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domingo, 30 de março de 2025

A NATUREZA DAS COISAS de Lyall Watson

 LIVRO 137











Há muito lera esse livro que sempre me foi agradável. Por isso, reli. 

O Autor explana sobre eventos estranhos que acontecem em relação às coisas que nos rodeiam ou usamos surpreendendo pelo fenômeno. (*)

E também os encantos principalmente de pedras preciosas ou não.

O autor menciona casos de objetos desaparecidos que ressurgem do nada ou do modo mais inesperado.

Para citar um dos inúmeros casos:

"Colin Hill viajou nas férias de 1976 para Torquay, em Devon, chegando ao porto exatamente quando mergulhadores vinham à superfície com um par de óculos que ele perdera ali em sua última visita, sete anos antes." (*) 

Ele dá destaque especial ao encanto que as pedras produzem nos seres humanos, quer pela sua preciosidade e / ou forma. Elas encantam pela sua "fortaleza" e peso e serviram desde os tempos remotos para registrar inscrições de "civilizações" que se perderam na contagem do tempo.

As pedras segundo apreendo das informações do autor, muitas são reverenciadas. Ele cita o próprio Shakespeare que se ajoelhara tocando as pedras do velho prédio — Teatro Rose — chorando de reverência e assombro por estar em contato com o próprio tecido que um dia fizera eco ao som da Voz do Seu Mestre."

Qual a "mágica" da construção das pirâmides com aqueles blocos colossais?

O autor se refere às tradições musicais, músicas suaves que propiciavam o deslocamento de grandes pedras:

"E sobre a história das pirâmides erguidas com a ajuda do cântico e da canção , de uma alquimia de som produzida por magos e bardos que fazia as pedras dançarem, acalmava as águas e domava bestas selvagens."

Quando a força do pensamento parece agir: 

"Sugiro que talvez possamos estar fazendo o mundo à medida que vivemos. Será que as partículas subatômicas existiam antes de os físicos se porem a procurá-las?" Então, criando aquilo que buscamos descobrir...

Diz, num outro momento do livro que muitas descobertas arqueológicas se deram pela intuição, pelo instinto e, talvez, um pouco pela capacidade psicométrica — essa capacidade, por instrumentos, na "área da psicologia, quantifica aspectos como inteligência, personalidade, aptidões e outros traços psicológicos". 

A alquimia nunca se fixou apenas em criar um "ouro falso" mas pelas experiências que os alquímicos insistiam, visava demonstrar o êxito da experiência, obtendo um "símbolo da imortalidade". Mas, sobretudo, reconhecendo que todos os metais eram organismos vivos.

Fala da estranheza do ferro — esse metal misterioso —, quinhentas vezes mais abundante que o cobre que pode ser transformado numa série de equipamentos desde que descoberta a fornalha.

"Ao que parece, já há provas suficientes para sugerir que os objetos de fato acumulam "lembranças" e que é possível torná-los acessíveis à nossa mente", porque a matéria do mundo seria matéria mental — "acredito que de fato, com a ajuda de intermediários orgânicos deixamos a nossa marca na "matéria do mundo" dando às coisas materiais algumas capacidades insuspeitas."

Reações estranhas são relatadas sobre objetos inanimados, como a boneca acomodada no berço que se torna agressiva, aparições fantasmagóricas de comandante em avião no qual foram instaladas peças de outro acidentado, mortal; estátuas de santo que choram sangue; os sinos de Fiesole, na Itália, tocaram sem ajuda humana quando o peregrino irlandês, Santo Donato que chegara para ser bispo na localidade; motor de carro que começa a funcionar sem a ação humana...tudo na linha da natureza é mistério das coisas.

A edição é de 1997 e o autor já tinha experiências com computadores avançados, já falava em IA - Inteligência Artificial, na robótica e até que ponto no futuro, agora, em 2025 essas máquinas nos substituirão, gradativamente. Elas chegarão a pensar? Elas interagirão com o ser humano, do ponto de vista emocional?

O autor se refere a Issac Assimov que na sua obra de ficção "Eu Robot" estabelece os mandamentos do robô:

1) um robô não pode ferir um humano ou permitir que um humano sofra algum mal; 2) os robôs devem obedecer às ordens dos humanos, exceto nos casos em que tais ordens entrem em conflito com a primeira lei; e 3) um robô deve proteger sua própria existência, desde que não entre em conflito com as leis anteriores. 

Nessa linha, ele se refere ao acidente mortal que vitimou o operário japonês Kenji Urada, de 37 anos que, em 1981, ao reparar um robô sofisticado foi atingido por um braço do equipamento ao apertar o botão de ligar que estava desligado.

O autor se refere ao poderosíssimo Hal 9000 infalível (do filme "2001 - uma Odisseia no Espaço" de Stanley Kubrick, de 1968) que dialogava com os astronautas mas revelando sentimentos assassinos, até ser desligado. (**)


No tocante à robótica, quem acompanhou a evolução especialmente na indústria automobilística, reconhecerá o "estrago" que essas máquinas fizeram nas linhas de produção, substituindo milhares de trabalhadores.

O que esperar da evolução da inteligência artificial, dos robôs, dos computadores — das máquinas belicosas apocalípticas neste planeta que ainda contempla guerras de conquista?

O futuro será de reflexões, de solidariedade ou sempre a beira do extermínio e do apocalipse?

O livro tem muito mais. Ele leva a uma efetiva reflexão sobre o a interação das coisas e no mais, sobre o próximo futuro que nos termos do livro já está chegando.

Referências

(*) Já relatei algumas vezes este evento de "maldade das coisas inanimadas": nos tempos da ditadura, militares de alta patente visitaram a fábrica de Santo André da Chrysler para conhecer a fundição, antiga, na qual o ferro "líquido" rolava soltando faíscas pelas esteiras até às formas. Foi preparado um "Dodge Charger" uma potência de veículo que fora lavado e perfumado. Os militares se acomodaram e o carro não "pegou"; de novo e nada. Vexame. Foi usado um carro menor. O mecânico olhava para o "Charger" perdido nas dúvidas. Já em vias de ser removido para a oficina, assim que os militares se retiraram da fábrica, o veículo funcionou soberbo com aquele som cadenciado do motor aprovado em milhares de Charger e Dart.

(**) Tema correlato, acessar: OS ROBÔS E EU E A INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL


NOTA DE DIVULGAÇÃO

Livro 137

A edição que tenho é de 1997. De modo bem interessante o autor registra fenômenos envolvendo "coisas" e assemelhados quando há manifestações insólitas e inusitadas: objetos que desaparecem e ressurgem do nada, o mistério das pedras e sua adoração, sinos que badalam à presença dum santo, automóveis cujo motor se movimenta sem a ação humana mas, sobretudo, o poder dos computadores e, já então, se referindo à inteligência artificial.
Todo mundo sabe do "estrago" que os robôs fizeram na linha de montagem da indústria automobilística extinguindo milhares de empregos. Mas, o avanço dessa tecnologia chegará a que ponto? Os robôs interagirão emocionalmente com os humanos? Os humanos serão substituídos por essa inteligência? Qual o alcance num futuro próximo da IA? O livro reflete sobre isso tudo.

segunda-feira, 3 de março de 2025

CEM ANOS DE SOLIDÃO de Gabriel García Márquez

 LIVRO 136











Desabafo

O que dizer deste livro tão consagrado? Um livro que contém histórias dentro das histórias. Nada linear, pois.

Sendo a trajetória de mais de 100 anos, fácil para o Autor repetir aos descendentes do casal original, os nomes Aureliano (2º filho de José Arcádio) e José Arcádio que se sucedem nas páginas do livro e, quanto a mim, cheguei num ponto em que não conseguia saber ou acompanhar qual José Arcádio, qual Aureliano se apresentava naquela fase do livro (!)


