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sábado, 23 de dezembro de 2017

NADA DE NOVO NO FRONT de Erich Maria Remarque

Livro 32

O livro foi lançado na década de 20 do século passado e se constitui num relato amargo da denominada “guerra convencional” que faz suas vítimas se tornarem peças de matadouro, massacrados pelos bombardeios e granadas atiradas nas trincheiras inimigas.

Quem são esses soldados inimigos, rivais na tragédia, se não jovens atirados à linha de frente para se matarem e para não serem mortos. Que sequer sabem bem pelo que lutam.

Quando lançado e por muito tempo, o livro de Remarque foi um “best seller” absoluto inspirando dois filmes que reproduziram em parte o drama dos jovens soldados alemães na 1ª Guerra Mundial.

O livro não faz concessões aos dramas por eles vividos, tornam-se assassinos nas linhas de frente para não serem mortos no corpo a corpo naquelas guerras ditas convencionais.


Quando com a baioneta, o narrador mata um “inimigo” numa trincheira assume que o morto “está ligado à minha vida por isso tenho de fazer e prometer tudo para me salvar: juro que pretendo viver só para ele e para sua família, com lábios úmidos me dirijo a ele...”

E com esse sentimento que se estende à família do morto, pretende apenas se salvar do crime que praticou para salvar sua própria vida... 

[Se "salvar do crime", porque o assassino carrega consigo marcas da alma do assassinado].

Mas, as dores dos combates o fazem esquecer-se das promessas que fez ao morto e à sua família.

Quem é o narrador, Paul, que relata todas as tragédias que assistiu e viveu?

“Sou jovem, tenho 20 anos, mas da vida conheço apenas o desespero, o medo, a morte e a mais insana superficialidade que se estende sobre um abismo de sofrimento. Vejo como os povos são insuflados uns contra os outros, e como se matam em silêncio, ignorantes, tolos, submissos e inocentes. Vejo que os cérebros mais inteligentes do mundo inventam armas e palavras para que tudo isso de faça com mais requinte, e maior duração.”

Nos três anos no front, o narrador vai assistindo a tragédia da guerra que não pouca sequer os animais.

Cavalos gravemente feridos não relinchavam, mas em desespero emitiam sons incomuns às suas dores, tropeçando nas tripas que lhe escavam do abdômen.
Precisaram ser mortos para não prolongar o sofrimento.

E nas trincheiras,

“Corremos agachados como gatos, submersos por essa onda que nos arrasta, que nos torna cruéis, bandidos, assassinos, até demônios; essa onda que aumenta nossa força pelo medo, pela fúria e pela avidez da vida, e que é apenas a luta pela nossa salvação. “ (...) Ficamos à espreita. O fogo salta cem metros à frente – retomamos à ofensiva. Ao meu lado, a cabeça de um cabo é arrancada. Ainda corre mais alguns passos, enquanto o sangue lhe jorra do pescoço, como um repuxo.” 

Seus amigos leais, de dores e sobrevivência, vão sendo feridos gravemente ou mortos aumentando sua angústia:

“Então me admiro de como esta atividade inexplicável que se chama Vida se adaptou mesmo a tais formas. A vida é simplesmente uma constante vigília contra a ameaça da morte; faz de nós animais para nos dar a arma terrível que é o instinto...”
[Os soldados americanos que combateram no Vietnam ao voltarem ao país chegaram a ser rejeitados ao retornarem à “vida normal”. Essas restrições aos combatentes foram amenizadas com programas próprios oficiais de integração com destaque à vida profissional].

Trata-se de uma obra a ser revista ou conhecida. Gostei muito.

quinta-feira, 14 de dezembro de 2017

MEMORIAL DO CONVENTO de José Saramago

Livro 31

Quem leu obras de Saramago, sabe de seu estilo diferente de qualquer outro autor. Praticamente não usa ponto ao final de frase, que é substituído por vírgulas dando o mesmo efeito daquele e, principalmente, não usa travessão nos diálogos e nem ponto de interrogação.

E o vocabulário é do português de Portugal, páginas densas e às vezes difícil de acompanhar. Ao nível da irritação.

Além de “Memorial do Convento” eu li “Ensaio sobre a cegueira” que não gostei porque a violência eclode mesmo entre nós todos que enxergamos, e também “O Evangelho segundo Jesus Cristo”. Nesse livro talvez seja a primeira revelação literária de que Maria Madalena fora esposa ou companheira de Jesus. Mas, como prostituta redimida e não como esposa espiritual de Jesus que o acompanhou em sua pregação razão do desprezo que recebeu da Igreja Católica.

