Translate

sexta-feira, 20 de março de 2020

AUTOBIOGRAFIA DE UM IOGUE de Paramahansa Yogananda

LIVRO 69




















 
É no livro de Yoganada que todos os conceitos da meditação profunda, de manifestações místicas e milagres se sobressaem.(*)

Bom que se diga que, a despeito de suas próprias escrituras, principalmente o Bhagavad Gita, não poucas vezes Jesus foi citado por Yogananda, os evangelhos estudados, ora para afirmar seus ensinamentos, ora para comparar com as figuras crísticas de monges iogues, um deles seu guru.

Nesse livro, Yogananda não se refere Jesus como instruído nos ensinamentos indus, embora haja elementos para informar que a prática iogue poderia existir há mais de 2000 anos.

Os milagres praticados por esse iogues eram resultado da estreita intimidade com Deus, mercê da meditação profunda, da vida celibatária - embora um dos principais monges fora casado e trabalhara em serviços burocráticos antes - mas sobretudo pela fé inabalável na Divindade e na sua busca.

Para melhor entendimento dessa fé, dos milagres realizados por esses monges, de cura, de "dupla materialização" de seus corpos físicos se apresentando em locais distintos ao mesmo tempo, ressurreição como se se manifestou Sri Yukteswuar guru de Yogananda,  e tantos outros, transcrevo a passagem do Evangelho de Mateus um "exemplo" significativo tanto no que se refere ao milagre da fé, como nas consequências de sua desconfiança (14:22):

22. E logo ordenou Jesus que os seus discípulos entrassem no barco e fossem adiante para a outra banda, enquanto despedia a multidão,
23. E, despedida a multidão, subiu ao monte para orar à parte. E, chegada já a tarde estava ali só.
24, E o barco estava já no meio do mar açoitado pelas ondas, porque o vento era contrário;
25. Mas, à quarta vigília da noite, dirigiu-se Jesus para eles, caminhando por cima do mar.
26. E os discípulos. vendo-o caminhar sobre o mar, assustaram-se, dizendo. É um fantasma. E gritaram com medo.
27. Jesus, porém, lhes falou logo dizendo. Tende bom ânimo, sou eu, não temais.
28. E respondeu-lhe Pedro e disse: Senhor, se és tu, manda-me ir ter contigo por cima das águas.
29. E ele disse: Vem. E Pedro, descendo do barco, andou sobre as águas para ir ter com Jesus.
30. Mas, sentindo o vento forte, teve medo; e,começando a ir para o fundo, chamou, dizendo: Senhor, salva-me,
31. E logo Jesus, estendendo a mão , segurou-o, e disse-lhe: Homem de pouca fé, por que duvidaste?
32.  E, quando subiram para o barco, acalmou o vento.

Nessa passagem, então, se constata o milagre e a pouca ou nenhuma fé de Pedro. O trecho diz tudo.


Pois o livro de Yogananda é tudo de fé, convivência com seres humanos santos, milagres, pureza extrema e vida simples. Yogananda no seu dia a dia, nas suas aspirações nunca duvidava do que desejava. E obtinha as graças pensadas.

Quem são os principais gurus que influenciaram sua vida e sua ida mais tarde da Índia para os Estados Unidos?

São eles: o grande iogue e mestre Babaji, monge que vivia havia séculos (imortal), habitava algum ponto do Himalaia, que foi guru de Lahiri Mahasaya a quem Babaji ressaltou o fato de ter sido ele casado e pai de família, mas que não seria impedimento em buscar a intimidade com Deus. Lahiri Mahasaya fora guru de Sri Yukteswuar e este guru de Yogananda,

E é a partir desses personagens reais, mas não só, que se desenvolve a autobiografia, um livro de mais de 600 páginas admirável, sincero e, mais, sem medo de revelar realizações espirituais (milagres) por seus gurus e outros que considerava santos, sem qualquer reserva.

Diria que para o ateu esse livro pode significar um impacto a essa negação às divindades porque suas páginas são de inspiração mística, de eloquência na simplicidade.