A obra tem uma característica notável: a força dos personagens femininos, Úrsula que comandava a casa e sobreviveu, aproximadamente, por 120 anos. Amaranta (filha de Úrsula), Rebeca, Remédios, Santa Sofia de la Piedade, Fernanda, Pilar Ternera, Petra Cotes...

O predomínio das mulheres descendentes da família Buendia "tronco" e as que se tornaram esposas ou amantes lidavam com personagens masculinos sem uma atividade identificada; eles vivam no ócio, nas redes. José Arcádio Buendia que fundara o lugarejo Macondo, se preocupava com seus galos de briga e, influenciado pelo cigano Melquíades fazia experiências no seu laboratório precário tentando converter metais em ouro. Prático de alquimia!

Há muitas cenas de "realismo fantástico" e a magia trazida pelos ciganos que com alguma regularidade apareciam em Macondo.

Há o "registro" do "dilúvio" em Macondo, pela chuva que perdurou por quase cinco anos.

Úrsula, a esposa de José Arcádio Boendia,  é a personagem praticamente de toda a obra, mesmo quando cega, tentando manter a casa decadente, infestada de insetos, das formigas loiras, ervas daninhas  - que avançavam nos cômodos deteriorando a moradia pelos desleixos de seus descendentes.

Antes dos três filhos, o casamento de José Arcário e Úrsula não se consumara do ponto de vista vida sexual. 

Debochado por um outro criador de galo de briga, um certo Prudêncio Aguilar, Buendia o assassinou com uma lança. Essa vitima de Buendia seria seu grande peso de consciência e via seu espectro com alguma frequência, o fantasma que o "visitava".

A partir do homicídio praticado por seu marido, Úrsula não colocou mais dificuldades, nascendo três filhos:  José Arcádio, Aureliano e Amaranta.

Com o tempo, deslumbrado com o funcionamento de instrumento musicais, os movimentos da bailarina que dançava sobre a caixa, José Arcádio teve alucinações e beirando a loucura começou a quebrar objetos, os aparelhos de alquimia, sendo contido por vários homem, sendo amarrado num castanheiro e lá ficando. Úrsula, não reconhecida pelo marido, providenciou um coberto de sapé para o proteger do sol e da chuva. Ele foi amarrado pela cintura. E lá faleceu.

Mas, sobretudo, a solidão dos Buendia e descendentes: no ócio, na ignorância, em Macondo um vilarejo perdido. 

O vilarejo teve seu tempo de progresso com a plantação de bananeiras,  investimento de empresários estrangeiros incrementando, enquanto durou, o progresso. Quando esse empreendimento foi abandonado, Macondo entrou num processo de decadência. 

José Arcádio (filho mais velho) que tinha como amante Pilar Ternera teria um filho dela. Mas ele, naquele seu estágio de poucos compromisso, desaparece seguindo a trupe cigana.

Aureliano permanecia no laboratório praticando alquimia e previu uma fato novo na família: a chegada de um menina de 11 anos, Rebeca, trazida por traficantes, que Úrsula acolheu como filha.

Rebeca e Amaranta se faziam companhia em atividades de bordados.

Na linha do inusitado, Rebeca comia terra e descascados da parede.

Aureliano se encantou pela menina Remédios, uma das filhas do delegado 

Apolinar Moscote que chegara a Macondo. 

Quando Remédios atingiu a idade e se tornou "mulher",  Aureliano com ela se casou,  Ela era muito delicada principalmente com Úrsula. Mas ela faleceu no parto de gêmeos.

Mas, chega a Macondo Pietro Crespi, rapaz delicado, especialista em instrumentos musicais. 

Ele se apaixona por Rebeca e é correspondido. Amaranta jura que impedirá o casamento nem que tivesse que assassinar a irmã adotiva. 

Então, volta José Arcádio que havia desaparecido com os ciganos, retorna e se apaixona por Rebeca e se casam mesmo com o casamento marcado com Crespi. 

Desesperado pelo casamento frustrado, Crespi ao superar a desilusão, se aproxima de Amaranta que o rejeita de modo categórico. Crespi se suicida.

Arcádio, filho de Pilar Ternera e José Arcádio se relacionara com Santa Sofia de la Piedade, com quem teve uma filha e depois gêmeos. A filha recebeu o nome de Remédios e os gêmeos receberam o nome José Arcádio Segundo e Aureliano Segundo. Esse Arcádio seria fuzilado durante a guerra.

Amaranta a solteirona virgem viveria por muitos anos. Mas, ela troca afagos com um dos sobrinhos, Aureliano José (filho de Aureliano Buendia e Pilar Ternera)

Estoura uma guerra entre liberais e conservadores. 

Aureliano se une aos liberais e passa a combater os conservadores longe de Macondo. Nesse tempo afastado na guerra, o Coronel Aureliano Buendia fora pai de 17 filhos. Quando voltou da guerra, encerrada por um armistício depois de 20 anos de duração, ele se isolou no laboratório e e passou a fundir peixinhos de ouro. Mesmo sendo adversário, o governo conservador tentou homenageá-lo, mas ele recusava veementemente qualquer homenagem.

Aureliano Segundo encontra Fernanda que tinha pretensões de uma vida mais glamurosa e se casam. Fernanda se adapta a uma situação atípica porque o marido tinha uma amante declarada, Petra Cotes com quem vivia o maior tempo. 

Petra embora desprezada por Fernanda, a amante nunca a desprezara Fernnda. Numa fase de vender rifas que Aureliano organiza com ela, parte do obtido era remetido à Fernanda.

Fernanda e Aureliano Segundo tiveram três filhos: Renata Remédios, José Arcádio e Amaranta Úrsula. Renata Remédios, grávida, é enviada  um convento e fica por lá. O filho foi para Roma para ser religioso mas viveu no ócio e na vadiagem. Quando volta para Macondo para ver a mãe a encontra morta; desequilibrado, não sobreviveu por muito tempo. 

Amaranta Úrsula com muito sacrifício de Aureliano Segundo foi para a Bélgica estudar.

Voltou para Macondo casada com Gaston que pareceu um tanto excêntrico. Pode ter agido para se livrar da esposa; de fato isso se confirmou pelo que Amaranta Úrsula magoou-se ao constatar essa atitude do marido.

Mas antes disso Amaranta Úrsula fora vítima de  um começo de estupro praticado pelo sobrinho Aureliano Babilônia. Depois as relações entre eles se tornam vorazes.

Tiveram um filho, outro Aureliano, que não sobreviveu consumido pelas formigas. Mas, o menino nascera com rabinho de porco significando que os pais teriam o mesmo sangue.

E o que aconteceu com Amaranta Úrsula, assim que deu a luz? Bom, não vou contar...

Acaba a história...mas há muito mais e muitos "Aurelianos". O livro precisa ser lido com atenção.


NOTA DE DIVULGAÇÃO

Livro 136

Obra consagrada do colombino Gabriel García Márquez em meio a tantos episódios fantásticos, se destaca a força das mulheres perante homens preguiçosos.
A matriarca da família Buendia, Úrsula controlou a família por décadas mesmo quando cega já pelos mais de cem anos.
Todas as outras de um modo ou outro tiveram influência de regra construtivas sobre os Buendiase descendentes.

