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domingo, 22 de setembro de 2019

ODISSÉIA de Homero

LIVRO 63

(V. obs. no final)

Há um filme de 1954 estrelado pelo centenário Kirk Douglas, um filme italiano que trata do poema de Homero.

Nesse filme, muito bem feito, o Ulisses de Douglas, era valente, consciente de sua autossuficiência constituindo-se num agradável herói, sentimento que não se tem hoje, salvo exceções, na  arte cinematográfica.

O decidido Ulisses de Kirk Douglas não tinha muito com o "industrioso" Ulisses de Homero, embora valente, o saqueador de cidades, chorava de saudade de sua Ítaca, de sua esposa Penélope - "a mais cordata das mulheres" e de seu filho Telêmaco.

Esses sentimentos, no longo poema de Homero, brotaram pela série de desafios enfrentados por Ulisses - especialmente as dificuldades impostas pelo deuses imortais para que voltasse ele para o lar, para Ítaca, após participar da guerra de Troia - o livro o coloca mesmo como um dos membros que conduziram o cavalo monumento de madeira, "presente de grego" aos troianos que os levou à derrota.

O poema - que li numa boa edição em prosa mas que não difere muito de edição da década de 40 que manteve o formato da poesia - para mim realça estas virtudes: fidelidade, hospedagem respeitosa e coragem. 


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Mas, quem foi Homero?

Poeta épico grego, cuja data de nascimento é controversa, mas pode-se situar há cerca de 900 anos antes de Cristo. Teria vivido uns 30 anos, pouco mais.

No seu poema os deuses do Olimpo e os homens mortais tinham relação muito próxima. Muitas vezes os mortais recebiam auxílio ou castigo direto de Zeus e de outros deuses tanto que na leitura do poema a deusa Atena, de "olhos brilhantes" protege Ulisses até que voltasse a Ítaca mesmo enfrentado todo tipo de desafios e figuras monstruosas.



Depois de anos de ausência, após participar ativamente da guerra de Troia, o destino de Ulisses era uma grande dúvida: fora morto nalguma batalha? Ele teria morrido num naufrágio? Ou estaria vivo ainda prisioneiro nalguma terra distante.


Essa dúvida magoava demais sua esposa Penélope e seu filho Telêmaco já adulto.


Então, com essa dúvida, Telêmaco viaja por outras terras tentando obter informações seguras do paradeiro do pai, sem sucesso.

Ao mesmo tempo, sua mãe chorava muito a ausência do marido e, tanta a demora de notícias que na sua mansão, acumularam-se varões de Ítaca pretendentes em receber um sim matrimonial de Penélope. Eles acreditavam que Ulisses morrera pelo que Penélope viúva, de notável beleza, poderia se casar com algum dos pretendentes, aquele mais rico e que lhe oferecesse os presentes mais valiosos.

Esses pretendentes praticamente viviam na mansão de Ulisses, alimentando-se de seus rebanhos atitude abusada porque dilapidavam suas riquezas. Houve revolta desses assediadores quando descobriram que o véu tecido por Penélope, futura mortalha para embalar seu sogro Laertes ao morrer, se casaria quando estivesse pronta, mas à noite desmanchava o que de dia tecera. 

Telêmaco ao retornar da viagem sem a confirmação se seu pai vivia ou morrera, cuidara que não fosse assassinado pelos pretendentes que o tinham como empecilho ao casamento de sua mãe.

Por sete anos viveu Ulisses com a deusa-ninfa Calipso na Ilha Ogigia depois que sua nau fora destroçada e mortos seus companheiros por violenta tempestade como castigo imposto por Zeus, a pedido do deus Helio  pelo abate de vacas deste criadas em suas terras. 

Linhas a frente, volto a esse episódio.

Calipso queria ter Ulisses como esposo. E ele era o amante dela.

Tal perdurou até que a deusa Atena interveio por Ulisses perante Zeus, que determinou que Hermes fosse até Calipso para lhe comunicar que Ulisses deveria retornar à sua terra natal, Ítaca. 

Calipso  promete a Ulisses, se ficasse se tornaria imortal. Para voltar a esposa Penélope em Ítaca, enfrentaria grandes dificuldades. Mas, ela o auxilia na construção de uma jangada e ele parte

Essa embarcação é destruída por ato de Posídon que provocara severa tormenta no mar.

O herói se salva chegando à terra dos Féaces.

Recebido com honras pelo rei Alcino, mesmo sem que fosse conhecida sua identidade, depois de um tempo, afirma que era Ulisses e, a pedido do monarca, relata toda sua odisseia até chegar ali.

Após saquear a cidade de Ísmaro, é atacado pelos cícones.

Na fuga suas naus são desviadas para terras do Ciclopes e lá se
depara com o gigante Polifemo, dotado de apenas um olho, hábil pastor. 