Desses dois livros embora lidos não tenho, pelo tempo decorrido, condições de os comentar por ora.

José Saramago recebeu o prêmio Nobel de literatura de 1998.






“Memorial do Convento” é um livro com 347 páginas “cheias” composto de várias fazes

A história se desenvolve no início dos anos 1.700, em Portugal.
O rei Dom João V está angustiado porque a sua esposa e rainha D. Maria Ana não engravida.

Mas, o frei Antônio de S. José disse que ele teria os filhos que quisesse mas haveria que prometer construir um convento franciscano em Mafra, distante uns 30 quilômetros de Lisboa.

E, feita a promessa, vieram os filhos.

[“Em noites em que vem el-rei, os percevejos começam a se atormentar mais tarde por via de agitação dos colchões, são bichos que gostam de sossego e gente adormecida. Lá na cama do rei estão outros à espera do seu quinhão de sangue, que não acham nem pior nem melhor que o restante da cidade, azul ou natural”].

E a promessa foi cumprida, mas a epopeia da construção constitui-se uma das partes do livro.

Na sequência ingressa na história o ex-soldado Baltazar Mateus, o Sete-Sois, dispensado do exército porque um tiro em batalha com os espanhóis perdera a mão esquerda e não servia mais para as armas.

Em substituição à mão, mais tarde, seria adaptado um gancho.

Perambulou por Mafra, foi para Lisboa – fétida, lamacenta e suja -, para sobreviver mendigou nessa vida sem esperança até que conheceu Blimunda ao acaso quando ambos lado a lado assistiam atos públicos do “santo ofício” que expunham todos os condenados pela inquisição.

Entre eles, estava a mãe de Blimunda, Sebastiana Maria de Jesus, que dizia ouvir vozes do céu mas disse o tribunal que a condenou que eram “efeitos demoníacos”. Fora condenada ao açoitamento e o degredo por oito anos em Angola.

A mãe de Blimunda vê ao lado da filha o padre Bartolomeu Lourenço e também um homem alto que a impressionara muito. Passou a condenada por Blimunda que naquele instante quis saber quem era aquele homem alto ao seu lado (algum tipo de transmissão telepática entre a mãe e a filha?).

Era Baltazar Sete-Sóis 

Unem-se sem se casarem, um sacrilégio.

Blimunda, em jejum, pela manhã, tem poderes de ver as vontades das pessoas, não a alma, e também as coisas “por dentro” (!).

Assim, para nunca ver as vontades das pessoas, nem de Baltazar, comia pão de olhos fechados para suspender esse seu dom.

A ligação de Baltazar com o padre Bartolomeu Lourenço (de Gusmão) se deu após pedir ajuda a ele que indagasse os desembargadores se seria possível concessão de pensão como forma de reconhecer a perda de sua mão esquerda em batalha.

E nesses contatos, o padre, conhecido como voador, porque fizera experiência na corte de João V com balões leves (aeróstatos) que subiam impulsionados tenuemente por ar quente.

Fazem uma parceria incluindo Blimunda – a quem “batizara” de Sete-Luas -, para construir a passarola, um aparelho que voaria com velas e esferas de âmbar.

Aqui a ficção.

Pronta a passarola, bate o vento um dia e ela alça voo, e flutua por muitos quilômetros. Os que na terra a viram no alto, acreditavam tratar-se da aparição do espírito santo.

A outra parte do livro descreve a epopeia para construir o convento e a igreja em Mafra, o grande sacrifício para conseguir profissionais, obter o material, o seu transporte e até mesmo uma pedra imensa, puxada por centenas de bois.

Sete-Sóis trabalhara nessas obras fazendo transporte manual de materiais e deslocamentos de terra, mesmo com o gancho que ostentava no braço esquerdo.

Em meio a essas obras, deu-se o casamento da filha do rei João V com o príncipe Fernando da Espanha, tudo relatado com detalhes por Saramago.

Sete-Sóis nunca esquecera a passarola e frequentemente voltava onde ela estava escondida entre a mata para mantê-la e repará-la.

Num dos últimos episódios do livro Baltazar Sete-Sóis volta à passarola e desaparece. Blimunda angustiada o procura por nove anos, comete um crime, assassinando um monge que tentara estuprá-la num noite de descanso numas ruinas de um convento.

