Translate

quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

O PROFETA de Khalil Gibran

LIVRO 132












Este é um "pequeno" livro consagrado, lançado há um século (1923) é bestseller indiscutível. Na década de 60 fora obra muito considerada pelos termos dos pensamentos do Autor que na sua simplicidade inspiravam pessoas numa época diferenciada, uma juventude ávida de compreensões.

Na apresentação do exemplar que está comigo, há a informação de que Gibran, quanto ao modo de apresentação de seu pensamento, se inspirara, em Nietzsche, na sua obra mais consagrada, "Assim falou Zaratustra" (*). Não sou fã do Autor alemão, mas claro que Gibran só se baseou no formato e não nos pensamentos de Nietzsche com seus "homens superiores", "super-homens" num delírio que perdura até hoje entre os estudiosos de sua filosofia, sem que considerasse a fragilidade do ser humano. O final de sua vida foi prova cabal disso.

Gibran é muito mais evangélico, digamos. 

Enquanto esperava o profeta que chegasse o navio que o levaria, após 12 anos, de Orphalese, para sua ilha natal ele respondia aos temas que lhe eram apresentados pelas pessoas à sua volta. E são muitos.

Vou selecionar alguns conceitos:

Sobre o amor: "Quando amais, não deveis dizer "Deus está em meu coração" mas dizer antes "Eu estou no coração de Deus." / E não penseis que possais dirigir o curso do amor, pois o amor, se vos achar dignos, dirigirá vosso curso."

Sobre o matrimônio: "E vivei juntos, mas não juntos demais: pois os pilares do templo ficam separados, e o carvalho e o cipreste não crescem à sombra um do outro."

Sobre o trabalho: "O trabalho é o amor tornado visível. E se não puderes trabalhar com amor, mas apenas com desgosto, seria melhor que deixasses teu trabalho, sentasse à porta do santuário a pedir esmolas àqueles que trabalham com amor."

(Nesse conceito o ideal do "profeta" seria buscar o valor do trabalho qual fosse - e na vida real esse privilégio não é fácil).

Sobre o crime e o castigo: "O assassinado não é inocente por seu próprio assassínio, / E o roubado não é sem culpa por ser roubado. / O justo não é inocente pelos atos do mau, / E o que tem as mãos limpas não é isento de culpa nos atos do malvado."

(Nestas reflexões parece que o "profeta" deixa entrever que em tudo da vida, prevalece a "lei da causa e efeito" - o karma).

Sobre a liberdade: (Aqui num dado momento de suas reflexões, o "profeta" se refere às coisas desejadas e as temidas - e outras situações que se "movem dentro de vós"); E, então:

"Tais coisas movem-se dentro de vós como pares inseparáveis de luzes e sombras./ E quando a sombra se esvai e já não existe, a luz que se demora torna-se uma sombra para outra luz. / E assim vossa liberdade solta suas amarras, torna-se amarra para liberdade maior."

(Qual será a liberdade maior?).

Sobre o conhecimento de si próprio: "Pois o Eu é um mar sem limites nem medidas. / Não digais "Encontrei a verdade, mas "Encontrei uma verdade." / Não digais "Encontrei o caminho da alma." Dizei antes: "Encontrei a alma andando em meu caminho." / Pois a alma caminha em todas as sendas." (...) "A alma desabrocha, como um lótus de incontáveis pétalas."

(Para os "filósofos do ocultismo", esses conceitos fazem sentido de modo superior).

Sobre a amizade: "Pois na amizade todos os cuidados, desejos e esperanças nascem e são partilhados sem palavras em uma alegria não declarada". 

Sobre a prece e a oração: "E se vós escutardes na quietude da noite, as ouvireis a dizer em silêncio: "Deus Nosso, que és nosso Eu alado, é Tua vontade que quer nós. / É teu desejo que deseja em nós. / É o Teu querer em nós que pode transformar nossas noites, que Te pertencem, em dias que também são Teus. / Nada podemos pedir-Te, pois conheces nossas necessidades antes mesmo que nasçam em nós. / Tu és nossa necessidade; e dando-nos mais de Ti mesmo, Tu dai-nos tudo."

Sobre a morte: "Pois o que é morrer se não estar nu no vento e dissolver-se ao sol? / E o que é cessar de respirar senão libertar o alento de suas marés agitadas, para que possa se erguer e expandir e, desembaraçado, encontrar Deus?"

