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segunda-feira, 11 de setembro de 2017

O PRESIDENTE NEGRO de Monteiro Lobato

LIVRO 21


















Por ocasião da última campanha presidencial americana na qual se sobressaíra Barack Hussein Obama eleito Presidente dos Estados Unidos em 2009, foi lembrada  antiga obra de Monteiro Lobato, “O Presidente Negro”, escrita em 1926.

A história se desenrola no ano de 2228 e nesse ano os Estados Unidos elegeram um presidente negro, no caso Jim Roy.

O livro de Lobato fora escrito nem 40 anos completos da libertação dos escravos por aqui.

Então, para muitos até hoje - e o que dizer dos Estados Unidos? - os negros sofrem preconceito racial, em algum momentos de forma violenta e perversa.

Mas, será uma obra racista? Diremos impressões linhas à frente.

O livro surpreende.

De início a obra parece que desprovida de seriedade, considerando o nome da empresa para a qual trabalhava o "herói" do livro, Ayrton: "Sá, Pato & Cia Ltda".

A esses patrões soberbos, Ayrton tinha forte submissão.

Porém, para ostentar situação diferente do que mero funcionário burocrático, compra um Ford e por causa do carro recebe até aumento de salário.

Mas, não dura muito. Acidenta-se, fere-se sendo socorrido pelo sábio professor Benson que o conduz até seu castelo na região de Friburgo e lá conhece miss Jane.

Benson o hospeda por  semanas no castelo,  período em que é iniciado nos experimentos do professor. 

As explanações ficam aos cuidados da lindíssima filha Jane, loura de olhos azuis.  

O professor falece, suas invenções são destruídas, mas os eventos futuros (pelo porviroscópio) ficam por conta de miss Jane que convida Ayrton para encontros todos os domingos.

Futurismos de Lobato, "apostando" nas ondas de rádio:

Pelo radio-transporte, desnecessidade de se deslocar para o trabalho que poderá ser feito na própria casa (homeoffice);

● Possibilidade da entrega de produtos sem o entregador - não está afirmado mas tudo se resolveria pelo rádio-transporte (drones?);

Voto eletrônico. Os eleitores não saíam de casa para votar: "Um aparelho engenhosíssimo os recebia (os votos) e apurava automática e instantaneamente";

As comunicações por ondas de rádio levariam imagens às residências (algo como televisão).

Mas, na sua história passada nos Estados Unidos em 2228, a população negra era, digamos, um problema para a raça "ariana" branca e superior, algo levemente parecido com o que se daria anos depois com o nazismo em relação aos judeus e outras populações ditas "inferiores". 

A eugenia resultara na beleza de todos os indivíduos. Os tarados e outros indesejáveis por esse processo, foram banidos. 

Os negros por técnicas aplicadas eram "desbotados", um branco indisfarçavelmente "diferente", mas os cabelos sempre carapinhados.

Não havia o casamento entre as raças, que seria um erro, porque ambas se "estragariam". Então, a comunidade branca pretendera até mesmo transferir os negros para alguma região na Amazônia, na discussão do que fazer com eles.

Mas, e a eleição do presidente negro como se deu?

Para tal vaticínio, se valera Lobato dos seguintes argumentos:

● Os partidos Republicano e Democrata uniram-se como Partido Masculino contando com o apoio dos negros;

● O Partido Feminino contava com a liderança de “miss” Evelyn Astor, rica de todos os dotes de Inteligência, de cultura e da “maquiavélica sagacidade feminina”, se juntava um elemento perturbador no novo jogo político presidencial: “a sua rara beleza”.

Ademais, “nesse ano de 2228 já a mulher vencera o seu estágio de inferioridade política e cultural...”

Com a divisão dos brancos, foi eleito o líder negro Jim Roy, com 54 milhões de votos que "traiu" o partido Masculino.  “Miss” Astor obtivera 50,5 milhões de votos e Kerlog, branco, 50 milhões. E assim, fora eleito o primeiro presidente negro, Jim Roy: 

“Apesar de disporem de um eleitorado de quase o dobro os brancos perderiam a presidência graças à cisão entre os dois sexos provocado pelo “elvinismo” (de “miss” Elvin, na história feminista radical).

Os homens não passavam de gorilas sem pelos...

O que fazer? se perguntava a cúpula branca, coordenada pelo presidente Kerlog.

Reuniões dos luminares brancos se sucediam até que um idoso do grupo John Leland inventor famoso faz uma proposta "definitiva" ao "problema dos negros".

Mantido em sigilo absoluto, uma fórmula contendo um princípio ativo denominado de "raios ômega", possibilitava que os negros poderiam alisar os cabelos.

