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domingo, 13 de dezembro de 2020

CRIME E CASTIGO de Fiódor Mikhailovitch Dostoiévski

 LIVRO 77



Quando um escritor assim se qualifica deve cuidar antes de conhecer um Dostoiévski para ponderar o que é escrever uma história

Já falei de outros dois livros dele (*), mas a sua obra-prima, escrita datado de 1865, além da história com forte cunho psicológico descreve todos os transtornos e medos que afetam constantemente o personagem principal, Raskólnikov que, pela pobreza, vive ocioso, e a falta de perspectiva ao abandonar a faculdade de direito por não poder pagá-la.

E é nessa dia a dia de pobreza, a convivência com personagens à margem da vida, sobrevivendo de migalhas e, em muitos casos, perdidos na bebida que transita Raskolnikov .

Relato impressionante é o do personagem Marmieládov, um alcoólatra inveterado que anula a família, deixa-a na miséria absoluta por conta da bebida. Sua filha Sônia,  prostitui-se para ajudar sua família (madrasta e filhos) e ele vive angustiado com o vinho que precisaria beber sem freio. E, para isso, subtrai valores ínfimos que serviram para a alimentação de seus filhos. Ao chegar à sua pobre moradia, sua penitência eram as surras que a mulher desesperada lhe impunha:

“– Isso me consola! Não creia que isso seja para mim um sofrimento, mas sim um prazer, senhor! – exclamou ele, enquanto Ekatierina Ivánovena lhe sacudia com força a cabeça, chegando mesmo a bater com ela no assoalho”.

Marmieládov teria um fim trágico: atropelado por uma diligência, foi pisoteado pelos cavalos, sofrendo graves ferimentos. Nos seus momentos finais, levado para casa, diante da família miserável em sua volta, porque o alcoolismo a destituía de tudo, não do amor mesmo da esposa e filhos, faleceria.

Raskólnikov dera toda a assistência à família do amigo, até mesmo deixando um soma em dinheiro que recebera da mãe para o seu próprio sustento.

Essa visão e esse modo de vida de tanta carência, numa noite, no seu quarto diminuto e pobre, Raskólnikov tem um pesadelo que se desdobra: o espancamento até a morte de uma eguazinha obrigada por seu dono a puxar pesado fardo, com bêbados sobre a carroça. Não conseguindo mas se esforçando, é espancada até a morte sob as gargalhadas daquele gente perdida pela bebida. E o menino muito penalizado, nada pode fazer para evitar o crime contra o animal indefeso.

No outro relato do sonho aterrador o grande autor russo descreve as imediações da taberna:
“Havia sempre ali uma turba que berrava, ria, se enfurecia e brigava, ou que cantava com voz rouca coisas de apavorar! Nos arredores da taberna sempre andavam bêbados de rostos horríveis!... (...) A passagem que conduz à taberna está sempre coberta de uma poeira negra”.


Esses os terrores psicológicos de sua vida de ócio, ex- estudante Raskólnikov alimentando-se precariamente mas contando com a  presença da serviçal da pousada (Nastássia) que sempre lhe servia alguma coisa, um resto de chá e de comida. 

O ambiente posto na obra, e de vida pobre, de fome e falta de perspectivas. 

Num certo dia  Raskolnikov estivera mais uma vez na casa da usuraria Aliona Ivanóvna para empenhar um pequeno anel, recebendo valor irrisório. O modo de agir de Aliona o fazia pensar nalguma "coisa grave" em relação à vida dela porque se valia do desespero dos pobres que chegavam até ela com algum objeto de valor recebendo quantia irrisória.

Numa taverna nesse mesmo dia ouve o diálogo entre dois homens que se referem a velha Aliona como uma figura desprezível para a sociedade e que se fosse morta o mundo nada perderia.

A partir desse momento Raskólnikov engendra o crime e o roubo justificando-o, mentalmente, como uma maneira de avançar na vida, livrando a sociedade de uma mulher perniciosa.

Num artigo defendera que homens extraordinários poderiam cometer assassinatos para um bem maior. E nessa linha de raciocínio se perguntava como reagiria Napoleão, precisando evoluir, se se deparasse com um "obstáculo" dessa natureza...

Ademais, o assassinato individual é um crime. O extermínio de cidades numa batalha passa a ser um fato histórico.

E nesse drama que vai assumindo, com suas fraquezas e suas febres e seus distúrbios físicos e psicológicos, prosseguindo nos planos, consegue na própria pousada obter correndo risco de chamar a atenção se visto,  um machado que esconde entre suas roupas.

Faz um embrulho pesado de um peça falsa de tal maneira que a usurária perdesse tempo em abri-lo e nesse momento ataca a mulher com  machadadas e a mata. Sai a procura do cofre, do dinheiro, mas num estado emocional incontrolado obtém um pequena bolsa e algumas joias.

Mas, enquanto nessa busca ouve que a irmã de Aliona, Lisaiveta chegara à casa e ao se deparar com a cena terrível da irmã morta, estanca sem reação. Raskólnikov decide naquele seu delírio e pânico, matá-la também com o machado.

Havia operários trabalhando num quarto ao lado, dificultando sua fuga. Mas, consegue sair do prédio sem ser visto.

Esconde o produto do roubo num terreno sob uma pedra e de nada se utiliza, mal sabendo exatamente o que obtivera com o roubo.

A partir dai, entre pesadelos, febre e delírios, sua vida se torna infernal. Nos seus delírios chega a mencionar joias num esconderijo mas não resultando em suspeitas.

Nos momentos de maior angústia, pensava em se entregar ou talvez se suicidar.

PERSONAGENS DA HISTÓRIA

Avidótia Romanovena  (Dúnia) / Pulkéria Alieksádrovna 

Irmã e mãe de Raskolnikov trazidos a São Petersburgo pelo noivo de Dúnia, Lújin, alojando-as em pousada precária. O irmão se opôs de modo veemente ao casamento revelando-se, depois, que Lújin era de má índole. Isto é, sem escrúpulos.

Ambas amavam Raskólnikov e tudo faziam por ele, mesmo na condição que o encontraram: empobrecido, ocioso e adoentado morando num pequeno cômodo.

Razumíkhin

Amigo dedicado de Raskólnikov muito o ajudara em sua doença e quando resolvera este deixar a família porque tinha consigo o grande segredo do duplo assassinato, a verdade prestes a eclodir e querendo poupá-la de tudo que adviria, foi Razumíkhin que dera todo o apoio à sua mãe e irmã. Mais tarde se casaria com Dúnia equilibrando a família de Raskólnikov. O casal planejava a criação de uma editora.

