faz apelo emocionado para que Trânsito ajudasse a libertar Alba e assim se deu:

- Trânsito Soto, patrão. Atendi o seu pedido - informou.

Alba foi libertada depois de alguns dias.

Alba consolida todas as suas lembranças da prisão, das anotações deixadas por sua avó Clara e começa com o avô a redigir a história que tudo que enfrentaram. 

Trueba morre em paz e Alba revela que espera um filho que não sabe se é fruto das violações das quais fora vítima na prisão ou se do próprio Miguel, por quem espera retorne.  Mas, diz, seria sua filha fosse quem fosse o pai (o texto aqui é um tanto ambíguo - naqueles tempos do romance não seria possível saber o sexo antecipado do nascituro).

REGISTROS FINAIS:

sexta-feira, 5 de março de 2021

A VIDA SECRETA DAS PLANTAS de Peter Tompkins e Christopher Bird

 LIVRO 81


A edição que tenho comigo é de 1975 (2ª edição). Depois dessa outras vieram.

O livro é difícil porque explana não apenas sobre "plantas" mas proposições biológicas, de engenharia, de física e também... esotéricas - a força da mente sobre a matéria e, sobretudo, a força da mente, do sensitivo particularmente, sobre o contato e crescimento das plantas.

Não é, pois, um livro fácil e em muitas páginas maçantes - nem por isso menos importantes, mesmo com a contradição que formulo - vão se repetindo experiências diversas em relação às plantas, à sua suposta captação de agressividade ou de amor pelos humanos que a rodeiam, a tratam ou a destroem. (*)

E, então, na preocupação dos Autores em esgotar o quanto possível qualquer experiência conhecida, então, em sequência e sistematicamente abordam outros pesquisadores num sem número de informações e análises 

Pode ter um pouco daquilo que se chamou de "realismo fantástico" quando o leitor pode acreditar ou não no que descrito. Houve cientistas que às evidências não acreditaram em muitas experiências que deram certo, porque esses resultados poderiam ter se dado pela influência mental de pesquisadores sensitivos.

A mensagem é de preservação e cuidados com as plantas, que tem sua "alma vivente" - sua vontade de viver florescendo nos locais mais improváveis - e interagem com a própria vida do planeta no seu todo. Os cuidados com o solo é a descontinuidade de adubos químicos.

Há uma indagação interessante: as planta rompem com a lei da gravidade ao levar para os altos, quantas vezes por metros acima do solo, sua seiva e eu acrescento, também a água para produzir frutos. São as raízes espécie de bomba d'água? O que dizer, para ficar num exemplo simplório, a frutificação das laranjas e a abundância do seu sumo?

A planta teria memória de temor e amor.

Do prefácio resumo e transcrevo porque me parece que aqui está a questão central:

Um policial surpreendeu-se pela reação de uma dracena ao instalar, “impulsivamente”, os eletrodos de um detector de mentiras em suas folhas. E ficou estarrecido: “as oscilações da agulha do galvanômetro sobre o painel em movimento desenhavam uma curva semelhante à obtida ao submeter-se o ser humano a um estímulo emotivo de breve duração.”

E na sequência da experiência:

“Decidiu então submeter a folha a uma ameaça maior: queimar a folha. No instante exato em que teve esse pensamento, antes mesmo de apanhar a caixa de fósforos, a agulha se pôs a oscilar freneticamente. Por mais absurdo que parecesse, a planta havia lido o pensamento do policial."

Bom, essas reações se deram sem estímulos sensitivos como discorre o livro em inúmeros casos parecidos,

Mas, no livro entre centenas de informações pode-se ler:

a) A sensibilidade que se manifesta além da compreensão da física "as plantas podem chegar a um estado de comunicação com seus donos, depois de sensitizadas ou condicionadas por eles, tornando-se então capazes de reagirem às suas emoções ou estado de espírito." (*)

b) "Talvez os verdadeiros extraterrenos sejam as plantas - observa Lawrence - pois elas transformam um mundo mineral primitivo num habitat adequado para o homem, segundo processos que se avizinham da mais perfeita mágica".