Por escolha do guru Babaji, fora Yogananda designado para mudar-se para os Estados Unidos para levar os ensinamentos orientais àquele pais sem perder a oportunidade do próprio aprendizado convivendo com os americanos.

Na Índia ele se tornou educador fundando escolas nas quais a yoga sempre esteve presente. Nos Estados Unidos e mesmo em seu país proferiu dezenas de conferências, palestras e aulas.

Tornou-se importante nos dois países. Pelo amor dedicado aos americanos que aos milhares se aproximaram de sua filosofia e na Índia por revelar sua cultura milenar aos ocidentais.

Sempre que chegava ao seu conhecimento Yogananda procurava conhecer aqueles pessoas que tinham atributos santificados. Então visitou Tereza Neumann, a estigmatizada católica, que atacada pelos ferimentos de Cristo crucificado e surgiam as feridas na cabeça e nos membros aos quais houvera a agressão da crucificação. Yogananda informa que pôde ver o que se passava com ela, transferindo ao seu corpo todo o sofrimento de Cristo na cruz. 

Também já na Índia visitou a "Mãe impregnada de alegria" (Ananda Moyi Ma) que na sua espontaneidade de criança teria profunda ligação com Deus. 

E visitou, também a mulher Iogue que não se alimentava desde os 12 anos, condição obtida com muita oração ao ser desprezada por sua sogra por comer muito quando jovem. Gira Bala se alimentaria, apenas do éter, do sol e do ar.


Paramahansa Yogananda desde muito jovem decidiu que renunciaria à vida material, dedicando-se à vida simples e espiritual. Ansiou muito por um guru que o encontrou, Sri Yukteswuar de quem recebeu muitas lições, algumas com rispidez mas nunca perdendo o objetivo de levar o discípulo à intimidade com Deus. Como me referi, foi escolhido pelo Mestre imortal Babaji para mudar-se para os Estados Unidos para transmitir os conhecimentos indus naquele grande país e o fez com muito brilhantismo, fundando em 1920, com apenas 27 anos, a Self-Realization Fellowship que obteve milhares de adeptos na busca da verdade (Deus) pela meditação da Kriaya Yoga. A SRF existe até hoje.

Essa entidade é a editora do próprio livro de Yogananda.

Todo o relato inspirador do Autor se dá entre a década de 20 até o início da década de 50.

Seu nascimento deu-se em 05.01.1893. Morreu jovem, aos 59 anos de idade em 7.03.1952, logo após discursar num banquete em homenagem ao embaixador da Índia nos Estados Unidos.

Hoje, não busquei informações da aparição de santos iogues da envergadura daqueles que Yogananda conheceu e amou.
Mas, muita coisa mudou na Índia. População de mais de 1 bilhão de habitantes. Graves problemas de saneamento. O rio Ganges, sagrado, é um dos mais poluídos do mundo.

Por onde andarão aqueles seus luminares?


Se me for permitido comparar os santos crísticos iogues gurus de Yogananda com Jesus Cristo, parece que este foi muito mais atuante, no meio de povo que o seguia admirado pelos seus inumeráveis milagres de cura, em criticar abertamente os fariseus e, por fim, seu sacrifício em deixar uma mensagem do antes Dele e depois Dele. Não parece que os pecados de todos foram salvos na cruz, salvo a dos seus apóstolos a quem receberam poderes divinos, mas exposta uma nova fórmula de vida especialmente do perdão e da caridade, até hoje tão carente. Os pecados, as guerras e as agressões aí estão vistos a "olho nu", pequenos e grandes pecados.

Pelo seu poder de meditação, relata Yogananda sua disposições em bem interpretar e entender os Evangelhos do Novo Testamento, em  oração silenciosa pediu a Jesus que o permitisse entender passagens de difícil compreensão nos relatos dos evangelistas.

Num dado momento sua sala de meditação se ilumina e Jesus chega até ele num "azul opalescente" e todo o esplendor de seu rosto jovem, seu olhar glorioso, diz Yogananda, "senti o poder que sustenta miríades de mundos".

Yoganada, na sua trajetória conviveu com inúmeras personalidades. 