Porfiri Pietróvitch

Juiz de instrução que ao somar os indícios do crime contra as irmãs, o que deixara escapar Raskólnikov em contatos com ele e ao saber que voltara à cena do crime, meio combalido, perguntando aos operários que lá trabalhavam se havia limpado a mancha de sangue. 

Também as informações que lhe foram passadas pelo médico Zóssimov que cuidava de Raskólnikov quando de sua febre alta e o que balbuciou em seus delírios.

Há o ensaio de uma mudança de rumos, num momento crucial entre ambos: surge Mikolka, um operário que trabalhava numa moradia vizinha à da assassinada, declarando-se o verdadeiro assassino. Embora tumultuasse as investigações, foi revelado, depois, que Mikolka tinha lá suas crenças que incentivavam o sofrimento.

Porfiri o acusa formalmente de ser o assassino das mulheres. Ele nega.

Então, diante de uma situação insustentável, Raskólnikov vai se convencendo que o melhor seria confessar à policia que era ele o autor dos assassinatos.

Confessando, sua pena seria menor.

Ekatierina Ivánovena

A víuva de Marmieládov e madrasta de Sônia tem um fim trágico com a tuberculose agravada. 

Quando Sônia foi injustamente acusada pelo noivo de Dúnia, Lújin de ter roubado uma nota de cem rublos, Ekatierina demonstrou todo seu amor à enteada defendendo-o às lágrimas.

No desespero pela fome dela e dos filhos, fantasia-os com andrajos e saem pelas ruas promovendo cantares tristes porque as crianças choravam e sofriam muito, a troco de alguns copeques ou rublos como um homem lhe deu,  mas revelara sua loucura e a humilhação de uma "mulher nobre" na miséria.

Sua morte se dera num clima de emoção. 

Svidrigáilov, um personagem contraditório, que herdara valores de sua esposa falecida - fora acusado de a ter assassinado - faz um depósito em rublos para garantir um bom orfanato para os órfãos. Também premia Sônia com quantia importante porque ela não poderia continuar na "mesma vida".

Sônia

Raskolnikov a conhecera nos eventos que resultaram na morte de Marmieládov.

Começa a se relacionar com ela, a atormenta com falta de perspectivas da vida de ambos, convida-a a fugirem para longe de tudo. E, então, confessa o duplo assassinato.

Sônia, atônita, entra em desespero e sugere que ele se entregue à polícia para pagar pelos crimes.

Depois do incidente na moradia de Svidrigáilov fora Sônia quem informara a Dúnia os assassinatos praticados por Raskólnikov.

Svidrigáilov

Viera para São Petersburgo  onde tinha uma jovem noiva.

Morando num cômodo contiguo ao de Sônia, ouviu toda a confissão de Raskólnikov.

Dúnia no passado fora professora na casa de Marfa Pietrovena com quem Svidrigáilov era casado. 

Então, apaixonado por Dúnia, ele a convida por carta para um encontro em sua moradia quando lhe revelaria um assunto muito grave sobre o irmão.

Ela vai e ele apaixonado, destacando quão linda era, tenta violentá-la. O suspense da ameaça é angustiante ao leitor. Ela saca um revolver que fora de Marfa no passado que ela obtivera  e diante do iminente ataque ela atira atingindo Svidrigáilov de raspão na cabeça.

Dúnia o acusa de ter assassinado a esposa Marfa.

Svidrigáilov deixa Dúnia sair, limpa o sangue que escorreu de sua cabeça ferida, toma o revolver que ficara no chão e sai.

Sob chuva intensa, vai tarde da noite à casa dos país de sua noiva, deixa um valor significativo em dinheiro retira-se suicidando-se com um tiro na fonte direita.

CONDENAÇÃO

Por ter confessado os assassinatos perante as autoridades policiais, sua condenação fora de oito anos com trabalhos forçados, numa prisão na Sibéria.

Sônia muda-se para lá e dá todo o apoio possível a Raskolnikov fora da prisão.

A mãe morre sem saber ao certo porque Raskolnikov não a visitara mais embora nos último dias de vida desconfiasse que o filho enfrentava graves dificuldades.

Dúnia e Razumíkhin planejam mudar-se para a Sibéria no futuro.

Faltando sete anos, ainda, para o cumprimento da pena, Raskolnikov e Sônia constatam que estavam apaixonados.

CONCLUSÕES

O livro é extraordinário. O relato dos distúrbios psicológicos pela culpa que atormenta Raskolnikov, a febre e o delírio tornam o livro uma novela de suspensa "interminável". Há momentos angustiantes. Os momentos que antecedem o tiro dado por Dúnia ameaçada de violação por Svidrigáilov é um deles.

Não sei, mas vejo alguma relação entre os "homens extraordinários" do tema do artigo de Raskolnikov, acima do bem e do mal, alguma coisa parecida com os "homens superiores" de Nietzsche sem compaixão e sem religião. Nietzsche era leitor de Dostoiévski.

Em termos de "herói assassino" pode ser lembrado, Stalin.

É um livro que o amante da leitura não pode deixar de ler ou reler.

Excepcional em suas mais de 550 páginas.


Referências 


(*) Do mesmo Autor:

“Recordações da Casa dos Mortos”, acessar: https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2018/01/34-recordacao-da-casa-dos-mortos-de.html

“O Jogador”, acessar:

https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2018/07/47-o-jogador-de-fiodor-mikhailovitch.html







domingo, 27 de setembro de 2020

O APANHADOR NO CAMPO DE CENTEIO de Jerome David Salinger

  LIVRO 76

Há alguns anos li esse livro porque me caiu em mãos num período de relativo isolamento e, então, me pus a lê-lo sem interesse.

Qual o impacto de suas páginas? Um jovem pelos seus 16 anos perdido porque fora expulso do Internato Pencey por reprovação, fumante inveterado - naqueles tempos nos quais a ligação de uma cena a outra nos filmes americanos se dava pelo acender do cigarro - o consumo desesperado da bebida e o uso constante da gírias como "o cinema é uma droga", "o bar é uma porcaria".

Naquele oportunidade, levei o livro ao seu final meio forçado.

Agora quando o releio fico sabendo que na década de 50-60 vendeu cerca de 65 milhões de exemplares, "num ritmo de 250 mil por ano", na verdade, um fenômeno literário inegável.

E sua influência fora forte entre os jovens por uma série de dúvidas, angústias e principalmente insegurança, sentimento típico daqueles tempos que enfrentava um jovem que "perdera o chão" ao ser jubilado da escola porque fora reprovado em todas as matérias menos no inglês.