c) O jornalista soviético num artigo no jornal Izvestiya com base em estudos de Bachster diz que as plantas podem ter algum rudimento altruísta, "mas omitiu, no entanto, estranhamente a mais extraordinária descoberta do pesquisador americano - a de que um filodendro percebera sua intenção de lhe fazer mal."

d) "Porque há de o espírito universal assentar-se menos firmemente na natureza que nos seres humanos, perguntava Fechner e por que há de exercer o poder da natureza um comando menor que o que exerce sobre nossos corpos?"

e) Burbank (Luther): um sábio conseguia "milagres" com suas plantas. Quando  queria que uma determinada planta se desenvolvesse de "um modo peculiar" se ajoelhava e conversava com ela. Após um terremoto violento em 1906 em São Francisco com forte destruição manteve intacto para sua surpresa nos jardins de Sta, Rosa uma estufa que poderia "ter sido protegida graças à sua comunhão com as forças da natureza e do cosmo e ao seu sucesso no cultivo de plantas". O Iogue Yogananda relata que Burbank lhe dissera durante uma vista em 1924 que além do conhecimento científico no cultivo das plantas, deve prevalecer o amor. Diz o Iogue que Burbank no Webster's New International Dictionary é sinônimo de bem cultivar e melhorar plantas. (**)

Yogananda foi presenteado por Burbank com um cacto sem espinhos que assim se manifestara por influência mental do cientista.

f) Carver, tendo lampejos de inspiração, sugeriu aos agricultores que detinham terras esgotadas pelo plantio de algodão, que plantassem amendoim cujo produto seria muito mais rentável em vez de entregar o legume aos porcos. Pelo óleo, pela manteiga, e por inúmeros outros subprodutos constituindo-se alimento superior a par de saboroso, nutritivo.

g) As experiências com música, as clássicas postas ao "ouvido" das plantas se voltam ao aparelho do qual se origina o som. Quanto ao rock, os resultados não foram bons, as plantas consumiam mais água, suas folhas eram mais miúdas. As "tratadas" com música clássica se desenvolviam mais e mais rapidamente. 

h) Os russos Kirlians e sua máquina de captar a aura das folhas: "Clarões brancos, azuis, vermelhos e amarelos foram captados em imagens ao irromperem do que pareciam ser canais na folhas". "Quando Moss à queima-roupa perguntou-lhe (ao pesquisador soviético Inyushin) se seu corpo bioplasmático [captado em fotos kirlinianas em corpo humano] era o mesmo a que a literatura ocultista ocidental se refere a aura ou corpo astral, Inyushin responde que sim".

i) Por uma série de experiências pesquisadores concluem que o adubo orgânico, que se recicla até pelos resíduos de produção agrícula anterior é saudável para a terra que não se esgota, que não se cansa. Os fazendeiros Lindberg, produtores de arroz integral, tinham aprendido com o pai que o fazendeiro tem a obrigação de cuidar de sua terra tornando-a nas melhores condições possíveis para as gerações futuras, "filosofia que, aplicada em escala mundial, podem fazer desse planeta um Éden." 

j) Há muitas explanações sobre a rabdomancia (radiestesia) que tem se prestado a uma série de experiência, inclusive sobre a qualidade da comida, da vitalidade humana e até o mais comum: encontrar água no subsolo quer pelo efeito de uma simples forquilha de um vegetal, um cristal, ou até mesmo equipamentos inventados para colher os resultados. O pêndulo pode ser um detector de mentiras se a pessoa é "infiel ao que pensa, altera o cumprimento de onda, fazendo-os mais curtos e negativos."