O gigante os aprisiona em sua caverna, devora seis dos companheiros de Ulisses e mantém refém os demais com a mesma finalidade.

Então, Ulisses e seus companheiros sobreviventes, embebedam com vinho Polifeno, preparam um grande tronco fino comprido, aproveitam sua embriagues e o cegam. 

Na fuga que se segue, Polifeno tenta os atingir com enormes pedras atiradas a esmo e sem direção ao mar.

Polifeno, filho de Posídon, roga ao pai que nunca permita que Ulisses retorne ao lar, a Ítaca.

Aporta na Ilha de Eólia terra dos guardiões do vento, onde vivia Éolo. Bem recebido, para que Ulisses e os seus companheiros partissem, Éolo garantiu que os ventos os conduziriam ao destino. Para tanto lhe presenteara com um odre que aprisionava os ventos desfavoráveis. 

Mas na viagem, esse odre foi aberto desencadeando o sopro de ventos desfavoráveis. Suas naus voltam à Ilha de Eólia. Éolo não os recebe de novo e, então, aportam na terra dos Lestrigões.

Dos dois grupos para conhecer a região, um deles, no qual não estava Ulisses, dera-se com Circe, feiticeira que lhes ofereceu uma bebida, transformando-os em porcos.

Hermes aparece para Ulisses e lhe ensina o truque para salvar seus companheiros vítimas do feitiço: ervas lhe foram entregues que impediriam o feitiço de Circe.

Assim, feito, Ulisses por recomendação do deus, ameaça matá-la. Circe assustada liberta seus companheiros do feitiço.

Depois de um ano com Circe e seus banquetes, Ulisses lhe informa que partiriam para a terra natal.

Mas, Circe lhe diz que, antes, deve viajar até a região de Hades - 
morada dos mortos - e da "terrível Perséfone" para consultar o adivinho Tirésias, já morto mas que mantinha os mesmos poderes de quando vivia. (*)

Ulisses chora muito esse novo desafio, mas para lá vai.

A primeira alma que aparece, já na região de Hades, é Elpenor, companheiro de Ulisses que morrera de acidente na mansão de Circe e estava, ainda, sem sepultura.

Para receber Tirésias imola um carneiro negro e deixa correr "o seu negro sangue". (**)

Este, após beber o "negro sangue", informa que a chegada de Ulisses a Ítaca será dificultada pelo "Sacudidor da terra ", Posídon, que pretenderia vingar a cegueira imposta ao seu filho Polifeno.

Mas, disse, também, o adivinho, que conseguiria escapar das tormentas aportando na ilha do Tridente mas não deveria se aproximar dos carneiros e vacas do deus Hélio.

Ulisses, depois de deixar Tirésias encontra sua mãe e, emocionado, tenta abraçá-la mas, ela evitava a aproximação como se "fosse uma sombra ou um sonho."

Todos os mortos se aproximaram de Ulisses, tentando expor suas angústia. 

Reconheceu a bela mãe de Édipo, o aqui chamada de Epicasta que se casara, sem o saber, com o próprio filho. (***)
  
Viu Tício, sendo atacado por dois abutres que dilaceravam seu fígado por ter violentado Leto, a "ilustre esposa de Zeus".

E outros conhecidos de Ulisses sofriam castigos. (****)

Todos estavam ávidos em sorver o "sangue negro" dos animais abatidos. 

Então, vencida essa etapa, volta à mansão de Circe para sepultar seu companheiro Elpenor.

Ela o avisa para ser cauteloso quando chegasse na região das sereias porque seu cantar melodioso encantava os viajantes que não resistiam à sedução e por lá ficavam cativos, numa espécie de deslumbramento.

Também haveria que cuidar muito quando se aproximasse da região de Cila e Caríbedes, devendo ficar mais próximo de Cila.

Para não ouvir o canto das sereias, ele obriga que seus companheiros tapem os ouvidos com cera. Ulisses pede para ser amarrado num mastro e suporta  a sedução das sereias que 'inundavam  seu coração'. 

Cila era um monstro horrendo com 12 pés e seis cabeças descomunais das quais não há quem escapasse. 

Circe recomendara a Ulisses que não empunhasse qualquer de suas armas para não provocar Cila.

Esquecido desse conselho, Ulisses arma-se. Cila atacou a nau  apreendendo e devorando seis dos companheiros de Ulisses,

Caribedes tinha o poder, ao engolir a água salgada e quando a vomitava o mar se tornava revolto e efervescente.

Mas, ao escaparem, mesmo com os seis companheiros devorados aportam na ilha de Helio. 

Os companheiros de Ulisses, quando não havia mais alimentos, abatem vacas do deus Helio que pede a Zeus que todos eles sejam mortos como castigo.