O Autor Jerome David Salinger, de Nova York (1919-2010) especialmente depois desse livro (escreveu outros) viveu recluso desde 1951 e de sua biografia, se diz que ele era violento e autoritário e, adepto da cintologia, por causa disso ou não, bebia sua própria urina (!)

Naqueles tempos das décadas de 50-60, nos colégios públicos brasileiros - era uma regra, pelo menos no Estado de São Paulo - qual aluno teve a experiência do jubilamento por duas reprovações na mesma série? A "perda do chão", o vexame perante os pais e colegas que ficaram e seguiram para a série seguinte, a ironia, a busca de outra escola, que poderia estar distante e ouvir pela terceira vez tudo o que ouvira naquela da qual fora expulso.

Embora a década de 60 fosse mágica, aquela consciência fictícia da imortalidade, havia essa insegurança entre o jovens. Vivendo naqueles dias, identifiquei muitos pontos do livro que diziam da realidade jovem daquela época.

Holden Caulfield está nos último dias de hospedagem no Pencey diante da expulsão. Seu companheiro de quarto, entre tolerância e ódio era Stradler que se dava muito bem com as garotas, inclusive com sua possível namorada, a Jane. Sem motivo Holden atacou Strader, talvez enciumado pela Jane. Num quarto ao lado, Robert Ackley que não escovava os dentes, cheio de espinhas no rosto.

Holden implicava com ambos mas, no dia a dia de sua angústia, precisava deles. E a saudade de ambos ele revelaria no final de sua aventura de perdido em Nova York vez por outra usando seu chapéu de caça vermelho, baixando as abas para proteger as orelhas do frio.

Sempre pensava em seu irmão D.B. escritor que estava em Hollywood e estaria escrevendo um roteiro para um filme. Esse trabalho do irmão ele não gostava, até porque o cinema "é uma droga".

Além da angústia de que haveria que enfrentar ao voltar para casa como aluno expulso batia-lhe o fato de ser "virgem" sexualmente. Seu relacionamento com a garotas embora fosse constante ele não avançava para aquela fase da consumação da experiência sexual assim que qualquer delas dissesse que ele não avançasse.

E seus assuntos nem sempre eram agradáveis, românticos.

Sentiu-se indisposto diante da prostituta que contratara. Foi lesado, agredido pelo cáften na discussão do preço que fora dobrado e, pagou e, claro, não "aproveitou" os serviços da apressada profissional.

Quando não tinha onde ficar, porque não se encorajara a assumir perante os pais a expulsão do Pencey, depois de uma noite de bebedeiras e de modo sorrateiro, vai ao apartamento dos país - que estavam ausentes - para conversar com sua irmã de dez anos,  Phoebe. Ela desconfiou que seu irmão fora expulso e diz:

- Papai vai te matar.

Falando em abandonar tudo, morar numa casinha próxima de matas, não tendo para onde ir,  então num momento de  inconveniência, liga para o professor Antolini que o acolhe em seu apartamento. 

Dá-lhe conselhos como neste trecho:

- Por incrível que pareça, isso não foi escrito por um poeta. Foi escrito por um psicanalista  chamado Wilhelm Stekel (...) Aqui está o que ele disse: " A característica do homem imaturo é aspirar a morrer nobremente por uma causa, enquanto que a característica do homem maduro é querer viver humildemente por uma causa".

O homossexualismo era uma realidade, a "veadagem", mas enrustida naqueles tempos contidos. 

Então, Holden Caulfield cansado e já melhor da bebedeira que diminuíra com o café, adormece profundamente no sofá curto para ele, mas é acordado por carícias do professor Antolini em seus cabelos,

Assustado, rapidamente deixa o apartamento desconfiado das intenções do professor e revela o assédio dessa natureza desde criança.

Antes de buscar suas malas guardadas na estação, remete um bilhete para sua irmã Phoebe na escola, informando que vai "sumir" dali, procurar um emprego e viver isolado. E informa a ela que a espera na porta do museu.

Enquanto na escola da irmã incomodou-se com a inscrição na parede com as palavras: "foda-se". Preocupado com o que poderiam questionar as crianças sobre o seu significado, tenta apagá-las.

Então, ele a vê com uma velha mala e ao saber do que se trata, sua irmã lhe diz que queria "fugir" com ele - o livro não explica como ela arrumou a mala saindo de casa sem ser vista porque simplesmente não sabia que o irmão fugiria. [liberdade poética?].

Outro ponto controverso: como um jovem de 16 anos nos Estados Unidos, embora de estatura 1,85 m., pôde frequentar casas noturnas, beber sendo raramente questionado sobre a idade, se hospedar em hotéis, mesmo que baratos?

Mas, no seu desequilíbrio chega a dizer que, "se um dia eu morrer e me enfiarem num cemitério, com uma lápide e tudo, vai ter a inscrição "Holden Caulfield", mais o ano em que eu nasci e o ano em que morri e, logo abaixo, alguém vai escrever "Foda-se". Tenho certeza absoluta."

As linhas finais do livro revelam que Holden Caulfield voltou para a casa dos pais mas revela que não explicaria como.

O TÍTULO DO LIVRO TEM ESTA EXPLICAÇÃO:

Diálogo entre Holden e sua irmã Phoebe: "Você conhece aquela cantiga: "Se alguém encontra alguém atravessando o campo de centeio"? Eu queria... - A cantiga é "Se alguém encontra alguém atravessando o campo de centeio"! - ela disse. É dum poema do Robert Burns. - Eu sei que é dum poema do Robert Burns. 

Mas ela tinha razão. É mesmo "Se alguém encontra alguém atravessando o campo de centeio". Mas eu não sabia direito(...)direito."

MORAL DA HISTÓRIA

O livro vendeu tanto porque muitos foram jovens no final da década de 50 e 60 do século passado que se identificaram com alguma passagem ou várias delas explanadas no livro, no tocante às dúvidas sobre o futuro, sobre os desafios do dia a dia naquela idade juvenil e até a consumação da experiência sexual.

O estudante jubilado, quem teve essa experiência, enfrentara um momento terrível, especialmente quando mau aluno, sabe que tem que continuar estudando em qualquer escola que seja, em qualquer localidade que seja. 

E aí, o "castigo".





domingo, 6 de setembro de 2020

COMO VIVER NESTE MUNDO de Jiddu Krishnamurti

LIVRO 75


Quem foi Krishnamurti?

Ele nasceu em Madras, Índia, em 11 de maio de 1895.

Ele e seu irmão Nytiananda eram inseparáveis até na fome. Mãe falecida na infância e pai com dificuldades de sustentar a família.

Morando em Adyar aproximaram-se os irmãos sem qualquer interesse da denominada Casa dos Sábios na qual  Annie Besant, Charles W. Leadbeater e outros se dedicavam aos estudos esotéricos.