Até que o encontra numa fogueira da inquisição mas protegida por uma “nuvem fechada”: “Então Blimunda disse, Vem. Desprendeu-se a vontade de Baltazar Sete-Sóis, mas não subiu para as estrelas, se à terra pertencia e a Blimunda”.

Realidades:

Bartolomeu Lourenço de Gusmão, o padre “voador” 

Nascido em Santos, em 1685 e falecido em Toledo – Espanha em 1724, esquecido, doente, considerado inventor talentoso conseguira resultados positivos em suas experiências na corte portuguesa com os aeróstatos (balões).
Não seriam a origem dos balões atuais?

Perseguido pela inquisição pela suposta simpatia devotada aos “cristãos-novos” (judeus).

Seus restos mortais foram trazidos para São Paulo em 2004 e sepultados na cripta da Catedral da Sé, localizada no subsolo sob o altar-mor ao lados dos túmulos dos bispos e cardeais que comandaram a arquidiocese da cidade.

A passarola

Um “projeto” controvertido, atribuído a Bartolomeu de Gusmão, objeto de deboche que nunca voou porque não teria condições para tanto.



Convento de Mafra

Uma das obras magníficas de Portugal: foi iniciada em 1717 e sagrada em 22/10/1730, ainda não terminada, aniversário do rei João V que por isso exigiu sua inauguração e por ser domingo, tem área de 40 mil m² possibilitando alojar 300 frades.



sexta-feira, 17 de novembro de 2017

SIDARTA de Hermann Hesse

Livro 30

Livro que gosto muito. 

Hermann Hesse é escritor alemão, Prêmio Nobel de Literatura de 1946. 

Na edição que disponho, nos comentários de contracapa de autoria de Otto Maria Carpeaux no trecho final, ele escreveu:

“A vida de Sidarta parece-se com a do próprio Buda. Mas, também se parece com a do próprio Hesse, que experimentou todas as possibilidades da existência humana até reconhecer a profunda doutrina da identidade de tudo que é vivo: idênticos são os pecados e a santidade, a sabedoria e a loucura e, enfim, a vida e a morte. Hermann Hesse foi um grande poeta. Também foi um grande sábio.”



Por causa dessa identidade, tendo como suporte o volume 2 da “História Universal” de H. G. Wells (edição de 1939), me estenderei um pouco nesta resenha estabelecendo a diferença entre o livro de Hesse e a vida de Buda.

O Sidarta de Hesse, um dia questiona os deuses que recebiam reverências e sacrifícios, não havia nada que revelasse a busca do eu interior, o princípio da vida (atma). Ele era membro de família abastada, mas não era feliz.

E com essas dúvidas em mente, sem as respostas “definitivas” a essa procura interior, abandonou sua vida de riqueza, seus pais e se uniu aos samanas, ascetas peregrinos que renunciavam aos prazeres da vida vestindo andrajos, viviam de esmolas, de sacrifícios, jejuando, na tentativa de eliminar o eu e se encontrarem com sua própria vida, na sua interioridade.

Seguiu-o seu amigo leal, inseparável, Govinda.

BUDA:

Sidarta Gautama nascera entre 600/500 AC numa família afortunada. Casara-se cedo, aos 19 anos e fora pai de um filho, Rahula.

Sua vida era de prazer, da “caça e do amor” até os 29 anos quando começou a se indagar se sua vida não era pautada pela infelicidade.

Como relata Wells, as causas da mudança em encarar a vida foram estas:

“Rodava, certo dia, em seu carro, numa excursão de prazer e eis que passa por um homem extremamente abatido pela idade. A pobre criatura, curvada e frágil, feriu-lhe a imaginação. “Este é o caminho da vida”, disse Chana, seu condutor, e “aí temos todos de chegar”. Ainda estava isso em seu espírito, quando se lhe deparou um homem sofrendo horrivelmente de uma moléstia repugnante. “Isto é a vida”, disse Chana. A terceira visão foi a de um corpo insepulto, inchado, sem olhos, estraçalhado pelas aves e pelos animais e tornado completamente hediondo. “Este é caminho da vida”, disse Chana.”

Vira ainda sob os efeitos dessas experiências um asceta, em grande número naqueles tempos, dos quais se dizia que buscavam uma realidade mais profunda para a vida.