O segundo filho do casal José Arcádio — fundador de Macondo — e Úrsula,  Aureliano, agora coronel, se envolveu numa guerra entre liberais e conservadores que durou por duas décadas. Quando voltou a Macondo, se instalou nos laboratórios de seu pai inspirados pelo cigano Melquíades e lá fundia peixinhos de ouro se isolando.
Os descendentes dos Buendias colocavam nos seus filhos, de modo predominante, o nome de Aureliano que para mim produzia confusão de saber qual era, quem era quem. Um sacrilégio: não gostei!
 

 

  

 

quinta-feira, 6 de fevereiro de 2025

PENSAMENTOS de Blaise Pascal

 LIVRO 135













Blaise Pascal foi um admirável e precoce matemático nascido na cidade francesa de Clermont. Ele viveu de 1623 a 1662. A obra foi publicada em 1670. A edição que está comigo, "sobrevivente" é de 1940. Difícil de folhear.

Animei a ler a obra pelos séculos passados de sua publicação e desvendar quanto possível o pensamento do autor em defesa de cristianismo. Não muito fácil porque a tradução segundo explicações dos editores "foi fiel do original francês, mantemos rigorosamente o pensamento e a forma do autor..."

Consagrado por suas descobertas científicas, "um dia, porém, na ponte de Neuilly (Neuilly-sur-Seine — comuna francesa) foi vítima de um acidente e começou a sofrer alucinações vendo aparecer sempre diante de si, um abismo aberto para  tragá-lo."

A partir desse momento tornou-se profundamente religioso, cristão.

Ele rejeita o pensamento racional de atentar aos fatos, da lógica e da comprovação e se debruça, sem concessões, no pensamento cristão, a presença de Deus perante homens frágeis e pecadores

Seus pensamentos — há 354 anos

A religião é um instrumento de encontrar Deus para aqueles que o procuram com sinceridade, com o coração. Mas, há o que procuram a verdade e proclamam que não há evidências tal a o obscuridade em que se encontram  e rejeitam a Igreja. E se gabam de não ter encontrado a verdade mesmo lendo livros sagrados e falando com eclesiásticos.

A imortalidade da alma é uma preocupação que tão profundamente toca, mas não será uma pesquisa que resolverá sua transcendência. Porém, será preciso muita falta de sentimentos para rejeitar essa reflexão "sem ter em vista esse ponto que deve ser o nosso último objeto".

Porque há nestas pesquisas, aos que dela se dedicam, ao pensar a finalidade da própria existência.

Mas, há as misérias da existência porque se ignora o próprio corpo e a "presença" da morte certa. Então a dúvida sem saber de onde se é e se vai para o nada ou para as mãos de um Deus irritado. "Eis a minha condição, cheia de miséria, de fraqueza, de obscuridade". Melhor passar os dias sem saber o que irá acontecer.

Deus é infinitamente incompreensível e pela (aparente) não relação com os seres humanos surge a incapacidade de conhecer o que ele é e se ele é. Por essa não relação com os seres humanos quem ousará resolver essa questão: quem é Deus?

Mas, as provas de Deus se manifestam aos que pensam com o coação e na diminuição das paixões: "quereis chegar à fé, mas ignorais o caminho; quereis curar-vos da infidelidade, mas pedis os remédios..."

A verdadeira religião deve ter por fim amar a Deus. "A verdadeira natureza do homem, o seu verdadeiro bem e a verdadeira virtude e a verdadeira religião são coisas cujo conhecimento é inseparável".

E, assim, é a religião cristã a verdadeira porque tem conhecimento da natureza do homem, da sua grandeza e da sua pequenez.

"Sem Jesus Cristo, o mundo não subsistiria; pois seria preciso ou que fosse destruído ou que fosse como u inferno".

Descobrindo as provas da religião cristã é tal qual um herdeiro que encontra os títulos de sua casa.

Não são os filósofos que informam que os bens estão no âmago do ser humano? Descobriram eles o remédio para os males que o afetam? Os maometanos que prometem os prazeres da terra mesmo na eternidade? Duvidam de Deus. Mas, é a religião cristã que ensina os bens, os deveres, as fraquezas e as suas causas que coloca o homem de pé. "Todas as outras religiões não o conseguiram".

Uma frase: Os jansenistas assemelham-se aos hereges pela reforma dos costumes; mas, vós vos assemelhais a eles no mal."

Jansenismomovimento havido na França no século XVII. Ele teve como base as ideias do bispo holandês Cornelius Jansenius (Jansen) que, entre outros, defendia rigorosa interpretação da doutrina católica; que a graça seria imerecida e concedida por Deus através da predestinação e tinha visão sombria do destino humano.

Hereges: ateus, aqueles que contestam dogmas da Igreja. 

Diz o Autor: "Todas essas contrariedades (presunção desmedida e abatimento de ânimoque pareciam afastar-me mais do conhecimento da religião, foi o que mais cedo me conduziu à verdadeira". 

Porque a natureza do homem é corrompida e decaída de Deus, mas libertados do pecado original por Jesus Cristo, "e é disso que temos provas admiráveis sobre a terra". Então, "ninguém é tão feliz como um verdadeiro cristão, nem tão razoável, tão  virtuoso, tão amável".

Os judeus tendo os grandes milagres de Moisés culminando com a abertura do Mar Vermelho e a conquista da Terra de Canaã esperavam um Messias que fizesse mais do que esses antigos profetas mas Jesus Cristo pregou não os feitos do mundo, mas do espírito. "Os judeus amaram tanto as coisas figurantes e as esperavam tanto que desconheceram a realidade quando ela veio no tempo e na maneira preditos." Jesus Cristo aos "verdadeiros judeus" e "verdadeiros cristãos" é o Messias que os faria amar a Deus.

Não há na terra homem que não demonstre suas misérias e a demonstração da misericórdia de Deus.

Santo Agostinho: "O modo pelo qual o espírito adere aos corpos não pode ser compreendido pelos homens; apesar disso, o homem existe" (*)

E aqui um pensamento que eu classifico de "profundo":

"As fontes das contrariedades da Escritura, são um Deus humilhado até a morte na cruz, um Messias triunfando da morte por sua morte, duas naturezas em Jesus Cristo, dois adventos, dois estados da natureza do homem."

[Como explicar esses "dois estados da natureza do homem" — Jesus e Cristo?]

Tudo é figuração se não seguida a Escritura em direção à caridade, só havendo esse fim.

Jesus vem dizer aos homens que seu inimigo são eles mesmos - são suas paixões que os afastam de Deus.

Outras crenças e descrenças

Sobre Maomé diz o Autor que ele não foi predito como Jesus Cristo; Maomé não fazia  milagres e "todo homem pode fazer o que ele fez", mas nenhum o que faz Jesus Cristo.

É divertido ver-se que há aqueles que renunciam a todas as leis de Deus e da natureza e adotam outras, como os ladrões, os soldados de Maomé, os hereges, etc. e assim os lógicos.

Os ateus não são claros o suficiente, há a perda do bom senso ao dizerem ser  alma mortal.

Coração 

"O coração tem suas razões, que a razão não conhece: sabe-se isso em mil coisas."

É o coração que sente Deus, e não a razão. Eis o que é a fé: Deus sensível ao coração, não à razão."

Outros pensamentos

A grandeza do homem é se reconhecer miserável. Uma árvores assim não se reconhece. Mas, é ser grande ao se conhecer que se é miserável.

"À medida que se tem mais luz, mais grandeza e baixeza se descobre no homem."

Examinando os pensamentos, predominam imagens do passado e disposição do futuro. Pouco no presente. Desse modo não se vive mas se espera viver e esperando à felicidade, mas não é alcançada nunca. "O presente não é nunca o nosso fim; o passado e o presente são os nossos meios; só o futuro e o nosso fim. Assim nunca vivemos, mas esperamos viver..."

[Em que segundo o presente é o passado e em que momento seguinte somos chamados para o futuro?]