Bem recebidos, estreitaram a a amizade com esses estudiosos.

Autorizado pelo pai, os irmãos foram introduzidos, em 1909 na Sociedade Teosófica onde receberam educação e ensinamentos. Annie Besant, eleita presidente internacional da Sociedade Teosófica - uma mulher lutadora com inteligência superior que teria forte influência na sua comunidade pelo domínio espiritual que lhe era atribuído -, dizia ter contato com os mestres espirituais de altas hierarquias e por eles fora informada que Krishnamurti seria o veiculo de um grande espírito. Ele incorporaria um ente espiritual de elevada espiritualidade. Seria o "Instrutor" do mundo.

Em 1925, quando Krishnamurti estava fora do círculo, na Califórnia, cuidando de seu irmão muito doente, que viria a falecer, os teosofistas e adeptos fanáticos se reuniam em Ommen, cidade da Holanda o proclamaram esse avatar "esperado", por injunção de Besant considerando as instruções que recebera dos Mestres.

Mas, para surpresa geral, Krishnamurti não aceitou essas designações e renunciou a tudo isso rompendo filosoficamente com a Sociedade Teosófica e com a Ordem da Estrela do Oriente a qual presidia, proclamando que passaria a ter a partir de então, a liberdade de pensar e transmitir ensinamentos ou mensagens para melhorar esse mundo cheio de violências, de guerras, de ódios e do caos. Proclamara-se um homem livre sem ouvir autoridades ou religiões.

A Fundação que leva o seu nome é garantida por doações havidas na Holanda e na Califórnia na década de 20.

Muitas da informações que vou expressando nesta resenha, foram obtidas do livro "Krishnamurti" uma biografia escrita pelo médico brasileiro Francisco Ayres.


"COMO VIVER NESTE MUNDO"  

Como chegou esse livro de 127 paginas até mim há muito tempo, não posso precisar. 

O que posso dizer é que na década de 60, Krishnamurti era muito lembrado, até porque ele criticava de modo veemente a guerra no Vietnam, a violência neste mundo caótico, falava das drogas que poderiam aumentar o grau de consciência de modo artificial, dos jovens viciados, a explosão sexual, além de não professar qualquer religião...

Bom, com essas lembranças me pus a ler os dois livros, o de Krishnamurti e também o livro biográfico do filósofo, de autoria de Francisco Ayres,

Confesso que no tocante ao livro de Krishnamurti, não posso deixar de expressar a minha decepção. Ele foi constituído de 10 palestras realizadas em 1967 na cidade de Saanem, Suiça cujos temas posso enumerar: "Escutar e aprender", "A dependência psicológica", "Os conflitos humanos", "O prazer", "A natureza da Liberdade", "O problema do medo", "O que é aprender?" "Sobre o tempo e o pensamento", "O que é a mente?" e "A verdade".

Talvez um pouco pelas transcrições das palestras, quem sabe tradução da tradução, encontrei um texto confuso, contraditório e por vezes incompreensível. No geral, muito dessas imprecisões se identificaram nos conceitos explanados por  Krishnamurti.

Então, para não fazer juízo de valor - porque a crítica é sempre muito fácil de ser feita - ouvi vídeos de entrevistas e, no meu modo de pensar, ele que tanto critica a mente fragmentária, seus conhecimentos externados são, em boa medida, fragmentários. 

Parece que quando de sua educação e a de seu irmão conduzida por Annie Besant na Sociedade Teosófica conduzida de modo maternal por ela absorvera ele princípios teosóficos elementares dando-se  aquilo que sempre digo, parou numa barreira de compreensão relativa, num muro que não conseguiria ultrapassar. E se ultrapassasse, um outro mais elevado se lhe oporia como a todos acontece aos que buscam compreender esses enigmas da vida e do Universo.

Mas, mesmo assim, ministrou ensinamentos e palestras por muitos anos. Ele faleceu em fevereiro de 1986.

Nesse livro, quando indagado por ouvintes da plateia, não apreendi nenhuma resposta dele que tivesse significado efetivo com as perguntas.

E não se diga que suas conclusões eram de nível superiores ao meu entendimento.

Krishnamurti, na busca da verdade despreza ideais religiosos provindos do Salvador (Jesus Cristo), de Buda, dos sacerdotes, das religiões, dos místicos, dos pseudo-religiosos, dos filósofos, de Freud e de quem mais possa influenciar a outrem, até porque são ideias e  ideais que "ficaram no passado". A verdade haverá que ser obtida pelo próprio indivíduo, se conseguindo sua mente livre embora não seja Krishnamurti muito claro nesse caminho, porque nem ele desejava influenciar seus "simpatizantes". 

Ele é tão rigoroso em evitar essas influências que troca "meditação" - uma prática de busca interior consagrada no oriente e ocidente -, por "atenção" e não há que se falar em "concentração" porque a mente se torna fragmentária... 

Algumas frases e ideais de Krishnamurti no livro:

Só quando isso acontecer, quando vos sentirdes inteiramente responsável por esta monstruosa sociedade, com suas guerras, suas divisões e tantas outras coisas horríveis - brutalidades, ambições, etc; só quando cada um de nós perceber bem isso, poderemos agir.

Ora, a grande maioria sente isso. O que não parece ter  percebido o filósofo é que este  planeta é a terra das desigualdades, das penitências. Tanto que aqui neste planeta infeliz convivem iluminados espirituais de imensa grandeza, ao lado de párias mentais. Estes pouco ou nada sentem porque vivem num mundo de sobrevivência e podem se manifestam pela violência extrema e pela desonestidade. Nem sempre as carências explicam esse atos danosos.

Mas, claro que esses fatos, o das diferenças e sofrimentos no planeta, não podem ser aceitos passivamente. Tudo haverá que ser feito para que essas diferenças diminuam com o apoio aos desfavorecidos dentro daqueles princípios da solidariedade e da caridade.

 ● "Porque vivo em conflito?" - Porque quando já não buscamos uma autoridade para ensinar-nos, quando estamos livres da autoridade de outrem, já estamos na claridade, nossa mente já tem penetração para olhar.

Nesse trecho ele exclui a influência de qualquer autoridade comandando a vida do buscador da verdade.

 ● Está visto, pois, que onde está o prazer está também a dor, a qual leva inevitavelmente ao medo - medo não só das coisas grandes, como a morte, a solidão profunda, o não existir, mas também medo das coisas superficiais: o que pensa de vós o vosso vizinho, o vosso patrão; medo do marido, da esposa, medo de não poder viver conforme as imagens que cada um cria a respeito de si mesmo.