Sidarta Gautama, naquele momento se decidiu por aquelas mesmas buscas. Na noite em que se comemorava o nascimento do seu filho, a tudo abandona e acompanhado por Chana, seu amigo, partem pela noite em busca dessas revelações, do nirvana (?).

Sidarta de Hesse com seu amigo Govinda questiona o sentido da meditação, o jejum como modos de “fugir de nós mesmos”.

A sabedoria é o atman que está no interior de todas as criaturas.
Ali está a sabedoria.

Govinda recita, então, um verseto de um upanichade:

“Quem ao meditar com o espírito purificado, se confunde com o Atman, propiciará ao seu coração indizível bem-aventurança”. (*)

Sidarta como samana viaja ao encontro de Gautama e a despeito da santidade revelada em seu olhar e pelo sorriso sereno ele pontifica que a experiência de iluminação pertencera somente a ele, o Buda.

Com esta explanação:

“Dissera a Gautama que o tesouro e o mistério de Buda não consiste na doutrina, senão num quê indizível não suscetível de ser ensinado e cuja experiência coubera ao Augusto na hora de sua iluminação.”

E mais explanara Sidarta:

“Ora, o desígnio de sua própria jornada seria ter essa mesma experiência”.

Depois de dialogar com Buda, Sidarta mudou sua visão do mundo. Via beleza no céu azul, nas matas, o rio a correr e chegara à conclusão que não era a influência de Mara, o demônio, que tentava influenciar negativamente aqueles que saiam em busca de si mesmos, da sabedoria.

Aliás, Wells relata sobre Gautama e Mara, o tentador da Humanidade:

“Volta”, dizia Mara, “e tornar-te-ei rei e eu te farei o maior de todos.”

Tal qual a tentação de Jesus no deserto depois de 40 dias de jejum:
Mateus 4 a 10:

8. Depois, o Diabo o levou a um monte muito alto e mostrou-lhe todos os reinos do mundo e o seu esplendor.
9. E disse-lhe: "Tudo isto te darei se te prostrares e me adorares".
10. Jesus lhe disse: "Retire-se, Satanás! Pois está escrito: 'Adore o Senhor, o seu Deus, e só a ele preste culto”.

Há um fato curioso em relação ao jejum. Num desses tempos de jejum, num dado momento caiu Gautama inconsciente e quando acordou alimentou-se certamente que chegando à conclusão de que a iluminação que buscava poderia ser alcançada com um corpo pouco mais são.
Seus discípulos horrorizados dele se afastaram.
Buda, então, percorreu sozinho seus caminhos até que sob uma grande árvore (denominada “a árvore da vida” – uma figueira), ao lado de um rio, pronto para se alimentar foi invadido por um sentido de claridade e lucidez. Ali permaneceu em profunda meditação por horas até se encorajar a informar ao mundo sua visão e iluminação.

Buda nunca assim se qualificasse, mas assim o fizeram os seus discípulos reconquistados.
E quanto a Sidarta?            
Embora no seu íntimo, nunca perdendo aquele sentimento de ascetismo, passou a viver por longo período uma vida mundana: uniu-se à linda cortesã Kamala, tornou-se comerciante rico, jogava dados, perdia e ganhava fortunas e convivia com os “homens tolos”.
Entediado por todas essas experiências mundanas, antes de retornar à vida ascética e deixar tudo para trás, teve mais uma relação com Kamala que engravidou.
Chega à beira do rio, torna-se amigo e hóspede do balseiro Vasudeva de poucas palavras, humilde, que dizia ouvir a voz do rio, porque “o rio sabe tudo e tudo podemos aprender dele.”
Passa Sidarta, que envelhece, a dividir as tarefas de atravessar o rio transportando viajantes nesse trabalho humilde mas sem perder aquele sentido de atingir o atma.
Sidarta adoece e Kamala – agora sua seguidora a quem doara seu bosque – chega até o rio para visitar o doente junto com seu filho.
É, então, picada mortalmente por uma cobra, agoniza, não sem antes informar a Sidarta que o menino era seu filho. E morre.
O menino que vivia em condições confortáveis com sua mãe, vivendo, então, naquela cabana tão precária, se revolta e passa a ofender e desprezar o pai até que foge.
Rahula, o filho de Buda, ainda criança quando o encontra o indaga sobre a herança a que faria jus,  mas bem cedo se torna monge e segue o pai até o fim da vida.
Sidarta procura o filho intensamente na cidade sem o encontrar e lhe vem à mente o desgosto que provocara aos seus próprios pais ao os abandonar e se tornar um samana.
O balseiro Vasudeva falece. Sidarta o substitui. Govinda envelhecido, seguidor das doutrinas de Buda, volta a encontrar Sidarta.
Nesse encontro de amizade profunda e amor de velhos amigos Govinda percebeu que “esse sorriso da máscara, o sorriso da unidade acima do fluxo das aparências, o sorriso da simultaneidade muito além do sem-número de nascimentos e mortes, o sorriso de Sidarta era idêntico àquele sorriso calmo, delicado, indevassável, talvez bondoso, talvez irônico, de Gotama, o Buda...”
“Era assim – Govinda o sabia – que sorriam os seres perfeitos.”     