A razão da infelicidade está na fragilidade do homem e na mortalidade a ponto de não haver consolo quando se pensa nisso de perto.

Até um rei cheio de divertimentos o faz não pensar. Mas, ao se retirar os divertimentos e ele se puser a pensar em si, se encontrará mais miserável que seja, mesmo sendo rei. Se o homem fosse feliz o seria se menos se divertisse, como os santos e Deus.

[Nestes tempos de  grande progresso das comunicações e o "senhor" celular que conduz a mente de milhões — o vício do não pensar?].

Última frase da obra:

"Não é bom ser livre demais.

Não é bom ter todo o necessário

Instinto e razão, marca de duas naturezas". [não religiosas?]


Citação no texto, acessar:

(*) CONFISSÕES DE SANTO AGOSTINHO


NOTA DE DIVULGAÇÃO

Livro 134
Este livro foi publicado em 1670 há 354 anos. A edição que está comigo é de 1940.
O Autor fora um matemático brilhante, precoce, mas tornou-se fervoroso cristão após ser vítima de um acidente, passando a sofrer alucinações vendo-se à beira de um abismo aberto, ameaçador.
Nessa busca da religião e do cristianismo, faz observações profundas contras aqueles que não compreendem a presença de Deus na existência de cada um mesmo que inatingível. Contesta os ateus e outras religiões não cristãs, como se dá com o Islamismo, neste caso porque Maomé não foi predito como Jesus e não fazia milagres como ele.
Lembra que fora Jesus o Messias, mas os judeus esperavam dele atitudes grandiosas como Moisés quando, na verdade, ele viera para que amassem a Deus.
O livro em si é difícil, mas eu tentei trazer os pontos principais do pensamento do Autor.


segunda-feira, 13 de janeiro de 2025

NOSSA HERANÇA DO EGITO ANTIGO de Rodman R. Clayson, F.R.C.

  LIVRO 134











A edição que está comigo é de 1980.

Um livro de fácil compreensão que resolvi ler pela quantidade de documentários sobre o Egito antigo. Segundo tabela na final da obra, a primeira dinastias começa em 3100 AC se encerrando em 395 DC, já sob domínio greco-romano.

O livro faz parte da "Biblioteca Rosacruz".

Livro fácil de ler mas com muitas informações. Selecionei alguns conceitos e ensinamentos para dar uma ideia do conteúdo da obra.

Conceitos e ensinamentos:

° Os primitivos egípcios tinham no deus-sol, Ra,  sua principal divindade e o faraó era "Filho de Ra" ou filho do sol. Novos deuses, com o tempo, iam sendo aceitos.

Em Tebas, o deus passou  a ser conhecido como Amon-Ra, unindo o poder criador do sol com o poder criador do ar.

A religião era estável e bela. Ela defendia o conceito de que o universo fora criado por toda a eternidade e invariável.

O deus Osíris é aquele que faz os mortos renascerem. A concepção de reencarnação nasceu no Egito, as crenças de ressurreição, imortalidade da alma, da consciência...

° Nessa conceituação religiosa mais de 70 pirâmides foram construídas a certa distância das margens do Nilo, começando por Gizé. Três delas são encontradas em Gizé, a mais famosa a Grande Pirâmide do Faraó Quéops. 

Também o Templo de Carnac, em Tebas.

A Grande Pirâmide cobre uma área de 52.611 m². Cada lado possui 228 m com 148 m de altura com 2,3 milhões de blocos de granito, pesando em média 2,5 toneladas cada um. Blocos maiores chegam a pesar 15 toneladas. Há dúvidas se Quéops construíra essa pirâmide imensa como túmulo dele, um templo de aprendizado ou um monumento a si próprio.

Como conseguiram edificar essas pirâmides monumentais, templos, cortar granito, com ferramentas de cobre endurecido a martelada? Como iluminavam recintos sem luz, subterrâneos nos túmulos para esculpir figuras no granito, pintar nas paredes. Como transportavam obeliscos de até 300 toneladas em trenós e barcaças? E como os erguia?

° Os egípcios acreditavam na vida após a morte. A sobrevivência depois da morte dependia em grande parte da preservação do corpo daí o embalsamamento. Desse modo Ka teria bom conforto, acreditando-se que Ka fosse a personalidade da alma. A morte era a vida prolongada eternamente. Esse pensamento era profundamente inspirado pelo renascimento diário do sol e pelo renascimento anual do Nilo com suas cheias.

As múmias, milhares delas, em meados do século 19 foram vendidas e se tornaram matéria prima de papel. Elas também foram combustível para locomotivas a vapor no Egito, porque no país não havia madeira. 

° A sociedade era parte de uma concepção divina e universal. Maat era o sentido das leis da natureza, do divino,  aquilo que é direito, justo ou verdadeiro. O conceito de justiça social, para todos os homens, uma cultura civilizada e a crença no poder de Ra, universal.

° O coração de um homem é seu próprio deus, "e meu coração está satisfeito com meus atos". O coração seria o que se traduz como consciência.

° Os animais tinham importância religiosa, viam neles o inumano ou o sobre-humano. Os animais nunca sofriam modificações, tal qual o nascer e o pôr-do-sol.  Sendo divinos, as divindades recebiam a figuras humanas com a cabeça dos animais que lhes eram sagrados. Era crença comum que os deuses se manifestavam em animais.

° Na arte as estátuas não poderiam retratar a fragilidade humana. A estátua da rainha Nefertiti, esposa  do faraó Aquenaton revela que fora ela uma das mulheres mais belas dos tempos egípcios.

° Os egípcios eram felizes em sua vida familiar. Eram carinhosos com as mulheres e à mãe. Casamento monogâmico, mas os homens poderiam manter concubinas. 

Eram higiênicos, com banhos constantes.

° Na medicina o coração fora "desvendado": vasos vão para todo o corpo. 

Usavam medicamentos minerais, anestésicos, talas para membros fraturados e outros tratamentos complexos.

° O faraó Tutmés III é considerado um dos mais ilustres de seu tempo (1490-1436 AC)

Aquenaton — que significa viver em Maat - a verdade — faraó no lapso de 1369-1344 AC rompeu com os sacerdotes de Amon, introduziu o deus único, Aton — o sol, porque como revolucionário religioso, queria libertar o povo da magia, da superstição primitiva e do culto a muitos deuses. A bela Nefertiti também era muito dedicada à religião de Aton. 

Aquenaton e a própria Nefertiti deixaram Tebas e mudaram a corte para uma nova capital, Aquetaton - "o horizonte de Aton."

Com o tempo os sacerdotes voltaram a dominar a religião, voltaram os deuses de antes e o corte voltou para Tebas.

Nessa nova religião do deus uno introduzida por Aquenaton havia a volta à natureza, à bondade e à beleza encontrada nela.

O salmo 104 e a semelhança com um dos hinos de louvor a Aton:

Salmo 104                                                                    Hino de Aquenaton

Bendize, ó minha alma, ao Senhor.   |  Teu alvorecer é belo no horizonte do céu,        

Senhor, Deus meu, tu és                        Ó, Aton vivo. Começo da vida!

magnificentíssimo, estas vestido           Quando surges no horizonte oriental do céu       

de glória e de majestade                        Enches toda a terra com tua beleza                       

° CLEÓPATRA: o Templo de Hator era de Cleópatra, "a rainha dos reis" que, na atmosfera trágica e desesperançada que a cercava seduziu Cesar, casou-se com Marco Aurélio, esbanjou sua fortuna com Otávio Augusto e preferiu o suicídio, a ser humilhada diante de Roma.