Essa relação entre prazer, dor e medo não me parece tenha qualquer conexão. Ora, o prazer tende a afastar a dor e o medo, claro, que por tempo limitado. É como dizer tenha medo mas não tenha medo do medo. Pode pensar sem pensar. Como se diz hoje, a vida deve seguir... sem prejuízo da busca da verdade...

Vejamos a coisa mais de perto, Quando vós, o observador, olhais para vossa esposa, vosso amigo, estais a observar com a memória de ontem, estais cônscios de que o passado está contaminando o presente, ou estais observando como se não existisse nenhum ontem? O passado está sempre a projetar sua sombra no presente...

Todas as ideias estão sempre no passado e, por conseguinte,  quando funciono em conformidade com ideias, dogmas, crenças, conclusões estou vivendo no passado e, consequentemente, estou morto.

Afinal de contas, o que é a verdade? O percebimento da verdade, o sentimento do que é a verdade, com sua beleza, seu amor - como se pode alcançá-la? Só se pode ver a verdade quando a mente não está fragmentada quando se vê a totalidade. Quando vedes a totalidade de "vós mesmos", não apenas tais e tais fragmentos, porém a totalidade do vosso ser - vedes a verdade e compreendereis todo o complexo conjunto. 

● Krishnamurti demonstrou desdém pela a arte de um modo geral, a pintura e a música. "Mas, diz ele, se soubéssemos olhar para o rosto do passante, para a flor a beira da estrada, para a nuvem, numa certa tarde, olhar com atenção completa e, por conseguinte, com alegria e amor - então, todas aquelas outras coisas teriam muito pouco significado".

Mas, qual o significado dessa arte exposta no ambiente natural? Quem foi o artista? Ele nada disse e também ninguém o perguntou.


 Francisco Ayres, nas páginas finais do seu livro sobre o filósofo chega a escrever que

"Ouvindo Krishnamurti sentimos que ele foge de respostas positivas a perguntas como: - "Existe Deus? Há reencarnação? Qual o caminho para a verdade? Como morrer psicologicamente todos os dias e renascer todos os dias? É certo dizer que foi, como dizem, noutra encarnação Alcyone?" (*)

E o Autor também se refere a perguntas que Krishnamurti "sai pela tangente": Repetidamente ele nos diz que a autocompreensão surge espontaneamente e a luz se faz imediatamente e não num futuro distante".

Mas esse Autor muito "ajuda" ao explanar e condescender sobre ideias de Krishnamurti.

Desenvolve mesmo um forte apelo ecológico em algumas páginas do seu livro. Os encantos de um riacho, das flores, das árvores. 

Numa entrevista, por sua vez, Krishnamurti se refere de modo penalizado sobre a coragem de homens abaterem filhote de foca a pauladas.

Ayres também não esconde suas dúvidas em como conseguir essa autocompreensão, a "descoberta" da verdade.


(*) Um suposto espirito que reencarnou por 48 vidas desde tempos remotos da humanidade. Krishnamurti seria a encarnação desse espírito no século XX.


MORAL DA HISTÓRIA

Com suas mensagens tão confusas, tão impraticáveis, contradições, rejeitando a tudo e a todos não há informações divulgadas se Krishnamurti mesmo encontrou a verdade pela autocompreensão, de olhar uma ideia excluindo-a do passado, sem pensar, pensando,  do modo como sempre explanou em sua longa existência.

PS: Estarei sempre pronto a ouvir críticas e ensinamentos sobre o filósofo.




quinta-feira, 13 de agosto de 2020

HISTÓRIA ECLESIÁSTICA de Eusébio de Cesaréia



Quem foi Eusébio de Cesaréia?

A despeito de todas as restrições de transcrições advertidas no livro, a contracapa da obra esclarece:

Ele nasceu não se sabe onde em cerca de 270 AD e faleceu no ano de 339 AD. Ele viveu a maior parte de sua vida em Cesaréia, na época a maior cidade romana na Palestina.

Ele era cristão fervoroso e sua obra pode ser considerada um documento ao revelar contemporaneamente o sofrimento enfrentado pelos cristãos, as implacáveis perseguições de que foram vítimas, a tortura, o "pasto" as feras esfomeados, "comedores de homens" nos três primeiros séculos.  Nos primeiros anos, a violência contra os cristãos partira dos judeus e depois pelos pagãos, que não suportavam crerem (os cristãos) num Deus e em Jesus Cristo "Nosso Salvador" e não nos deuses greco-romanos.

Nas primeiras páginas do livro explora à exaustão o autor a origem divina de Jesus - o Cristo. Em todo o versículo do "Velho Testamento" em que haja referência ao um ser divino superior, ele remete à presença de Cristo ao lado do Pai, o ungido, o Messias. Isto é o Filho de Deus seria presença santa já no "Velho Testamento".

O livro traz a presença dos apóstolos após a crucificação mas não há o testemunho da própria crucificação. Ela é remetida aos Evangelhos ("as boas novas") que foram escritos pelos evangelistas segundo os relatos que ouviram.

Há a confirmação da estrela-guia que conduziu os três reis magos, como nos Evangelhos e o infanticídio por decisão de Herodes aos meninos como menos de dois anos tentando atingir Jesus com receio de que sua soberania corresse risco com o novo "rei" nascituro.  

Mas, Herodes teve um fim trágico com doença incurável. Além dos "notáveis" que detivera para depois serem assassinados para que sua própria morte fosse "pranteada", a doença foi tomando seu corpo inteiro e a podridão verminosa nas suas "partes pudendas". Por fim,  feriu-se com uma faca, não sem antes de morrer determinar a morte de um dos seus filhos.

Seria seu castigo por seus crimes hediondos.

Herodes morreu, segundo Flavio Josefo, no ano 4 a.C. Essa data significa que, quando da morte de Herodes ('o Grande') Jesus Cristo estaria com cerca de 5 anos de vida.(*)

Depois, aparece o nome do imperador Tibério que se emocionara ao saber de Pilatos os feitos "de nosso Salvador Jesus" sobre sua ressurreição que era confirmada de "boca em boca".

Tibério se simpatizava com os ensinamentos cristãos (**).

Entenda-se como ensinamentos cristãos, o catolicismo, "igreja de todos, universal".


Alguns relatos do livro que julguei mais expressivos, sempre lembrando as restrições impostas no tocante a transcrições:

● Quem desaprovaria os apóstolos casados? Porque Pedro e Felipe criaram filhos - Felipe deu maridos a suas filhas. Paulo também é mencionado como casado, mas há dúvidas conforme nota de rodapé;

● Tiago, irmão de Jesus, a quem os apóstolos haviam confiado o trono episcopal de Jerusalém: os judeus revoltaram-se contra ele  e exigiram que ele renegasse a fé, mas ele reafirmou diante da multidão que "nosso Salvador e Senhor Jesus era filho de Deus". 