Tal ocorre, apenas Ulisses é poupado e ele e atirado na ilha da deusa Calipso. 

Dai, vai em busca de sua terra, Ítaca, numa jangada e, poupado, chega à terra dos Féaces.

Depois de ouvir tudo o que Ulisses enfrentara, Alcino, rei dos Féaces, resolve equipar uma nau e conduzi-lo a Ítaca, não sem antes dar-lhe muitos presentes.

E Ulisses chega a Ítaca. A deusa Atena que o protegia, o "transforma" num mendigo irreconhecível de tal ordem a que conhecesse a quem poderia confiar e quem o traia.

O único que o reconheceu foi seu fiel cão Argos, meio abandonado, que se ergue à chegada do dono.

Seu porqueiro fiel se emocionava por acreditar na morte de seu senhor.

Algum tempo depois Ulisses se dá a conhecer a seu filho Telêmaco e ambos engendram um plano para se vingar dos pretendentes matando todos eles.

Ulisses mendigo aos poucos vai se aproximando de sua mansão sob escárnio e protesto dos pretendentes que ainda assim lhe davam algum alimento como esmola.

A velha escrava Euricléia ao lavar os pés do mendigo por ordem de Penélope, reconheceu que era Ulisses por uma cicatriz profunda na perna que ficara após o ataque de um javali. Ele pede à escrava que mantenha o segredo de sua identidade.

Penélope também não o reconhecera e a ela sugere uma prova aos pretendentes: que aquele que vergasse o arco de Ulisses, fixasse a corda e armá-lo, ao mirar uma flecha, deveria ela ultrapassar o furo de 12 machados devidamente postos em linha.

Telêmaco parecia  conseguir vergar o arco, mas Ulisses com um gesto imperceptível o impediu de prosseguir.

Então o arco é dado ao mendigo sob protestos. Este não só consegue vergá-lo como mira a flecha que ultrapassa o orifício dos machados.

Feito isso, apoiado pelo porqueiro Eumeu, com o boieiro Filécio  e Telêmaco, começam a a matar todos os pretendentes.

E conseguem. Os corpos são levados para um local na mansão enquanto Ulisses vai em busca do pai Laertes nos campos porque esperava a reação de toda Ítaca. Foram mortas figuras destacadas da cidade. 

É nessa visita emocionada entre pai e filho é que se sabe que o velho Laertes cultivava frutas em seus campos. Essa é única referência a esse tipo de alimento em toda a Odisseia. A predominância sempre fora nos festins constantes, a carne. o pão e o vinho.

Zeus, todavia, a pedido da deusa Atena, decreta a paz em Ítaca, mesmo após aquelas mortes todas.

Quando Penélope, "a mais cordata das mulheres",  finalmente reconhece que o mendigo estrangeiro era Ulisses, agora devidamente apresentado com vestes ricas, se emociona muito e seguem para recuperar o amor de tantos anos passados.

Haviam se passado 10 anos.

MORAL DA HISTÓRIA

A "Odisseia" de Homero traz no seu conteúdo, timbres de fidelidade matrimonial, o amor filial, a coragem e a sensibilidade porque o herói chorava. Mas, também, a vingança para salvar a honra. Todos os sacrifícios, os percalços e os monstros extraordinários (Polifeno e Cila) vividos ou enfrentados por Ulisses, podem ser qualificados como as dificuldades da própria vida de cada um e, quanto aos monstros aqueles pensamentos de ódio, destrutivos, que frequentemente habitam a mente mais de uns do que de outros.
E os deuses sempre dirigindo a vida e a morte do mortais. 
E há que destacar a fidelidade de Penélope.

Minha avaliação: gostei

A "Odisseia" é a "continuação d' "A Ilíada", também de Homero. (*****)

Referências:

(*) Na "entrevista" de Sócrates, diz ele que há almas perdidas fora do mundo invisível que temem a região de Hades, afastam-se do corpo e se tornam visíveis, vagando em volta dos túmulos, dos cemitérios, fantasmas medonhos, espectros assustadores.
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(**) Tirésias é o mesmo adivinho da obra teatral "Edipo Rei" de Sófocles.
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(***) Epicasta  na obra de Sófocles, mãe de Édipo com quem se casa sem o saber, tem o nome de Jocasta.
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(****) A descrição de Hades e seus mortos sendo castigados  num ambiente obscuro, medonho, lembra um pouco o "Inferno" de Dante Alighieri na "Divina Comédia",]
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(*****) Acessar: "A Ilíada" de Homero

Observação: Esta resenha / comentários está melhor desenvolvida no reunião das três obras, Ilíada e Odisseia de Homero e Eneida de Virgílio. Os textos foram revisados e ampliados.