O livro não faz referência à Grande Esfinge, apenas uma foto com esta legenda: "A Grande Esfinge, situada em Gizé, é uma das inúmeras esfinges do Egito. E a maior escultura do mundo antigo".


Claro que o livro, que pode ser encontrado no mercado livreiro, com 187 páginas tem muito mais do que esses excertos. Bom livro.


NOTA DE DIVULGAÇÃO

Livro 133
Resolvi ler este livro porque achava que poderia dar uma visão diferente aos mistérios do antigo Egito. A edição é de 1980 e o autor um membro da Ordem Rosacruz.
E há, realmente, passagens diferenciadas da vida, dos deuses e das construções monumentais dos templos e pirâmides, cujos blocos de granito de toneladas são inexplicáveis quanto ao transporte (por trenós, barcaças?) e mesmo o levantamento para fixação nas obras. Equipamentos de hoje não suportariam tanto peso.
As ferramentas eram de “cobre endurecido a marteladas”, suficientes para o corte do granito bruto?
No último terço do século 19 eram tantas as múmias descobertas que foram vendidas para uma fábrica de papel e o Egito as usou para acionar locomotivas a vapor, por falta de madeira!
Mas, o destaque maior se refere ao faraó Akenaton e sua bela esposa Nefertiti que romperam com a religião e superstição de múltiplos deuses adotando o deus-Sol, Aton, criador de todas as coisas e a volta à natureza e à bondade.
Mas, esse deus uno não durou muito, os sacerdotes com o tempo voltaram aos múltiplos deuses.
O livro não traz estudos ou considerações da esfinge, mencionada apenas de passagem numa legenda de foto.
Livro fácil de ler, interessante.

quarta-feira, 25 de dezembro de 2024

CAETÉS de Graciliano Ramos

 LIVRO 133












O título do livro tem a ver com os Caetés, "um povo indígena que habitou o litoral do Brasil, entre a Ilha de Itamaracá e o rio São Francisco, descendentes dos tupinambás, falavam a língua tupi antiga..."

O narrador e personagem principal do livro, João Valério, guarda-livros, esboçava escrever um livro no qual essa tribo constituía era a personagem principal:

"O que devia fazer era atirar-me aos caetés. Difícil. Em 1556 isto por aqui era uma peste. Bicho por toda parte, mundo traiçoeiro, a floresta povoada por juruparis e curupiras. Mais de cem folhas quase ilegíveis de tanta emenda, inutilizadas."

O romance

São muitos os personagens. Até a página cem do livro num andamento monótono da história, os personagens desfilam, se encontram nas praças, nas procissões, nas ruas, nos cafés, na igreja, em reuniões sociais frequentes...

Vou destacar estes personagens mas há muitos outros:

° João Valério, o narrador e personagem principal;

° Adrião e esposa Luísa, ele patrão de Valério;

° Padre Atanásio, dono do jornal "A Semana" em cuja redação se dava muitas reuniões;

° Dr. Castro, promotor.

João Valério era apaixonado por Luísa tanto que no começo da história numa oportunidade ele beijou-lhe o pescoço da mulher, sendo repudiado por ela: — O senhor é doido? Que ousadia é essa? 

Com toda repulsa da mulher ao assédio só se saberá que ambos tiveram um caso antes do casamento dela na metade final do livro.

Um dia Adrião se ausenta a trabalho. Aproveitando-se da ausência do marido, Valério visita a Luísa consumando-se o amor. 

E Luísa e Valério não são cuidadosos em esconder o romance.

Os encontros começam a ser notados pelos demais moradores a ponto de, numa reunião, o promotor Castro o ter acusado do consumar o adultério, dando-se discussão áspera.

Com todo esse inconformismo na sociedade, foi endereçada a Adrião uma carta anônima denunciando o romance entre João Valério e sua esposa Luísa.

Adrião pressiona João Valério que confessasse o romance mas ele nega.

Não demora muito e Adrião se dá um tiro no peito mas sobrevive por algum tempo.

O Autor nada diz se esse ato extremo se dera pela adultério da esposa que desconfiava ou se fora um distúrbio provindo da "vida dura".

Neste resto de vida, porém, Adrião chama João Valério, se desculpa, dizendo que ele e a esposa Luísa eram inocentes...

Depois da morte do suicida, amigos de Valério, com a "confusão" evidente do romance, diziam que ele deveria se casar com Luísa.

 Por dois meses João Valério e Luísa não voltaram a se ver. Quando isso se deu, ela se emocionou muito, mas resolveram pelo rompimento.

Valério se torna sócio da empresa e Luísa comanditária. 

E, por fim, se resigna Valério a se comparar aos caetés no romance que nunca termina:

"Que semelhança não haverá entre mim e eles! Por que procurei os brutos de 1556 para personagem da novela que nunca pude acabar?"

Mas, na sua timidez (?) ela casará com a Teixeira, de lindas pernas, olhos azuis e alegre como um passarinho?


Outras obras do Autor, acessar:

ANGÚSTIA

SÃO BERNARDO


NOTA DE DIVULGAÇÃO

Livro 132
Caetês era uma comunidade indígena, título de um livro nunca acabado do personagem João Valério que, no romance do mesmo nome, é o seu narrador. Até a página 100 o livro é relativamente monótono, porque se trata de conversas e encontros de todos com todos numa pequena cidade. Esses encontros se dão nas praças, nas ruas, procissões, na igreja, nas feiras e por aí vai.
O narrador João Valério é apaixonado por Luísa, mulher casada com o seu patrão, Adrião. Mas, ela o desprezava.
Até que no terço final da história se “descobre” que Valério e Luísa tiveram no passado um romance mais íntimo, digamos.
Os encontros entre ambos são reatados com a ausência do marido Adrião em viagem de negócio.
Toda a cidade percebe os encontros de ambos. O romance é denunciado em carta anônima ao marido Adrião, dando-se desfecho inesperado.

Mas, os amantes se separam.








quinta-feira, 12 de dezembro de 2024

O PROFETA de Khalil Gibran

LIVRO 132












Este é um "pequeno" livro consagrado, lançado há um século (1923) é bestseller indiscutível. Na década de 60 fora obra muito considerada pelos termos dos pensamentos do Autor que na sua simplicidade inspiravam pessoas numa época diferenciada, uma juventude ávida de compreensões.

Na apresentação do exemplar que está comigo, há a informação de que Gibran, quanto ao modo de apresentação de seu pensamento, se inspirara, em Nietzsche, na sua obra mais consagrada, "Assim falou Zaratustra" (*). Não sou fã do Autor alemão, mas claro que Gibran só se baseou no formato e não nos pensamentos de Nietzsche com seus "homens superiores", "super-homens" num delírio que perdura até hoje entre os estudiosos de sua filosofia, sem que considerasse a fragilidade do ser humano. O final de sua vida foi prova cabal disso.

Gibran é muito mais evangélico, digamos. 

Enquanto esperava o profeta que chegasse o navio que o levaria, após 12 anos, de Orphalese, para sua ilha natal ele respondia aos temas que lhe eram apresentados pelas pessoas à sua volta. E são muitos.

Vou selecionar alguns conceitos:

Sobre o amor: "Quando amais, não deveis dizer "Deus está em meu coração" mas dizer antes "Eu estou no coração de Deus." / E não penseis que possais dirigir o curso do amor, pois o amor, se vos achar dignos, dirigirá vosso curso."

Sobre o matrimônio: "E vivei juntos, mas não juntos demais: pois os pilares do templo ficam separados, e o carvalho e o cipreste não crescem à sombra um do outro."

Sobre o trabalho: "O trabalho é o amor tornado visível. E se não puderes trabalhar com amor, mas apenas com desgosto, seria melhor que deixasses teu trabalho, sentasse à porta do santuário a pedir esmolas àqueles que trabalham com amor."