Diante dessa confissão, ele foi lançado do pináculo do templo e espancado até a morte. O autor relata que somente ele foi santo desde o ventre de sua mãe, porque não bebeu vinho nem bebida fermentada, não comeu carne, não passou tesoura nem navalha sobre sua cabeça, não ungiu-se com azeite e "nem usou de banho";

● Os Evangelhos de Mateus foram publicados na língua hebraica - havia muitos hebreus cristãos, enquanto Pedro e Paulo em Roma evangelizavam lançando as bases da nova Igreja. 

Os Evangelhos de Lucas,  médico de profissão, companheiro de Paulo e por contatos com os apóstolos - que não foram superficiais - foram escritos com base nesses relatos e porque "deles adquiriu a terapêutica das almas". No seu escrito sobre os Atos dos Apóstolos, não foi somente o relato do que ouviu, como na caso do seus Evangelhos, mas do que viu.

Marcos se baseou nos ensinamentos de Paulo e Pedro para escrever seus Evangelhos.

João, aquele que se reclinou sobre o peito de Jesus, escreveu seus Evangelhos "enquanto morava em Éfeso da Ásia";

● Há uma dúvida colocada: se João, o apóstolo, fora realmente, o autor do livro do Apocalipse. Diferenças de estilo e gramática em relação a outros escritos do apóstolo, fazem a dúvida quanto à sua autoria do citado livro;

● O livro relata fome terrível entre os judeus, o trigo escasso, os assaltantes que invadiam casas em busca de alimentos roubando tudo o que encontravam. Havia, então, aqueles que preferiam morrer a continuar com aquele sofrimento.

Uma mulher em desespero: "a única coisa que faltava às calamidades dos judeus". E então, deu morte a seu filho, assou-o e comeu a metade. A outra metade à chegada dos rebeldes, ofereceu a outra metade a eles. Ficaram pasmos e horrorizados;  

Esse flagelo teria sido a "recompensa por sua iniquidade e impiedade para com o Cristo de Deus". O livro não esclarece se os cristãos também enfrentaram ou como enfrentaram aquele período terrível de fome;

● Lá pelo ano 115 DC, no reinado de Trajano que não perseguia os cristãos, os ensinamentos de "nosso Salvador e sua Igreja" floresciam a cada dia, deu-se nova rebelião dos judeus que depois de muita luta foram derrotados, com muitas vitimas em Cirene e no Egito;

● Policarpo e o martírio junto com outros em Esmirna pela perseguição de que fora vítima: ele vivera com alguns apóstolos que haviam visto Jesus. Para escapar das perseguições refugiou-se não muito longe da cidade. Em suas orações teve a visão de que seria morto pelo fogo. Ao ser levado à presença de Herodes, deveria dizer, para salvar sua vida, que "Cesar é o senhor" ou que maldissesse a Cristo.  Mas, não disse. Então, pouco tempo antes do martírio teria ouvido uma voz que o incentivava a ser forte e agir como homem. O fogo da fogueira não o atingiu, então ele foi morto perfurado por uma espada.O sangue que jorrou, apagou a fogueira;

● As torturas praticadas pelos pagãos contra os cristãos ultrapassavam qualquer limite humano. Há o relato sobre um deles de nome Santos que depois de torturas inenarráveis, seus membros "mais delicados" foram queimados com placas de cobre em brasa. 

Mas, pela "graça de Cristo", ele se recuperou totalmente;

● À sombra da Igreja muito perseguida, brotavam "estranhas heresias", os "amantes do mal" e como "serpentes venenosas" conspiravam contra os homens;      

● Artemon em sua heresia, dizia que Jesus era apenas um homem e que ele não teria uma origem divina antiga. Berilo, o bispo de Bostra também dizia que Jesus não preexistia antes de habitar entre os homens e que não possuía divindade própria, mas apenas  a de Deus que habitava nele;

● Orígenes, oriundo de Alexandria perdera na tenra idade seu pai decapitado. Muito jovem debruçou-se sobre a filosofia grega mas apreendeu, também, os ensinamentos de Jesus Cristo e, na sua postura filosófica, tornou-se figura destacada entre os cristãos. 

Consolava no cárcere aqueles cristãos condenados ao martírio e à morte. Perseguido mas sempre escapando ileso à insanidade pagã, dá a entender o livro - ou eu assim interpretei -, por ministrar ensinamentos não só aos homens, como às mulheres e, pela sua juventude, para evitar a calúnia, teria se emasculado. Mesmo com tanta participação em prol do cristianismo, ele sobreviveu a agressões e ameaças e faleceu naturalmente.

Foi sobretudo um cristão inspirado e inspirador. A formação teológica do autor do livro foi baseada na obra de Orígenes.

● Mártires cristãos que se sobressaíram em Tiro da Cilícia suportavam açoites intermináveis, a tudo resistiam e depois eram  atirados à feras devoradoras de homens;

● Toda perseguição de governadores e imperadores, dos pagãos inconformados por não aceitaram os cristãos seus deuses, foi aplacada com a presença do Imperador Constantino, vencedor de guerras que não só os protegeu, mas aceitou seu Deus. 


O LIVRO

Por ser um relato o quanto possível real dos primeiros séculos do cristianismo, há trechos nos quais o autor revela até mesmo a substituição de bispos que faleciam, o que pode parecer irrelevante, mas um modo de perenizar aqueles que enfrentaram grandes dificuldades, naqueles tempos  em manter o cristianismo ativo, mesmo com todas as perseguições e os martírios de muitos seguidores.

A edição que está comigo, de 2019, com 347 páginas é difícil de ler pelo tamanho diminuto da fonte, e mesmo pelas páginas e sermões cansativos.

São "X livros".

Então, não é um livro fácil de ler e, pela quantidade de informações precisaria ser lido, mesmo com essas dificuldades todas, mais uma vez, pelo menos.  

Referências no texto:

(*) Flavio Josefo, nascido em 37 ou 38 d.C e falecido no ano 100. Historiador importantes dos princípios do cristianismo e das lutas dos judeus contra os romanos (Livro: "Uma testemunha do tempo dos Apóstolos")

(**) Tibério é mencionado em outros livro, "A Vida Mística de Jesus" de H. Spencer Lewis no qual é explanada sua participação direta na vida de Jesus. Acessar: 

https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2019/04/a-vida-mistica-de-jesus-de-h-spencer.html


segunda-feira, 29 de junho de 2020

O ANTICRISTO de Friedrich Nietzsche


"Ensaio de crítica do Cristianismo"

LIVRO 73



















Nietzsche na sua maturidade pelos 46 anos de idade foi perdendo a razão, num grave colapso mental. Atribui-se sua loucura ao avanço da sífilis, que adquirira na juventude. Com a doença “viveu” por cerca de 11 anos. Ele faleceu em 1900 aos 55 anos de idade (seu nascimento: 1844 na Alemanha).