Mas, na sua fórmula, estava incluída uma substância esterilizante.

Todos os negros aderiram ao alisamento dos cabelos carapinhados e com o tempo, foram desaparecendo porque estéreis,

O presidente eleito Jim Roy,  que havia aderido ao alisamento dos cabelos, num encontro "emocionante" provocado pelo presidente Kerlog - que admirava o líder negro -, comunica-lhe o golpe fatal.

Jim Roy no dia seguinte é encontrado morto.

Novas eleições, Kerlog é reeleito agora com o apoio incondicional das mulheres  que voltaram a considerar os homens como seus companheiros inseparáveis contrariando de modo definitivo a tese do elvinismo de que o homens eram elementos estranhos em fazer par com elas. Elas seriam de outra origem, as sabinas raptadas...

Evelyn Astor se casaria com Kerlog.

Então, a solução final aos negros, fora uma patifaria monumental.

Encerrando o livro, efetivou-se o romance entre o apaixonado Ayrton, tímido, funcionário burocrata e a linda, culta e inteligente miss Jane, a loura de olhos azuis que foi beneficiado pela convivência com sua mestra. E daí, o amor... selado por um beijo "sem fim" do tipo do  de John Barrymore astro de cinema daqueles idos 

O livro é interessante mas não posso deixar de considerar seu cunho racista.


Apêndice

Claro que esse “erro” de pouco mais de 200 anos em suas previsões, deve-se ao fato de que, nos tempos em que Lobato escrevera a história, o preconceito racial nos Estado Unidos era muito mais exacerbado do que nos dias de hoje.

Essa intolerância se manifestara de modo intenso na década de 60, relembrando-se os conflitos violentos havidos em 1962, na cidade de Los Angeles nos quais negros praticaram saques, depredações e agressões, depois da absolvição de policiais que covardemente haviam espancado um negro a ponto de provocar fratura craniana. 

A absolvição dos policiais fora decidida por um júri composto de brancos.

Essas cenas têm se repetido até hoje com grande repercussão.

Dentre todos esses conflitos e mortes, mencione-se o assassinato de Martin Luther King, ativista negro, religioso e pacifista, então com forte influência política, morto em 04.04.1968. Há dúvidas sobre sua morte, o mandante e as motivações; há até mesmo menção a uma “teoria conspiratória”. Ele tinha um sonho:

“Eu tenho um sonho de que um dia esta nação vai se levantar e viver o verdadeiro significado de sua crença: 'Consideramos essas verdades autoevidentes: que todos os homens são criados iguais'. Eu tenho um sonho de que um dia, nas montanhas da Geórgia, os filhos de antigos escravos e os filhos de antigos donos de escravos serão capazes de sentarem-se juntos à mesa da fraternidade. Eu tenho um sonho de que meus quatro filhos um dia viverão numa nação onde não serão julgados pela cor de sua pele, mas sim pelo conteúdo de seu caráter.”

Registre-se que na época da morte de Luther King já vigorava nos Estados Unidos, desde 1964, a lei dos direitos civis – de cuja luta participara – que proibia discriminação no que se refere à religião, à nacionalidade, inclusive no âmbito profissional. 

Pouco tempo depois, a proibição de discriminação se estendeu a indivíduos com mais de 40 anos e de práticas salariais diferenciadas entre homens e mulheres, que exerçam trabalhos iguais ou semelhantes.

Tudo isso sistematizado na denominada “ação afirmativa”, que garantiria “oportunidades iguais de emprego entre os americanos”, indica que os negros de lá, de um modo ou outro, conquistaram e conquistam oportunidades efetivas de ascensão social e profissional. 

No cinema, os negros deixaram de ser coadjuvantes para se tornarem protagonistas. O cinema é uma espécie de vitrina da sociedade americana o que de bom e ruim. Mas, esses avanços não significam que se estabeleceu o paraíso entre negros e brancos.

O fato significativo é que a vitória do mulato Barack Obama, fora sufragado por brancos, negros, hispânicos, incluindo nomes influentes. Todos acreditavam que a vitória de Obama significaria uma guinada necessária nos padrões americanos. A realização do sonho do Martin Luther King. 

O nosso Monteiro Lobato que “previra” a possibilidade de um presidente negro nos Estados Unidos para daqui a dois séculos não poderia, no seu tempo de tantos conflitos raciais, imaginar todas essas mudanças, o avanço tecnológico vertiginoso e a “inacreditável” internet.

O racismo e o preconceito continuam, mesmo entre nós.

Até quando?




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