(Nesse conceito o ideal do "profeta" seria buscar o valor do trabalho qual fosse - e na vida real esse privilégio não é fácil).

Sobre o crime e o castigo: "O assassinado não é inocente por seu próprio assassínio, / E o roubado não é sem culpa por ser roubado. / O justo não é inocente pelos atos do mau, / E o que tem as mãos limpas não é isento de culpa nos atos do malvado."

(Nestas reflexões parece que o "profeta" deixa entrever que em tudo da vida, prevalece a "lei da causa e efeito" - o karma).

Sobre a liberdade: (Aqui num dado momento de suas reflexões, o "profeta" se refere às coisas desejadas e as temidas - e outras situações que se "movem dentro de vós"); E, então:

"Tais coisas movem-se dentro de vós como pares inseparáveis de luzes e sombras./ E quando a sombra se esvai e já não existe, a luz que se demora torna-se uma sombra para outra luz. / E assim vossa liberdade solta suas amarras, torna-se amarra para liberdade maior."

(Qual será a liberdade maior?).

Sobre o conhecimento de si próprio: "Pois o Eu é um mar sem limites nem medidas. / Não digais "Encontrei a verdade, mas "Encontrei uma verdade." / Não digais "Encontrei o caminho da alma." Dizei antes: "Encontrei a alma andando em meu caminho." / Pois a alma caminha em todas as sendas." (...) "A alma desabrocha, como um lótus de incontáveis pétalas."

(Para os "filósofos do ocultismo", esses conceitos fazem sentido de modo superior).

Sobre a amizade: "Pois na amizade todos os cuidados, desejos e esperanças nascem e são partilhados sem palavras em uma alegria não declarada". 

Sobre a prece e a oração: "E se vós escutardes na quietude da noite, as ouvireis a dizer em silêncio: "Deus Nosso, que és nosso Eu alado, é Tua vontade que quer nós. / É teu desejo que deseja em nós. / É o Teu querer em nós que pode transformar nossas noites, que Te pertencem, em dias que também são Teus. / Nada podemos pedir-Te, pois conheces nossas necessidades antes mesmo que nasçam em nós. / Tu és nossa necessidade; e dando-nos mais de Ti mesmo, Tu dai-nos tudo."

Sobre a morte: "Pois o que é morrer se não estar nu no vento e dissolver-se ao sol? / E o que é cessar de respirar senão libertar o alento de suas marés agitadas, para que possa se erguer e expandir e, desembaraçado, encontrar Deus?"

(Paro nestes conceitos entre inúmeros outros constantes do livro)

E já entardecera, na despedida do profeta de Orphalese com as âncoras sendo recolhidas e um grito do povo:

"E Almitra, a vidente, disse: "Abençoado seja este dia e este lugar, e teu espírito que nos falou." / E ele respondeu: "Fui mesmo eu quem falou? Não fui também um ouvinte". 

Referência:

(*) ASSIM FALOU ZARATRUSTA


NOTA DE DIVULGAÇÃOO PROFETA de Khalil Gibran

Livro 132
Sei que na década de 60 esse livro – lançado há mais de 100 anos – foi bem referido. O profeta é um filósofo que por 12 anos esteve em Orphalese e algum tempo antes de embarcar de volta à sua Ilha natal é indagado por pessoas que o homenageavam antes de sua partida.
São muitos os temas que o profeta responde sempre dando um sentido espiritual, evangélico em suas respostas.
Eu selecionei alguns conceitos de suas preleções. Recomendo que o livro, curto, seja lido numa tarde serena com chuva lá fora. Um tal instante pode aguçar a reflexão.
Sobre a morte: "Pois o que é morrer se não estar nu no vento e dissolver-se ao sol? / E o que é cessar de respirar senão libertar o alento de suas marés agitadas, para que possa se erguer e expandir e, desembaraçado, encontrar Deus?"





terça-feira, 10 de dezembro de 2024

O ANTIGO REGIME E A REVOLUÇÃO de Alexis de Tocqueville

LIVRO 131












O livro trata das causas da Revolução Francesa, mas de um modo "suave" os antecedentes desse movimento que inspiraria outros movimentos, tendo em conta a bandeira da "igualdade, igualdade e fraternidade".

Ano de 1789. O rei Luis XVI, realmente acomodado em seus privilégios e poder absolutista não governava com independência se não fosse sua claque de aristocratas e os religiosos. 

Emais:

(...) em toda a nação a desobediência e já revolta — um exército cujos soldados não merecem confiança — todos os deputados se manifestando contra os editos do rei — e no meio desta anarquia uma corte odiada pela sua cupidez, um rei sem prestígio e já achincalhado, uma rainha publicamente insultada com a alcunha de "A Austríaca" (...) e queimada em efígie em pleno Paris." (*)

Os aldeões era considerados uma massa de obediência, espezinhados pelos resquícios do feudalismo, pelos impostos e pela divisão, com seus senhores, da produção que obtinham.

Esse quadro foi se agravando. Na fase pré-revolucionária, o clero se uniu aos pobres aldeões e até mesmo parte da aristocracia. 

Pensavam numa Constituição mas preservando, sob controle dela, os poderes do rei.

Mas, este não aceitava a diminuição dos seus poderes aumentando a pressão sobre seu reinado e sobre os seus ministros e pensando em repor o absolutismo.

A "Encyclopedia pela Imagem" (*) na revolta que ia crescendo, registra:

"A 15 (de agosto) um bando de 7 a 8.000 mulheres em armas, conduzindo canhões, partindo para onde iam, diziam elas, procurar pão. À noite um deputação de mulheres apareceu na Assembleia, lamentando da carestia e do insulto feito à nação. A Assembleia informou ao rei, que voltava da caça, das reclamações de Paris (ele se acomodara em Versalhes). Vários conselheiros diziam-lhe que fugisse. Mas Necker (um dos seus ministros) recordava o tesouro vazio e as vesgas maquinações do duque d'Orleans. Ficou. Ratificou mesmo os decretos promulgados pela Assembleia desde 4 de agosto."

Nesse quadro revoltoso, antes, em 14 de julho, houve a "tomada da Bastilha". Multidão invadiu a prisão e libertou os poucos presos lá mantidos, inimigos da realeza.

Esse estado de ódio levou ao "período de terror" com muita violência e execuções na guilhotina. Luis XVI e sua esposa Maria Antonieta, em 1793, foram executados na guilhotina.

E muitos outros.

As palavras finais sobre a Revolução Francesa, são estas:

"Quase toda a França aceitou com calma (!?) o golpe de Estado. A Revolução tinha terminado. Os resultados essenciais tinham sido atingido: a igualdade de todos perante a lei e perante o imposto; as terras libertadas, a indústria e o comércio livres; o número de proprietários aumentado pela venda dos bens nacionais; o governo absoluto substituído por um governo constitucional — e a burguesia no poder."

O livro

Essa introdução julguei necessária de ordem a dar ensejo à compreensão, em linhas gerais, da abordagem do Autor Tocqueville que estudou as causas porque ele nasceu em 1805, depois dos acontecimentos graves da Revolução Francesa. Ele se aprofundou na história examinando documentos da época, anotações, atas, cadernos que comprovaram as desigualdades, os privilégios da aristocracia e a isenção de impostos que lhe era garantida e a opressão sobre a classe pobre, sem privilégio algum.

O livro foi publicado em 1856, três anos antes de seu passamento.