No capítulo “Mater Dolorosa” do velho livro (1948) “A Marcha do Tempo” de Stefan Zweig é relatado o drama de sua mãe, cuidando do doente famoso no dia-a-dia:

“Vê-se agora uma velhinha a conduzir, de vez em quando, o seu doente, como a um urso grande e pesadão, pelas ruas e a longos passeios. A fim de o distrair, recita-lhe intermináveis poesias, que ele escuta em torpor. Guia-o jeitosamente; fá-lo desviar-se das pessoas que o fitam curiosas e dos cavalos que detesta. Sente-se feliz toda vez que consegue reconduzi-lo à casa, sem que ele desperte a curiosidade popular com sua “voz muito alta” (como a senhora delicadamente classifica seus berros selvagens).


O "ódio aos cavalos" que teria  Nietzsche tem este comentário de Milan Kundera no  livro "A Insustentável Leveza do Ser":

Nietzsche já afetado pela loucura: sai o filósofo alemão de um hotel em Turim, ano de 1889, no momento em que um cocheiro espanca seu cavalo com um chicote: “Nietzsche se aproxima do cavalo, abraça-lhe o pescoço, e sob o olhar do cocheiro, explode em soluços.” (...) Nietzsche veio pedir ao cavalo perdão por Descartes – que considera o animal um autômato, uma máquina animada...” Quando um animal geme, não é uma queixa, é apenas o ranger de um mecanismo que funciona mal.” (*)

(*) Livro de Milan Kundera - acessar

Friedrich Nietzsche é um autor que me incomoda. Demorei mas li "Assim falava Zaratustra” (escrito em 1883/5) mas constatei nessa obra  ambiguidades, contradições em páginas desconexas. Ora, é preciso "interpretar". Mas, interpretar o quê? (*)

Mas, há os que se debruçam sobre as obras de Nietzsche, e se tornaram estudiosos de seu pensamento. Se entendem o que quis transmitir o autor é algo sempre a ponderar.

A filósofa Scarlett Marton, é estudiosa das obras de Nietzsche. Sobre "Zaratustra" diz se tratar de um texto "hermético", pelo que difícil.


O ANTICRISTO


No livro "Assim falava Zaratustra", Nietzsche afirma o Super-homem, mas em "O Anticristo" ele o chama de "homem-superior" cuja essência de viver com liberdade, não comporta a presença de Deus.

Ele  começa assim: "olhamo-nos no rosto, somos hiperbóreos..." - essa é uma região referida pela mitologia grega que se situaria ao norte da Europa e da Ásia na qual o povo vivia despreocupado,  feliz, usufruindo de vida longa muito superior aos demais homens. Essa região hiperbórea só poderia ser alcançada com a ajuda dos deuses.  

Mas, não nas terras de Nietzsche...

Ele, o homem-superior deve ter, então, a liberdade de usufruir da vida sem a presença, por exemplo, dos sacerdotes cristãos que conduzem os "fieis" nas mentiras contidas na Bíblia que enaltece o judaísmo e, no "novo testamento", o evangelho cristão ("as boas novas") mentiras, não poupando nem mesmo a todos os ensinamentos de Jesus Cristo.

O cristianismo tolhe a liberdade de pensar, tolhe os instintos naturais da vida, impedindo a felicidade dos fiéis porque os mantém na mentira.

E, nesse rumo, para o homem-superior, a  compaixão não pode ser aceita, porque ela significa um sofrimento contagioso e leva a uma perda da energia vital. Então, um sentimento inútil ao "homem-superior". 

Pergunta ele: "o que é mais nocivo que um vício qualquer? A compaixão em um ato para todos os fracassados e os fracos - o cristianismo".

Ataca também os teólogos porque aquilo que consideram verdadeiro seria uma falsidade difundida insistentemente.

Diz mais que a crença ou em Deus ou no diabo, são produtos da decadência, esse Deus que hostiliza a vida.

E ao continuar a "condenar" o cristianismo, se refere ao budismo que seria "cem vezes mais realista que o cristianismo", mas também uma religião decadente, embora mais amena nos seus princípios (talvez  seja o budismo decadente pela compaixão um princípio que transmite a partir dos ensinamentos do Buda). 

No meu modo de interpretar Nietzsche não interpretou  e parece ter mencionado  o budismo apenas para estabelecer  um novo ângulo crítico em relação ao cristianismo. E ele também não explica sua afirmação de que o budismo não promete nada, mas cumpre; "o cristianismo promete tudo, mas não cumpre nada". (?)

Faz duras crítica a Jesus por não ter resistido às acusações falsas de que era vítima, não ter se defendido diante dos juízes, diante dos acusadores.

Mais a frente, seleciona versículos dos Evangelhos e faz sua crítica àquilo que considera contradições da palavra de Jesus.

Menciono este, no qual a crítica  é mais contundente:

"E tantos quantos vos não receberem, nem vos ouvirem, saindo dali, sacudi o pó que estiver debaixo dos vossos pés, em testemunho contra eles. Em verdade vos digo que haverá mais tolerância no dia de juízo para Sodoma e Gomorra, do que para os daquela cidade.(Marcos 6.11). Como é evangélico!..."

Nietzsche selecionou outros  versículos para criticar os Evangelhos, a Jesus Cristo que qualifica de "impostor", mas claro que, de modo ao seu próprio convencimento, não ousou se referir ao "Sermão da Montanha", aos milagres de Jesus àqueles necessitados, seus embates com os filisteus...

E, então, volta a negar "Deus como Deus", e mais: "Se alguém nos provasse esse Deus dos cristãos, ficaríamos ainda menos inclinado a crer nele."

E Deus inventa as guerras, separa os povos e permite que se exterminem reciprocamente. Os sacerdotes, precisam da guerra.

Interessante que Nietzsche critica a doutrina do perdão, da graça, da  salvação, por significarem a negação da causalidade,  "um ataque contra o conceito de causa e efeito" (?)

Estaria remotamente se referindo ao carma ("conceito de causa e efeito") aceito pelo budismo?

Do convertido Paulo, o autor o converte a um farsante e aproveitador dos ensinamentos cristãos. 