[Acrescento: por três vezes, na simplória busca de água em terrenos improváveis, funcionou a radiestesia, uma vez um pêndulo de cristal (por um radiestesista "profissional") e outras duas vezes, com forquilhas de amoreira por pessoas práticas].

k) Bovis e Simoneton defendem a tese de que o ser humano deveria se alimentar somente de "frutas, legumes, amêndoas, peixes frescos - que emitem radiações superiores à sua própria média de 6. 500 (de radiações) - para que energizem e se sintam saudáveis." As carnes e o pão branco malfeito, diminuem a vitalidade já existente no corpo, em vez de ativá-la. Esses alimentos parecem cansar mais após consumidos.

l) Diz McInnes que toda a criação é interdependente: "Aumentamos nossa própria dor quando deliberadamente causamos dor a outros", inclusive o sofrimento nas experiências com cobaias. A criação inteira sofre quando as plantas são dizimadas aos milhões por herbicidas químicos. [Acrescento: incêndios e devastações para fins comerciais] .

m) A técnica radiônica, uma forma de emissão de energia foi aplicada para controle de pragas pela simples radiação de um veneno através de uma foto das plantações. Dizem os Autores, que o governo pode ter se alarmado com a técnica  que poderia ser utilizada militarmente dizimando cidades inteiras. Não há notícias de que tal técnica evoluiu mesmo no meio agrícola ou militar.

"Como disse Nicola Tesla, o gênio americano, nascido na Sérvia: "No dia em que a ciência  começar a estudar os fenômenos  não físicos, fará mais progresso numa só década do que em todos os séculos anteriores de sua existência."

Estes são excertos que selecionei, num livro de 324 páginas com fonte reduzida. A obra, como afirmado, tem muitas, muitas informações e teorias que podem ter ficado apenas nas páginas do livro. Há explanações de sensitivos e suas experiências sobre as plantações e os resultados promissores.

"Enquanto o cientista moderno tropeça no segredo das plantas, o vidente vai longe e propõe soluções incríveis, mas que fazem mais sentido que o palavreado empoeirado dos acadêmicos".

Por fim, informou que o livro não é de apenas uma leitura. Os que se animarem a lê-lo, saibam que precisarão de uma segunda leitura, pelo menos.


CONCLUSÕES

O livro destaca sobretudo a reação das plantas em relação aos humanos, às pragas ao solo bom ou ruim num conjunto solene de interdependência entre os seres que habitam este planeta, Não explanam os Autores sobre os efeitos danosos que se dão com a devastação florestal, salvo os milhões de plantas exterminadas por herbicidas químicos.

Mas, é inegável que a devastação de florestas se constitui num dos maiores abusos que o ser humano pode praticar, porque pode afetar o solo, a fauna que fica sem seu habitat, a água que verte entre a mata fechada, o aumento da poluição e a seca.

É claro, que o enfraquecimento das defesas do planeta ou a simples falta delas podem gerar muitos males perceptíveis ou não, até mesmo pandemias.

Cada vez mais da natureza que o homem despreza ressoa um grito silencioso mas eloquente  advertindo que a insanidade da devastação tem consequências sérias sobre a vida interdependente no planeta.

Referências:

(*) "A alma das florestas e os animais viventes". Acessar:https://martinsmilton.blogspot.com/2020/05/a-alma-das-florestas-e-os-animais-almas.html 

(**) "Autobiografia de um Iogue" de Paramahansa Yogananda. Acessar: https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2020/03/autobiografia-de-um-iogue-de.html



 

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2021

RONCADOR (Jornada da "Bandeira Piratininga") de Willy Aureli

 LIVRO 80


Willy Aurely é um sertanista esquecido.

Nascido em Santos, em 1898 e falecido em 1968.

Sua denominada "Bandeira Piratininga" cujo objetivo fora atingir a misteriosa e ausente dos mapas no Estado do Mato Grosso em 1937/1938, a Serra do Roncador. Sua expedição  é anterior às incursões dos irmãos Villas Boas naquela mesma região, que se deu a partir de 1943.

Esse livro de Aureli, "Roncador",  está esgotado, mas há livrarias "sebo" que ainda dispõem de exemplares.

O meu exemplar é de 1939 ainda na velha ortografia que seria alterada em1945. Assim: "novos soffrimentos"... 

Como cheguei a me interessar pela obra?

Herança de meu pai que era "fã de carteirinha" do jornalista/escritor.