(*)Upanichade: partes de escrituras hindus que discutem meditação e filosofia.

sábado, 11 de novembro de 2017

OS EXILADOS DA CAPELA de Edgard Armond

Livro 29

Relendo esse pequeno livro me dei conta de que suas páginas podem não ser muito organizadas do ponto de vista dos relatos. Sendo edição não esmerada talvez resida aí essa constatação.
As proposições que o autor explana no livro, diz ele, seriam intuições não necessariamente prestigiadas por círculos religiosos e espíritas.













Começa o autor descrevendo onde se situa a estrela Capela, na Constelação do Cocheiro. Capela é uma estrela “inúmeras vezes maior que o Sol” distando da Terra cerca de 45 anos-luz ou seja, 45 seguido de 12 zeros.

Nessa estrela vivem seres, almas em alto grau de evolução mas que contava com espíritos que não se coadunavam com o nível espiritual alcançado.

E esses seres inadaptados àqueles sentidos superiores da Capela, foram exilados naqueles períodos remotos que se perdem na escuridão do tempo. Foram designados a encarnar na Terra com a missão de auxiliar os nativos em sua evolução material e espiritual.

Para aqueles indivíduos primitivos, selvagens, que aqui viviam, esses exilados que foram nascendo na Terra passaram a ser vistos como deuses.

Mas, a vida na Terra: “E quando os anjos – Os Filhos do Céu – as viram (‘as Filhas da Terra’), por elas se apaixonaram e disseram entre si; vamos escolher esposas da raça dos homens e procriemos filhos”.

“Compreendemos afinal que Adão e Eva constituem uma lembrança dos espíritos degredados na paisagem escura da Terra, como Caim e Abel são dois símbolos para a personalidade das criaturas”.      

Caim e Abel seriam “símbolos das tendências do caráter dessas legiões de emigrados, formados em parte, por espíritos rebeldes, violentos e orgulhosos...”

E, ademais:

Caim e Abel não poderiam ter sido os primeiros filhos de Adão e Eva (o "primeiro casal") porque Caim se casou com mulher da Terra:

“É, pois, evidente que os capelinos, ao chegar, já encontraram o mundo habitado por outros homens.”

Mas, a degeneração que se verificara, mesmo com os exilados, medidas reparadoras foram impostas pelas divindades crísticas para que a Terra fosse purificada - como se deu com o dilúvio.

O livro prossegue fazendo proposições sobre o submersão da Atlântida – que deu o nome ao Oceano Atlântico – e a Lemúria nesses ciclos evolutivos em períodos milenares. Esses fenômenos resultaram em novos continentes no planeta.

Diz o autor que os atlantes tinham profundo conhecimento das leis da Natureza, terra, água e ar. Conheciam a metalurgia e no que concerne ao ouro, era abundante. “Cultivavam a magia negra e utilizavam-se grandemente dos elementais e de outros seres do submundo”.

Nas partes finais do livro, o autor enaltece a presença de Jesus Cristo na Terra, seus evangelhos e seu sacrifício de salvar a humanidade, porque o “pecado original não podia ser apagado senão com sangue”.

E foi no Calvário que os pecados foram resgatados por Jesus, “pelo preço do seu sangue, afastando dos homens, a responsabilidade do “esforço próprio para a redenção espiritual”.

[Há que reconhecer que a história de Jesus representa realmente um antes e um depois. Fico a imaginar como estaria a humanidade se parte dela não tivesse a oportunidade de se valer dos Evangelhos e à sua própria passagem pela Terra].