(Paro nestes conceitos entre inúmeros outros constantes do livro)

E já entardecera, na despedida do profeta de Orphalese com as âncoras sendo recolhidas e um grito do povo:

"E Almitra, a vidente, disse: "Abençoado seja este dia e este lugar, e teu espírito que nos falou." / E ele respondeu: "Fui mesmo eu quem falou? Não fui também um ouvinte". 

Referência:

(*) ASSIM FALOU ZARATRUSTA






terça-feira, 10 de dezembro de 2024

O ANTIGO REGIME E A REVOLUÇÃO de Alexis de Tocqueville

LIVRO 131












O livro trata das causas da Revolução Francesa, mas de um modo "suave" os antecedentes desse movimento que inspiraria outros movimentos, tendo em conta a bandeira da "igualdade, igualdade e fraternidade".

Ano de 1789. O rei Luis XVI, realmente acomodado em seus privilégios e poder absolutista não governava com independência se não fosse sua claque de aristocratas e os religiosos. 

Emais:

(...) em toda a nação a desobediência e já revolta — um exército cujos soldados não merecem confiança — todos os deputados se manifestando contra os editos do rei — e no meio desta anarquia uma corte odiada pela sua cupidez, um rei sem prestígio e já achincalhado, uma rainha publicamente insultada com a alcunha de "A Austríaca" (...) e queimada em efígie em pleno Paris." (*)

Os aldeões era considerados uma massa de obediência, espezinhados pelos resquícios do feudalismo, pelos impostos e pela divisão, com seus senhores, da produção que obtinham.

Esse quadro foi se agravando. Na fase pré-revolucionária, o clero se uniu aos pobres aldeões e até mesmo parte da aristocracia. 

Pensavam numa Constituição mas preservando, sob controle dela, os poderes do rei.

Mas, este não aceitava a diminuição dos seus poderes aumentando a pressão sobre seu reinado e sobre os seus ministros e pensando em repor o absolutismo.

A "Encyclopedia pela Imagem" (*) na revolta que ia crescendo, registra:

"A 15 (de agosto) um bando de 7 a 8.000 mulheres em armas, conduzindo canhões, partindo para onde iam, diziam elas, procurar pão. À noite um deputação de mulheres apareceu na Assembleia, lamentando da carestia e do insulto feito à nação. A Assembleia informou ao rei, que voltava da caça, das reclamações de Paris (ele se acomodara em Versalhes). Vários conselheiros diziam-lhe que fugisse. Mas Necker (um dos seus ministros) recordava o tesouro vazio e as vesgas maquinações do duque d'Orleans. Ficou. Ratificou mesmo os decretos promulgados pela Assembleia desde 4 de agosto."

Nesse quadro revoltoso, antes, em 14 de julho, houve a "tomada da Bastilha". Multidão invadiu a prisão e libertou os poucos presos lá mantidos, inimigos da realeza.

Esse estado de ódio levou ao "período de terror" com muita violência e execuções na guilhotina. Luis XVI e sua esposa Maria Antonieta, em 1793, foram executados na guilhotina.

E muitos outros.

As palavras finais sobre a Revolução Francesa, são estas:

"Quase toda a França aceitou com calma (!?) o golpe de Estado. A Revolução tinha terminado. Os resultados essenciais tinham sido atingido: a igualdade de todos perante a lei e perante o imposto; as terras libertadas, a indústria e o comércio livres; o número de proprietários aumentado pela venda dos bens nacionais; o governo absoluto substituído por um governo constitucional — e a burguesia no poder."

O livro

Essa introdução julguei necessária de ordem a dar ensejo à compreensão, em linhas gerais, da abordagem do Autor Tocqueville que estudou as causas porque ele nasceu em 1805, depois dos acontecimentos graves da Revolução Francesa. Ele se aprofundou na história examinando documentos da época, anotações, atas, cadernos que comprovaram as desigualdades, os privilégios da aristocracia e a isenção de impostos que lhe era garantida e a opressão sobre a classe pobre, sem privilégio algum.

O livro foi publicado em 1856, três anos antes de seu passamento.

