LIVRO 78

Quando comentei o livro "Memórias Póstumas de Braz Cubas" (*) de Machado de Assis, eu o classifiquei como dos piores que li nesta lista de 78 resenhas / comentários. Fui criticado por isso. Um comentário que me chamou a atenção dizia que eu não entendera a vida de um bon vivant no quarto final do século XIX. Não, um livro que não falou uma linha dos negros e dos escravos, não poderia ter, pelo menos de minha parte, qualquer consideração. Não vi realismo, mesmo o "fantástico". O que vi foi um livro apenas arrastado e sobretudo, preconceituoso.
Então, quando separei "Dom Casmurro", viera de um livro extraordinário, "Crime e Castigo" de Dostoiévski (**). Como lera Dom Casmurro há "séculos" (quem não leu a obra um dia?) já vim com reservas.
Até a metade do livro a narrativa foi amena, situando Bentinho, o personagem da história na suas tratativas de não ser padre. No meio, páginas esparsas, "crônicas" do autor que não diziam da história propriamente dita.
Mas, digamos, do meio para o fim o livro me agradou muito.
Direi os motivos linhas a frente.
São personagens de Dom Casmurro:
Bentinho, um menino mimado, órfão de pai, prometido pela mãe em se tornar padre, se ele nascesse com vida porque em gestação anterior o bebe não vingara, nascera morto;
Dna. Gloria, mãe de Bentinho que o mimava muito, mas que prometera fazê-lo padre, mesmo com a rejeição do menino que vai se revelando no decorrer da narrativa;
José Dias, um "agregado" que aparecera um dia na propriedade dos pais de Bentinho, quando o pai era vivo, dizendo-se médico homeopata, curou dum resfriado um feitor e uma escrava, mas não tinha futuro. O pai de Bentinho, convidou-o a trabalhar na propriedade recebendo ordenado modesto. Ele aceitaria e, ao que me parece, o autor criou esse personagem como uma figura masculina que seria influente na vida de Bentinho e de sua mãe;
Tio Cosme, irmão de dna. Glória, personagem de opinião na família mas que não teve influência no desfecho da história;
Prima Justina, de pouca influência no decorrer da história, salvo suas implicâncias;
Capitolina, a Capitu, a personagem principal da história juntamente com Bentinho. Eram vizinhos e já beirando a adolescência - o "menino" já tinha 15 anos - ficavam de "namorico" para lá e para cá, inocentemente (!). Ambos firmariam um namoro apaixonado de serem felizes. No primeiro beijo apaixonado que trocaram, Bentinho fez a proclamação: "sou homem".
Padre Cabral, professor de Bentinho, incentivador de sua "vocação" para o sacerdócio;
Ezequiel de Souza Escobar, seminarista, que se tornaria amigo íntimo de Bentinho. Seria um forte e influente aliado de Bentinho;
Sancha, amiga de infância de Capitu, que se casou com Escobar. Tiveram uma filha;
Com a promessa da mãe em fazê-lo padre, Bentinho começa um movimento para evitar que tal se consuma. Encontra um aliado no agregado José Dias que passou a emitir mensagens de que talvez não tivesse o menino, vocação religiosa. Capitu também o incentivava a não assumir o sacerdócio, inclusive pela promessa de amor para sempre.
No seminário, Bentinho conhece Escobar, tornando-se muito amigos. Escobar influenciava Bentinho. Também Escobar não queria ser padre, pensando em trabalhar no comércio.
À proposta do agregado, quando a mãe já admitia que o filho não fosse padre, de irem a Roma e pedir ao papa que o livrasse da promessa, Escobar sugeriu que fosse encontrado um jovem carente que substituiria Bentinho na promessa da mãe.
Assim se deu.
Bentinho, o "lindo" se casa com Capitu. Escobar se casa com Sancha.
Logo, estes são pais de uma menina a quem batizaram com o nome de Capituzinha.
Bentinho cheio de inveja porque seu filho não vinha.
Então, Capitu mais tarde daria a luz a um menino que foi batizado chamando-se Ezequiel, o mesmo de Escobar.
A amizade do casal era muito íntima.
O autor deixa claro a possibilidade do adultério porque descreve flerte de Sancha sobre Bentinho, deixando-o confuso em relação às intenções da amiga.
À medida que o menino Ezequiel vai crescendo, suas feições se aproximavam das feições de Escobar. A própria Capitu aponta os olhos parecidos de um e outro.
Escobar morre afogado.
Nas horas antes do enterro, Capitu encara o cadáver com decepção o que não deixa de ser notado por Bentinho. Bentinho faz o discurso em homenagem ao amigo morto nas exéquias.
Ezequiel, que amava o pai Bentinho, à medida que o tempo passa, parecia significar a ressurreição de Escobar.
Então, Bentinho um dia diz ao filho que "ele não era seu pai".
Capitu ouve esse comentário, começando aí a rompimento do casamento.
Bentinho pensa fortemente no suicídio misturando veneno ao café. Vacila. Quase dá o café envenenado ao filho.
Capitu se muda para a Suíça com o filho e lá falece.
Bentinho, guardando a amargura do adultério e do filho que não era seu, um dia o recebe em sua casa. Ezequiel falava com sotaque francês.
Bentinho lhe dá dinheiro para pesquisas arqueológicas na Grécia e Egito. Ezequiel morre de febre tifoide meses depois e é enterrado em Jerusalém. Os seus amigos de pesquisa remetem a Bentinho fotos do túmulo e o que sobrou do dinheiro que Ezequiel dispunha depois de pagas as despesas.
O comentário amargo de Bentinho: "...pagaria o triplo para não tornar a vê-lo."
Dna. Glória falecida, no seu túmulo foi inserida a inscrição: "uma santa".
Final
O autor deixa claro que a intimidade dos casais comportaria o adultério. Pois Sancha não "assediou" Bentinho? Escobar não foi visto nos corredores da casa de Bentinho um dia? Para mim, o autor, por todos os elementos postos, e muito bem, conduzem à ideia do adultério de Capitu que "arrumou' um filho com Escobar. Não seria preciso exame de DNA. Ponto.
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E a origem do nome Dom Casmurro? Estava o narrador num trem da Central do Brasil meio sonolento obrigando-se a ouvir um poeta declamando suas poesias. Cochilou um pouco, o poeta se sentiu ofendido, chamou-o de nomes feios e o apelidou de Dom Casmurro.
A palavra "casmurro" possui vários significados. Dois deles: teimoso, sorumbático.
Quanto ao livro, com capítulos curtos o que é uma virtude, gostei muito.
Referências:
(*) "Memórias póstumas de Braz Cubas". Acessar: https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2019/02/54-memorias-postumas-de-bras-cubas-de.html
(**) "Crime e castigo". Acessar: https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2020/12/crime-e-castigo-de-fiodor-mikhailovitch.html
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