Na última parte da obra há previsões apocalípticas provindas de várias fontes que se referiam a grandes catástrofes iminentes no fim do século passado e início deste por suposta aproximação de astro celeste cujos efeitos seriam “tenebrosos” para a humanidade, mas que novamente depuraria a Terra exilando os pecadores incorrigíveis, como se dera na depuração da Capela.

Nada ocorreu até agora embora a Terra, no geral, venha enfrentando tempos difíceis, de violência crescente, de egoísmos exacerbados, de desprezo ao que mais necessitam, imoralidade e, sobretudo, com a devastação ambiental que afeta de modo irreversível o clima do planeta.
Nota-se até com facilidade que nosso planeta é composto de almas que se situam em estágios evolutivos diferentes: ao lado de um sábio pode estar um assassino degenerado respirando o mesmo ambiente.

Lê-se o livro de Edgard Armond com facilidade. A leitura é leve e há muito mais a refletir.




domingo, 5 de novembro de 2017

O REI DE FERRO de Maurice Druon

Livro 28

Do Autor para mim não é desconhecido. Lera há muito uma obra dita infantil, “O menino do dedo verde”, a história de Tistu que com o toque de seu polegar convertia tudo em plantas e flores, sempre numa mensagem de paz, antiguerra. 

Druon foi Ministro da Cultura francês no governo Pompidou,

O “Rei de ferro” é um romance histórico que tem como enredo central o reinado do rei Felipe, o Belo no extermínio da Ordem dos Templários.
















Para explicar o que fora a Ordem dos Templários, um apêndice do próprio livro começa assim:

A soberana ordem dos Cavaleiros do Templo de Jerusalém foi fundada em 1128 para garantir a guarda dos Lugares Santos da Palestina e proteger as peregrinações.

Suas regras recebidas de São Bernardo eram severas. Impunham aos cavaleiros castidade, pobreza, obediência. Não deviam “olhar demais para o rosto das mulheres”, nem “beijar fêmea, nem viúva, nem donzela, nem mãe, nem irmã, nem tia, nem qualquer outra mulher”. Devia na guerra, aceitar o combate de um contra três, e não podiam se resgatar mediante pagamento. Não lhes era permitido caçar a não ser o leão”.

A Ordem, porém, com o passar dos séculos, tornou-se poderosa, rica, fazia empréstimos e passara a gozar, por essas novas atribuições de forte influência política.

Lá pelo ano de 1314, o rei da França, “Felipe, o Belo” – diziam dotado de beleza incomum – pretendera ingressar na Ordem Templária e se tornar o grão-mestre.

A recusa fora inevitável e sem apelação porque havia princípios próprios a serem observados: “Eu não podia agir de outra forma”, refletira de Molay se questionando se não fora ciumento demais em relação sua autoridade se o rei Felipe ingressasse na Ordem, “nossa regra era formal: não podíamos ter príncipes soberanos em nossa comendadoria”.

Para o rei aquela recusa fora um insulto.

Começara ali a destruição dos Templários.
Tiago (Jacques) de Molay, o grão-mestre a Ordem fora preso e torturado de modo implacável num processo que durou sete anos. As torturas foram tantas, impondo sofrimento sobre-humano que confessara tudo de que fora acusado:

“Sim, os templários davam-se à sodomia, entre eles; sim, adoravam ídolos um ídolo com cabeça de gato; sim, entregavam-se à magia, à feitiçaria, ao culto do Diabo; sim, desviavam os fundos que lhes eram confiados; sim, tinham fomentado uma conspiração contra o papa e o rei...”

E o que mais tivesse.

Tiago de Molay e outros templários foram condenados à fogueira por Felipe, o Belo. E o papa Clemente V fora instado a concordar com a pena.

O grito profético de Tiago de Molay, antes que o fogo o consumisse gritou:

“- Papa Clemente... Cavaleiro Guilherme de Nogaret... Rei Felipe: antes de um ano eu vos intimo a comparecer diante do tribunal de Deus, para ali receberdes o justo castigo. Malditos! Malditos! Todos malditos, até a décima terceira geração de vossas raças!”

Essa profecia se realizou em menos de um ano: em abril de 1314 faleceu o papa Clemente V, seguiu-se a morte por envenenamento de Guilherme de Nogaret, secretário geral do reino – relatado com detalhes no livro de Druon - e em novembro daquele ano o rei Felipe, o Belo, ele de possível apoplexia cerebral (hoje mais conhecida por AVC).