Conceitos

. As razões por que essa grande Revolução que se preparava simultaneamente em toda a Europa mas que eclodiu na França; com todas as causas graves essa Revolução não se pensaria em outro lugar que não fosse na França;

. (...) estamos bastante próximos dela para podermos entrar no espírito que a conduziu e para compreendê-lo. Em breve isso ficará difícil, pois as grandes revoluções que são bem sucedidas, fazendo desaparecer as causas que as produziram, tornam-se assim incompreensíveis justamente por causa do seu sucesso;

. (...) o cristianismo havia suscitado ódios furiosos porque os sacerdotes eram proprietários, senhores, dizimeiros, administradores... a Igreja deveria ocupar seu lugar na nova sociedade mas ela ocupava o lugar mais privilegiado e mais forte naquela velha sociedade que seria reduzida a pó. Pelas funções eclesiásticas, esse religiosos possuíam feudos ou propriedades. Tudo na igreja era pago; o pobre não conseguiria sequer ser enterrado gratuitamente;

. Vimos sublevarem quando necessário o pobre contra o rico, o plebeu contra o nobre, o  camponês contra o seu senhor. A Revolução Francesa  foi aos mesmo tempo seu flagelo e sua professora; ela nasceu do ódio pelas desigualdades e o encontros da  igualdade e liberdade;

. A Revolução teve algo de revolução religiosa, religião imperfeita, sem Deus, sem culto e sem outra vida, mas que ainda assim, como o islamismo, inundou toda a Terra com seus soldados, apóstolos e mártires;

. Essas revoluções que afetaram a maioria dos povos europeus substituíram instituições feudais por uma ordem social e política mais uniforme e mais simples que tinham como fundamento a igualdade de condições;

. Diz o Autor que já na época da Revolução não existia nos campos a servidão, porque os camponeses trabalhavam livremente, compravam e vendiam... (!?)

Mas, no tocante à administração de qualquer província, aldeia, por menor que fossem, não tinham poderes para resolver questões particulares a ela pertinentes. Tudo era levado à administração central;

. A Revolução vendeu todas as terras do clero e parte das terras da aristocracia, mas essas terras foram adquiridas por quem já possuía outras.

. O Conselho do rei tinha amplos poderes: judiciário, podendo anular decisões de todos os tribunais, discutir leis e decidir sobre o rateio de impostos. E com tantos poderes, havia abusos. Os impostos de regra oprimiam os agricultores, havendo grandes beneficiários de isenção entre a aristocracia e burguesia. Por desigualdades dessa natureza os menores golpes de arbitrariedade de Luis XVI eram difíceis de suportar comparados com o despotismo de Luis XIV;

A separação da nobreza francesa das demais classes (aldeões, burgueses) era notória e odiosa; cidadãos divididos e encolhidos em si mesmos todos curvados se sujeitando ao poder régio que tolhia as liberdades públicas. O burguês ficou tão apartada do povo quanto o próprio fidalgo. Isso ia preparando os franceses para derrubar o despotismo, talvez para fundar em seu lugar o império pacífico e livre das leis;

. Falta de dinheiro do reino - práticas desonestas: (...) a cada passo encontramos bens da Coroa vendidos e depois tomados de volta como invendáveis; contratos violados, direitos adquiridos não reconhecidos; o credor do Estado sacrificado em cada crise; a fé pública incessantemente falseada;

. Na Revolução Francesa houve alguma influência da independência americana que se deu em 1776. Mas, o Autor enaltece os escritores franceses de tal modo que quando teve de agir, ela (a literatura) transportou para a política todos os seus hábitos; o espirito de Voltaire estava há muito tempo no mundo; mas o próprio Voltaire só podia imperar de fato no século XVIII na França;

. O descrédito universal de todas as crenças religiosas, influenciou a Revolução. Mas, a irreligião produziu  um imenso mal público; no novo regime a religião se recompôs.

Conclusões 

O livro de 218 páginas tem mais do que essa pequena resenha. Quem o leu e quem o lerá? Não sei, talvez acadêmicos estudiosos da Revolução Francesa cujo "enredo" nenhuma ficção poderá equivaler. 

Bom, eu li, anotei e gostei, porque no final de tudo  problemas que motivaram a Revolução Francesa estão presentes em todo o planeta: o descaso que se dá com a pobreza, as desigualdades entre ricos e pobres, os impostos pagos pela classe pobre, proporcionalmente superiores aos pagos pela classe rica. As religiões dizimistas. E quão difícil é mudar isso, qual difícil! 


Referência

(*) Encyclopedia pela Imagem. Edição de Lello & Irmãos constituída de 4 volumes, formados em fascículos que circularam pelos anos de 1938/1940.








NOTA DE DIVULGAÇÃO

Livro 131
Depois de ler esse livro eu me pergunto se alguém mais o leu ou lerá. Certamente que estudiosos da Revolução Francesa.
O Autor consultando documento e cadernos, vai aos detalhes das causas de Revolução Francesa, que eclodiu em 1789 e que teve efetiva repercussão na consagração dos princípios da liberdade, da igualdade e da fraternidade. E com ela o fim do absolutismo, dos fragmentos do feudalismo, dos privilégios da nobreza e da exploração dos aldeões, dos agricultores e dos não privilegiados.
Essa Revolução foi um marco e, diz o Autor que, embora a revolta se ensaiasse em outros países da Europa, ela só poderia ter ocorrido e em nenhum outro lugar que não fosse a França.
Eu apresentei sucintamente o início político da Revolução e, na sequência, algumas pesquisas e conclusões do Autor.

segunda-feira, 14 de outubro de 2024

A CARTOMANTE e outros contos de Machado de Assis

 LIVRO 130












1. A CARTOMANTE

Um triângulo amoroso trágico.

Personagens: Camilo, Rita-Vilela

Camilo e Vilela eram amigos de infância. Rita era esposa de Vilela que amava Camilo.

Esse amor perigoso resultou que Rita buscasse uma cartomante para confessar seu amor e se era correspondida.

Tudo confirmado pelas cartas...

Um dia Camilo começou a receber cartas anônimas nas quais denunciava seu romance com Rita.

Mais sua preocupação aumentou ao receber um bilhete de Vilela que viesse  estar com ele num assunto urgente.

Ele também foi à cartomante para dar indicações do que se passava. 

A cartomante disse a Camilo que não tivesse medo de nada. Nada aconteceria aos amantes.

Camilo vai ao encontro de Vilela, é conduzido num pequeno cômodo, fica horrorizado com o que viu: Rita morta ensanguentada. Camilo não teve melhor sorte.

As cartas mentiram demais...

2. ENTRE SANTOS

Relata antigo capelão de S. Francisco de Paula que dormia tarde não sem antes verificar se as portas da  igreja estavam bem fechadas,

Uma noite ouviu vozes na sacristia e, atônito, constatou que os santos descendo de seus nichos conversavam sobre  a experiência tidas com os fieis que se ajoelhavam sob seus pés. Nessas conversas participavam S. Francisco, S. João Batista e São Miguel.

Todos relataram casos de fiéis, inclusive duma adúltera que veio pedir força para se libertar das garras do demônio. Começou as orações, mas estava com o pensamento no namorado. Saiu sem nada pedir.

Então, relatou S. Francisco a presença de um homem preocupado com a doença e morte iminente da esposa. Era um usurário conhecido.

Veio pedir a intervenção do santo, depositou uma moeda de ouro e insistiu em fazer dezenas de orações objetivando curar a esposa: 300, 1000 padre-nossos, ave-marias.

Todos os santos riram, mas um riso sereno. Não houve confirmação se a moeda de ouro foi mantida. E se as orações foram cumpridas.

Nesse momento o capelão caiu no chão e mais nada ouviu. Acordou com o dia claro, correndo para abrir todas as portas da igreja e da sacristia, "para deixar entrar o Sol, inimigo dos maus sonhos".