E no prosseguimento das acusações e críticas, seguem páginas a frente, concluindo que a igreja cristã "não poupou nada em sua corrupção".

Por fim, quanto as cristãos, "a natureza os dotou mal - esqueceu de lhes atribuir um modesto quinhão de instintos respeitáveis, convenientes, limpos... Dito entre nós eles não são sequer homens... Se o islamismo despreza o cristianismo, tem mil razões para isso: o islamismo tem como condição, verdadeiros homens..."

MORAL DA HISTÓRIA

As críticas principalmente ao catolicismo são contundentes no livro. O que pensaria hoje com o escândalo da pedofilia? Desses "evangélicos" que negociam o Evangelho? Nietzsche nesse conceito de homem-superior é muito limitado pelo que a vida oferece e há o momento da própria decadência física. Não haveria como imaginar viverem ele e seus adeptos na região mítica dos hiperbóreos. Pelas limitações da vida pareceu muito de utopia, um delírio,  mesmo que rejeitando Deus. Ele viveu apenas 55 anos na "terra" do seu Zaratustra e os seus últimos anos (11) foram vegetando por causa da doença mental progressiva. 

O livro "O Anticristo" é oferecido ainda hoje pelas livrarias.

Referências:

quarta-feira, 17 de junho de 2020

SENHORA de José de Alencar

Livro 72





















É o segundo livro que leio do Autor. O primeiro foi Til. (*)
"Senhora" foi publicado em 1875.

Resolvi "encará-lo" para sair daquilo que já chamei nestes comentários e resenhas, de livros "cabeça".


"Senhora" é um romance de "amor" cheio de voltas e o casamento dos apaixonados Seixas e Aurélia demora o livro todo para se consumar.


Fernando Seixas não era rico, mas frequentava a alta sociedade do Rio de Janeiro. Era honesto mas não se descuidava em levar alguma vantagem em operações pouco ortodoxas.

Ajudava a família, querido pela mãe e irmãs mas havia um distância entre a vida delas, muito humildes e ele assíduo frequentador dos salões de baile costume que exigia estampa, boas roupas e relacionamentos.

Uma frase bem atual ainda nesses tempos, referente a 12 contos de réis que sobrara à viúva encerrado o inventário de seu falecido marido:

"Partilhados os bens, D. Camila, a mãe de Seixas, por conselho de amigos, pôs o dinheiro a render na Caixa Econômica, donde ia tirando os juros semestrais com que acudia os gastos da casa, ajudada dos aluguéis de dois escravos e também de algumas costuras dela e das duas filhas."

Nesse romance pouco de comenta da escravidão: esse trecho acima foi um das poucos, esse dos dois escravos "alugados".

A escravidão notória naqueles tempos fora "escondida" pelo autor, realçando apenas a felicidade da classe alta nas suas festas e bailes.

Mas, e a Aurélia, quem era?

Uma menina lindíssima, filha de dona Emília, mulher pobre e doente, que fora casada com Pedro, um estudante que se apaixonara por ela.

Pedro, embora tivesse uma vida simples no Rio de Janeiro, era filho "natural" de fazendeiro rico.

Tiveram dois filhos, Emílio e Aurélia.

Pedro foi chamado pelo fazendeiro Lourenço, ao saber que seu filho se relacionava com uma "rapariga" no Rio de Janeiro, obrigando-o a que voltasse à fazenda do pai.

Ele deixa Emília e o filho mas promete voltar e todo o tempo remeteu meios para a manutenção da família.

Quando voltou por um tempo, nasceu Aurélia.

Ao retornar à fazenda por imposição do pai acabou falecendo por uma "febre cerebral".

Emília e seus filhos passaram muita privações.

Já crescidos, Emílio revelou-se um jovem frágil e de pouca inteligência e morreu logo. Aurélia, ajudava a mãe. Esta se preocupava muito com o futura da filha, tanto que queria vê-la casada.

E a incentiva a se por na janela e ser admirada pelos jovens em idade de casamento situação que Aurélia que a constrangia.

E aí aparece o Fernando Seixas que a pede em casamento mas não consuma o matrimônio porque se encantou com um dote de 30 contos que o pai de Adelaide lhe oferecera se se casasse com sua filha.

Aurélia sofreu muito com o rompimento de Seixas.

Nem com Adelaide Seixas se casou não muito explicado no livro.

Mas, então o sogro descobriu em documentos do filho que o casamento Emília-Pedro era de papel passado.

Vai, então conhecer a família de Pedro e se encanta com ela.

Passado um tempo, morre sua mãe e Aurélia fica órfã e vai morar com uma tia.

Morre o avô que lhe deixa uma fortuna em testamento. E Aurélia assume grande riqueza e passa a frequentar a sociedade do Rio de Janeiro. 

Lindíssima, era cortejada por muitos "partidos", mas ela ironizava, não esquecia Seixas.

Obriga seu tio e tutor Lemos, a oferecer um dote a Seixas para que com ela se casasse, sem que noivo "comprado" soubesse quem seria a noiva.

Não muito explicado, porque Lemos já se encontrara com Seixas nos tempos do noivado quando Aurélia era pobre. Então não poderia haver nada muito secreto.

O acordo do dote é fechado em cem contos.

Dá-se o casamento mas ele só se consuma porque Aurélia passa a humilhar o marido "comprado".

Dá-se troca de farpas que se estende por páginas e páginas. Aurélia até oferece a liberdade a Seixas pelo divórcio mas ele se mantem firme porque havia um contrato a cumprir. Ele não assume a riqueza da mulher, continuando seu trabalho numa "repartição".

Cenas de ciúmes ocasional de parte a parte.

Mais para o final do romance Seixas obtém o valor de quinze contos de operação financeira que havia esquecido e com reserva de seu trabalho completa 20 contos - porque havia pedido adiantamento dessa quantia quando do acordo do dote para resolver pendência de sua própria família - não tendo apresentado o cheque de 80 contos (e Aurélia não se deu conta disso?), devolve os cem contos do dote e pede para recuperar sua liberdade livrando-se do casamento não consumado e da humilhação. E porque a riqueza de Aurélia seria um impedimento permanente para se obter uma relação conjugal aceitável, feliz.

Mas, então, Aurélia, que ansiava por sinais de que Seixas a amava, nesse momento de entendimento, ela revela de joelhos que o testamento que assinara designava o marido como seu herdeiro universal.

E ai entre beijos e declaração de amor, depois de 11 meses, "as cortinas cerraram-se, e as auras da noite, acariciando o seio das flores, cantavam o hino misterioso do santo amor conjugal".

Até que enfim, após 11 meses nas suas 277 páginas.




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