O livro tem episódios de corrupção, romance, adultério das noras de Felipe, o Belo, duramente castigadas e os amantes mortos após torturas cruéis.

É um livro a ser descoberto ou redescoberto.


terça-feira, 24 de outubro de 2017

RAÍZES DO BRASIL de Sérgio Buarque de Holanda



Livro 27

Trata-se de uma obra que exige concentração mais apurada na leitura de tal modo que se obtenha o preciso sentido dos conceitos emitidos pelo autor. 




A 1ª edição de Raízes é de 1936

A referência às 'raízes do Brasil', significa que o autor voltou aos tempos da colonização portuguesa e bom que se diga que não é ele crítico na medida em que afirma que não é (sempre) possível subestimar a “grandeza dos esforços” de Portugal na exploração das novas terras, embora não nega que tudo se fez “com desleixo e certo abandono”.

Mais a frente, ao tratar da “persistência da lavoura de tipo predatório”, a exemplo do que denunciara Euclides em “Os Sertões”, destaca o autor o uso do fogo para o desmatamento:

“Mostra-se nesse trabalho como o recurso às queimadas deve parecer aos colonos estabelecidos em mata virgem de uma patente necessidade que não lhes ocorre, sequer, a lembrança de outros métodos de desbravamento”.

E as consequências:

"Além de prejudicar a fertilidade do solo, as queimadas, destruindo facilmente grandes áreas de vegetação natural, trariam outras desvantagens, como a de retirar aos pássaros de construírem seus ninhos". E sem os pássaros, não há predador contra toda espécie de insetos e, como decorrência, o prejuízo à lavoura que fica exposta a essas pragas. 


E nessa linha, "a colheita do milho plantado em terra onde não houve queimada e duas vezes maior do que em roçados feitos com o auxílio do fogo."

No livro ainda se descobre que em terras paulistas a língua falada era, predominantemente, a indígena segundo, entre outras fontes citadas pelo autor, as observações do padre Antônio Vieira: “É certo que as famílias dos portugueses e índios de São Paulo, estão tão ligadas hoje umas às outras, que as mulheres e os filhos se criam mística e domesticamente, e a língua que as ditas famílias se fala é a dos índios, e a portuguesa a vão os meninos aprender à escola.”

Aponta no meio do capítulo “novos tempos”, que autores românticos tornaram “possível a criação de um mundo fora do mundo, o amor às letras não tardou em instituir um derivativo cômodo para o horror à nossa realidade cotidiana. Não reagiu contra ela, de uma reação sã e fecunda, não tratou de corrigi-la ou dominá-la; esqueceu-a, simplesmente, ou detestou-a, provocando desencantos precoces e ilusões de maturidade. Machado de Assis foi a flor dessa planta de estufa.”

[Mas, como negar a inspiração que resultou num um livro escrito, da poesia, saindo o poeta da realidade dura e buscando um mundo individual, superior, ideal que ele cultiva e expressa?]

Sobre o Segundo Reinado e a Primeira República, “as constituições feitas para não serem cumpridas, as leis existentes para serem violadas, tudo em proveito de indivíduos e de oligarquias, são fenômeno corrente em toda a história da América do Sul” – o significado de tal afirmação no fundo se refere “às primazias das conveniências particulares sobre os interesses de ordem coletiva...”   

Há um sentido crítico à “cordialidade” brasileira que sempre prevaleceu por aqui e até hoje visitantes de outros países ressaltam essa característica que nem sempre seria saudável quando se trata de relações impessoais, do Estado impessoal – separação do público e do privado. 

[Talvez houvesse algo com o "estágio alegre" do jeitinho brasileiro em tudo, verdadeira "prática cultural" que se contrapõe às relações impessoais saudáveis.]

Mas, ressalte-se que esse conceito, no livro, não é muito claro e pode ser exagerado. O brasileiro não parece ser tão cordial assim.

Bem, paro por aqui, reafirmando a dificuldade do texto do autor Sergio Buarque de Holanda em sua obra “Raízes do Brasil”, um clássico muito citado mas tenho dúvidas se lido na mesma proporção.

Mas, há muito que conhecer, muito que aprender na obra que deve ser lida com reflexão. O livro como se tentou trazer uma amostra nestas linhas, é um tratado sociológico e histórico da evolução brasileira em campos diversos, como o rural, urbano e político.