Os livros do Autor que estão comigo, relaciono nas linhas finais destes comentários (*)

A  motivação da "Bandeira Piratininga" fora exatamente desvendar o mistério da existência da Serra do Roncador, no Mato Grosso. E de sua própria existência porque nos mapas, naqueles idos, a região era registrada "em branco". (**)

Aureli relata as diversões expedições anteriores havidas para aqueles lados, tendo seus membros desaparecidos ou trucidados pelos silvícolas, mas acentuando:

"Convém saber que a serra do Roncador fora o escopo de coronel (Percy) Fawcett, pois assegurara existir, nessa cordilheira, restos duma civilização pré-histórica. Mapas editados na Inglaterra marcavam, com certeza, a zona provável onde se encontraria, perdido, o sábio e seus companheiros. E essa zona provável era a serra do Roncador..."

Essa região da Serra do Roncador não acreditada, se dera

"Graças às afirmativas dessas notabilidades, ainda mais que um, sobrevoando a zona declarou nada ter visto além de pântanos e charnecas, passou, o Roncador, a ser riscado definitivamente das coisas existentes."

No caso do coronel Fawcett, em 1925, ao deixar sua caravana, nas proximidades do rio Culuene "se internou em companhia de seu primogênito e dum médico amigo, ninguém supôs que passados uns meses o mundo inteiro se debruçaria sobre cartas geográficas pra pesquisar, na ânsia incontida duma revelação, uma zona que surgia em primeira vez à luz do meridiano graças ao noticiário", porque
"O desaparecimento de coronel Fawcett se tornou, durante anos, uma verdadeira paixão pra muitos. Expedições foram organizadas. Umas seguiram e fracassaram, outras permaneceram unicamente na ideia e na boa-vontade".

A expedição da "Bandeira Piratininga"

A organização da expedição comandada pelo Autor fora impressionante e persistente.

Ela foi apoiada por Adhemar de Barros, então interventor de São Paulo e pelo próprio presidente Getúlio Vargas

Foram trazidos de São Paulo dois batelões de tamanho avantajado e uma lanche precária. Os batelões, espécie de barcaça que trafega pelos rios, ao chegar ao rio Araguaia foram carregadas com toneladas de alimentos, equipamentos inclusive de rádio e cinematográfico,  ferramentas de toda espécie até para presentear os silvículas que fossem encontrados no trajeto (o machado era a ferramenta preferida deles).

O grupo era composto por 30 membros, incluindo um médico e um radiotelegrafista.

Ao navegar sobre o rio das Mortes, curso com 1.200 quilômetros que deságua no Araguaia, a descrição fora que apresentava paisagem emocionante pela sua beleza.

"Chama-se rio das Mortes devido à horrível carnificina praticada por Antonio Pires de Campos nos anos de 1682 e 1683 (...) quando esse paulista desbravador", navegando pelo 
Araguaia chacinou centenas de índios carajás e araés. Outras tragédias houve nas bordas do rio das Mortes.

Aliás, no tocante aos índios carajás, o Autor dedica páginas em descrever seus costumes, modos de vida e, sobretudo, sua aproximação cm a tribo que sempre o recebera bem e à sua equipe. Um dos guias na expedição era um índio carajá (Arutana).

Mas, não quanto aos xavantes, eram temidos por atos violentos e de morte praticados contra os carajás .

Num encontro tumultuado entre membros da expedição e os xavantes, esta a descrição de um dos seus membros:

"Surge um verdadeiro gigante. Colossal! Seu peito parece escudo de gladiador! Deve medir uns dois metros e pico. Solta um urro que é uma ordem. (...) O gigantão, com ares de King Kong, dá outras ordens."

Os xavantes segundo relata o livro frequentemente faziam fogo queimando imensas extensões da floresta sem que houvesse explicação quanto a qualquer utilidade prática. Não se tratava de desmatamento para plantio.

Na excursão à Serra do Roncador, a ida e a volta foram descritas pela sede de seus membros exploradores. Naquele deserto do Cerrado desde o rio Kuruá (citado no livro) até o Roncador, caminhando debilitados pela sede insuportável encontraram um buriti.  "Onde há buritis há água". Cavaram uma cacimba e só obtiveram barro que foi "bebido" para enganar a sede.

E nesse estado de prostração, com quedas, perda dos sentidos, tanto na ida como na volta fora a sede o maior obstáculo e os tormentos físicos enfrentados. 