3. UNS BRAÇOS

Aqui, também, um esboço envergonhado de um triângulo amoroso.

Inácio, um adolescente de 15 anos, foi "adotado" pelo solicitador Borges, a aprender a profissão. 

Inácio passou a morar na casa de Borges, que o tratava rispidamente — apontava seus erros constantes. D. Severina, indiferente ao garoto a aos maus tratos de Borges.

Inácio, nas refeições, ficava sempre de cabeça baixa, suportando os maus tratos mas não impedia que admirasse os braços bonitos de D. Severina. 

E ela começou a desconfiar. Olhava para o adolescente com curiosidade, mas acreditava que nada acontecia.

Mas, estaria D. Severina, que se dizia bonita, apaixonada pela "criança"?

Num domingo dormindo pesadamente em sua rede, D. Severina se voltou para Inácio. Era até que bonito.

Tremendo, chegou até ele e o beijou na boca. 

Vexada, receou que Inácio estivesse acordado, que tivesse percebido, mas nada aconteceu que denunciasse seu ato de paixão.

Alguns dias depois, Borges dispensou o aprendiz sem muitas explicações.

Para Inácio aquele beijo o faz repetir, sem saber que se enganava:

—  E foi um sonho! Um simples sonho!

4. UM HOMEM CÉLEBRE

Pacheco era um compositor famoso pelas composições de polca (*) que compunha.

Com muita facilidade.

Com frequência em suas andanças ouvia suas composições sendo tocadas e, claro, dançadas.

Essas composições faziam sucesso.

Seu editor com frequência o procurava para novas composições. As polcas...

Mas, Pacheco, como músico muitas vezes tinha ódio das polcas. Queria algo mais, compor musicas clássicas nos padrões de Mozart, "mas nada, nada, a inspiração não vinha; a imaginação deixava-se estar dormindo". 

Já casado com viúva jovem, tuberculosa, num domingo a chama para ouvir um noturno. Maria dedilha no piano a peça e ambos constatam que era um trecho de oba de Chopin.

Pestana empalideceu.

A esposa morre da doença, mais tarde ele também morre mas nunca se livrou das polcas.

(*) "A Polca é um gênero musical e uma dança de origem europeia que se popularizou principalmente nos séculos XIX e XX. Originária da Boêmia, região que hoje faz parte da República Tcheca, a Polca é conhecida por seu ritmo animado e alegre, que geralmente é executado em compasso 2/4".

5. ERA EXTRAORDINARIAMENTE BELA

Há aqui, também, um triângulo amoroso frustrado, mas um triângulo,

Quintília era a lindíssima, magra, lindos olhos que o narrador da história e seu sócio João Nóbrega, ambos se apaixonaram por ela.

E por isso pouco falavam dela, mas "combatamos pela nossa Quintília, minha e tua, mas provavelmente minha, porque sou mais bonito que tu". 

Então, Nóbrega "arranjou uma nomeação de juiz municipal lá pelos sertões da Bahia, onde definhou e morreu antes de acabar o quatriênio". Morreu apaixonado.

O narrador num dado momento pede Quintília em casamento mas ela não aceita e sugere que sejam apenas amigos.

Quintília tinha uma moléstia "da espinha".

Definhando, resolve Quintília se casar à beira da morte, e ele a "abraçou pela primeira vez, feita cadáver."

Do casamento tenha ela uma aversão puramente física.

"Casou meia defunta, às portas do nada. Chame-lhe monstro, mas acrescente divino".

6. A CAUSA SECRETA

Neste conto, também o triângulo amoroso.

Os personagens, o médico Garcia, Fortunato e esposa Maria Luiza.

A amizade entre eles foi se firmando e, nesses contatos, Garcia, o médico se voltou para Mara Luiza de modo o mais discreto possível.

Tudo começou com uma vítima de esfaqueamento, que Garcia como médico tratou e Fortunado agiu como dedicado enfermeiro.

Nesse relacionamento entre ambos, Fortunato propôs a Garcia abrirem uma clínica. O médico relutou mais aceitou. Fortunato administrava a clínica com muita eficiência, uma preocupação da esposa porque o marido se envolvia com doentes e doenças.

Fortunato passou a estudar anatomia e fisiologia e fazia suas experiências mórbidas com cães e gatos, pelo que Garcia, apoiando a esposa do amigo, pediu que parasse com essas maldades.

O clímax se deu numa noite antes do jantar quando Fortunato torturava um rato de modo cruel porque teria o bichinho se apoderado de papeis importantes.

A partir daí — para não perder o costume desses contos do autor —, Maria Luiza adquiriu a tuberculose, tossia muito e faleceu, para os lamentos de Fortunato que a amava a seu jeito.

Acordando dum cochilo Fortunato flagrou o médico Garcia, beijando por duas vezes a testa da morta. Garcia chorou muito e 

"Fortunato, à porta, onde ficara, saboreou tranquilo essa explosão de dor moral que foi longa, muito longa, deliciosamente longa".

7. O CÔNEGO OU A METAFÍSICA DO ESTILO

Começa assim:

— "Vem do Líbano, esposa minha, vem do Líbano, vem... As mandrágoras deram o seu cheiro. Temos às nossas portas toda a casta de pombos..."

(...)

Então o cônego Matias, pregador efetivo, é convidado a escrever um sermão para uma festa.

Ele se debruça sobre o teor do sermão. "De repente, indo escrever um adjetivo, suspende-se; escreve outro e risca-o, mais outro, que não tem melhor fortuna. Aqui é o centro do idílio. Subamos à cabeça do cônego".

Os substantivos e os adjetivos nascem em centro diferentes do cérebro. Os adjetivos do lado esquerdo. Adjetivos e substantivos têm enlevos sexuais.

Amam-se uns e outros. O casamento é o estilo...

Entram no texto Silvio e Silva que prosseguem em busca um do outro:

— Vem do Líbano esposa minha...

"Procuram- se e acham-se... "Unem-se e entrelaçam os braços..."

"Silvia caminhará agora ao pé de Silvio, no sermão que o cônego vai pregar um dia destes, e irão juntinhos ao prelo..."

8. TRIO EM LÁ MENOR

Aqui, também, um triângulo amoroso, para não perder o costume da temática preferida do Autor. Afinal, em Dom Casmurro (*) esse triângulo insinuado ou às claras foi o mote do romance.

Maria Lúcia tem dois namorados ao mesmo tempo, Maciel de 27 anos e Miranda de 50 anos.

Maciel era mais refinado, circulava no meio da alta sociedade, fútil, dado a falar francês que se notabilizou por ter salvo uma criança que correu na frente dos cavalos da carruagem que transportava exatamente a namorada Maria Lúcia e a avó. Ele virou herói para ambas.

Era comum os dois namorados se defrontarem na casa da namorada. Miranda, já demonstrando a idade que tinha, era mais frio, digamos, adulto. Era pianista.

Passou um tempo, Maria Lúcia se aborreceu dos dois namorados. Ela leu num jornal que havia estrelas duplas.

Viu duas rodelas tipo olho de gato na parede. E, então, fechou os olhos e dormiu. 

"Sonhou que morria, que a alma dela, levada aos ares, voava em direção de uma bela estrela dupla".

Por toda a eternidade oscilaria entre dois astros incompletos...

AcessarDOM CASMURRO


NOTA DE DIVULGAÇÃO

LIVRO 130 – A CARTOMANTE E OUTROS CONTOS de Machado de Assis
São oito contos ligeiros. A maioria tem como temática o triângulo amoroso.
Destaco “A Cartomante” e “Uns braços”.