Conceitos

. As razões por que essa grande Revolução que se preparava simultaneamente em toda a Europa mas que eclodiu na França; com todas as causas graves essa Revolução não se pensaria em outro lugar que não fosse na França;

. (...) estamos bastante próximos dela para podermos entrar no espírito que a conduziu e para compreendê-lo. Em breve isso ficará difícil, pois as grandes revoluções que são bem sucedidas, fazendo desaparecer as causas que as produziram, tornam-se assim incompreensíveis justamente por causa do seu sucesso;

. (...) o cristianismo havia suscitado ódios furiosos porque os sacerdotes eram proprietários, senhores, dizimeiros, administradores... a Igreja deveria ocupar seu lugar na nova sociedade mas ela ocupava o lugar mais privilegiado e mais forte naquela velha sociedade que seria reduzida a pó. Pelas funções eclesiásticas, esse religiosos possuíam feudos ou propriedades. Tudo na igreja era pago; o pobre não conseguiria sequer ser enterrado gratuitamente;

. Vimos sublevarem quando necessário o pobre contra o rico, o plebeu contra o nobre, o  camponês contra o seu senhor. A Revolução Francesa  foi aos mesmo tempo seu flagelo e sua professora; ela nasceu do ódio pelas desigualdades e o encontros da  igualdade e liberdade;

. A Revolução teve algo de revolução religiosa, religião imperfeita, sem Deus, sem culto e sem outra vida, mas que ainda assim, como o islamismo, inundou toda a Terra com seus soldados, apóstolos e mártires;

. Essas revoluções que afetaram a maioria dos povos europeus substituíram instituições feudais por uma ordem social e política mais uniforme e mais simples que tinham como fundamento a igualdade de condições;

. Diz o Autor que já na época da Revolução não existia nos campos a servidão, porque os camponeses trabalhavam livremente, compravam e vendiam... (!?)

Mas, no tocante à administração de qualquer província, aldeia, por menor que fossem, não tinham poderes para resolver questões particulares a ela pertinentes. Tudo era levado à administração central;

. A Revolução vendeu todas as terras do clero e parte das terras da aristocracia, mas essas terras foram adquiridas por quem já possuía outras.

. O Conselho do rei tinha amplos poderes: judiciário, podendo anular decisões de todos os tribunais, discutir leis e decidir sobre o rateio de impostos. E com tantos poderes, havia abusos. Os impostos de regra oprimiam os agricultores, havendo grandes beneficiários de isenção entre a aristocracia e burguesia. Por desigualdades dessa natureza os menores golpes de arbitrariedade de Luis XVI eram difíceis de suportar comparados com o despotismo de Luis XIV;

A separação da nobreza francesa das demais classes (aldeões, burgueses) era notória e odiosa; cidadãos divididos e encolhidos em si mesmos todos curvados se sujeitando ao poder régio que tolhia as liberdades públicas. O burguês ficou tão apartada do povo quanto o próprio fidalgo. Isso ia preparando os franceses para derrubar o despotismo, talvez para fundar em seu lugar o império pacífico e livre das leis;

. Falta de dinheiro do reino - práticas desonestas: (...) a cada passo encontramos bens da Coroa vendidos e depois tomados de volta como invendáveis; contratos violados, direitos adquiridos não reconhecidos; o credor do Estado sacrificado em cada crise; a fé pública incessantemente falseada;

. Na Revolução Francesa houve alguma influência da independência americana que se deu em 1776. Mas, o Autor enaltece os escritores franceses de tal modo que quando teve de agir, ela (a literatura) transportou para a política todos os seus hábitos; o espirito de Voltaire estava há muito tempo no mundo; mas o próprio Voltaire só podia imperar de fato no século XVIII na França;

. O descrédito universal de todas as crenças religiosas, influenciou a Revolução. Mas, a irreligião produziu  um imenso mal público; no novo regime a religião se recompôs.

Conclusões 

O livro de 218 páginas tem mais do que essa pequena resenha. Quem o leu e quem o lerá? Não sei, talvez acadêmicos estudiosos da Revolução Francesa cujo "enredo" nenhuma ficção poderá equivaler. 

Bom, eu li, anotei e gostei, porque no final de tudo  problemas que motivaram a Revolução Francesa estão presentes em todo o planeta: o descaso que se dá com a pobreza, as desigualdades entre ricos e pobres, os impostos pagos pela classe pobre, proporcionalmente superiores aos pagos pela classe rica. As religiões dizimistas. E quão difícil é mudar isso, qual difícil! 


Referência

(*) Encyclopedia pela Imagem. Edição de Lello & Irmãos constituída de 4 volumes, formados em fascículos que circularam pelos anos de 1938/1940.