Mas, com todos esses percalços, "depois de acrobacias alpinísticas" alcançaram "o cume do Roncador pela face saliente da cordilheira que, vista de longe, assemelha-se à gigantesca Esphynge".

Então, procuraram "entre os arbustos um de maior consistência e tamanho a fim de nele hastearmos a bandeira nacional" e assim, "procedemos à cerimônia sinceramente emocionados". O ato tivera algo de religioso, porque "somos um punhado de homens esfarrapados, febris, perdidos nesta imensidão que aterra."

Foram os pioneiros na "conquista" da Serra do Roncador.

Quando já na volta, a sede delirante, "água, água, água". A tudo suportaram mas ao 
encontrarem o rio, beberam até arrebentar e depois um banho.

No tocante às queimadas, a própria expedição delas se valeu, porque neste trecho "mandei fazer uma queimada na margem esquerda a fim de facilitar uma próxima penetração. Queimamos os restos de um cerrado que o incêndio ateado pelos índios poupara". (***)

Há menção especial às piranhas, alguns exemplares de tamanho incomum, que era consumido pelos membros da expedição, havendo descrição de ataques ferozes desse peixe  a alguns mais descuidados produzindo graves ferimentos.

Um inimigo constante e "cruel": o ataque de nuvens de pernilongos "piuns"

A fauna era também numerosa e talvez por isso, matar animais não só para o consumo mas apenas por matar se constata: 

"Benedito Martins (...) residiu em Santa Isabel, durante longos anos, em poucos meses, sem se afastar muito de suas terras, matou 78 felinos de porte alentado".

Embora o Autor não possa ser considerado, um "predador", fica revelado no livro que sempre houve por aqui essa cultura de predação da fauna e flora e provocação de incêndios.

E, também, a crueldade contra os animais se tornara uma prática comum.

O livro também se refere à Ilha do Bananal, a maior "ilha fluvial do mundo" (entre os rios Araguaia e Javaés) sempre com  palavras de admiração. "cuja beleza e riqueza são irrivalizáveis".

Aqueles eram tempos de regiões inexploradas e virgens, como a Serra do Roncador cujo nome teria sido originado pelo ronco dos vento em suas reentrâncias mas esse fenômeno não foi confirmado. O que há é um ruído no interior de suas rochas, um possível curso d'água que as atravessa no seu interior.

Esse o pensamento em 1938. Como se vê é um livro de aventuras com um objetivo real definido. Vale a pena conhecer.


Referências no texto:

(*) Livros de Willy Aureli que disponho:
1940 – Bandeirantes d’oeste
1949 – Léguas sem fim
1952 – Terra sem sombra
1957 – O rio da solidão
1960 – Esplendor selvagem
1963 – Biu Marrandu: Os donos das chuvas

(**) Hoje, pode se considerar como descrição "aceita" sobre a Serra do Roncador, esta:
O Roncador é uma imensa cordilheira da era plutônica que se ergue como divisor de águas do Araguaia e do Xingu. Estende-se por cerca de 800 Km, aproximadamente, desde Barra do Garças até as proximidades da Serra do Cachimbo, no estado do Pará. A fauna e a flora exuberante convivem harmoniosamente com cachoeiras, fendas e cavernas, sítios paleontológicos e arqueológicos, trilhas e bosques nativos. O coronel britânico Percy H. Fawcett, que deu fama a Serra do Roncador como sendo um local místico e especial, revestido de profundos mistérios, organizou uma expedição à região em 1925, desaparecendo misteriosamente no local. 
ObsEra plutônica seria o período em que se deu o surgimento de rochas de origem vulcânica constituídas pelo magma.

(***) Queimadas das selvas se trata, infelizmente, de uma postura "cultural".
Denunciou-as, Euclides da Cunha em "Os Sertões. Acessar:  https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2017/06/6-os-sertoes-de-euclides-da-cunha.html
e também 
Franz Caspar no seu livro Tupari (entre os índios nas florestas brasileiras), Acessar: https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2019/10/tupari-de-franz-caspar-entre-os-indios.html