Os editores da obra parecem não aceitar muito transcrições de trechos do livro. Mas, Yogananda visitou Mahatma (Grande Alma) Gandhi, um politico-místico que a Índia deve tanto e que venceu pregando a não-violência vivendo na absoluta simplicidade contribuiu decisivamente para a obtenção da independência de seu país em 1947, convencendo os dominadores ingleses, por vezes truculentos. Foi assassinado em 30 de janeiro de 1948 por um "desvairado".

Fiquei emocionado com o que disse Gandhi sobre uma simples vaca:

- Para mim a vaca representa todo o mundo infra-humano: ela amplia a solidariedade do homem para além de sua própria espécie. Por meio da vaca, o homem é impelido a perceber sua identidade com tudo o que vive. (,,,) A vaca na Índia era a melhor comparação: ela é que trazia a abundância. Não só dava leite mas possibilitava a agricultura. A vaca é um poema de compaixão; lê-se piedade neste manso animal. Ela é a segunda mãe de milhões de seres humanos. Proteger a vaca significa proteger toda a muda criação de Deus." (***)

Yogananda visitava frequentemente o americano Luther Burbank, "um santo entre as rosas" a quem qualificava de horticultor, um cientista que fazia experiências positivas com plantas e até conversava com elas: "Além do conhecimento científico, o segredo para melhorar o cultivo das plantas é o amor".

[Nestes tempos de devastação ambiental, é sempre bom lembrar que, no simbolismo do Gênesis, o "verde" foi criado antes dos animais e do homem. Gesto de amor do Criador].

Há muito a aprender na "Autobriografia", mas vou, ainda, me referir ao karma que significa o cumprimento da lei da causa e efeito. O karma é uma espécie de grilhão que impede o ser humano de atingir a divindade, se não reencarnando muitas e muitas vezes pelos séculos até atingir um grau de santificação e possa habitar outros reinos, superiores.

A Terra é um planeta de diferenças e penitências. Por vezes os castigos são tão cruéis, tragédias coletivas tão difíceis de aceitar considerando que há Deus cuidando do Universo e de todos. 

Mas, essas são as penitências que  advertem severamente que o mundo das divindades não é este. Mas, há que se reconhecer que convivam lado a lado almas de elevado nível espiritual e de baixo vigor mental.

Além das penitência, este é o planeta do trabalho, das aspirações realizadas ou não. As não realizadas ficariam pendentes nesta passagem pela vida tanto quanto e os pecados praticados. As aspirações pendentes seriam realizadas em futuras reencarnações como os pecados não purgados na vida presente.

Este planeta de lutas "de causa e efeito" me parece, pode ser confirmado num dos livros de Yogananda, "A lei do sucesso" -  que não li - mas ele trata do tema das aspirações com esta explicação resumida:

"Este livro explica os princípios dinâmicos para que a pessoa alcance as metas que tenha na vida e esboça as leis universais que produzem as realizações e o êxito, em termos pessoais, profissionais e espirituais."

Afinal de contas, nisso tudo não é criado o karma bom, nesses desejos e lutas realizados e não realizados?

Essas indagações são minhas mas claro que pelo que li no livro de Yoganada, admirável.

Tenho a impressão que um exemplo de remissão do karma (ou carma) se dá nos Evangelhos de Marcos 02.05.11.12. O karma é a lei da causa e efeito, tudo volta seja o que de bem seja o que de mal tenhamos praticado:

5. E Jesus, vendo a fé deles, disse ao paralítico. Filho, perdoados estão os teus pecados.
(...)
11. A ti te digo. Levanta-te, toma o teu leito, e vai para casa.
12. E levantou-se, e, tomando logo o leito, saiu em presença de todos, de sorte que todos se admiraram e glorificaram a Deus, dizendo: Nunca tal vimos.


O perdão do pecado por Jesus, resultou, então, na remissão do carma, mas essa lei continua vigente constituindo-se um dos mistérios irrespondíveis

Com esses mistérios todos que eclodem, que nos desafiam ao olhar uma noite estrelado, a Lua brilhante ou mesmo no dia a dia se se prestar atenção, encerro com esta frase contida no livro:
 ´
"Os mistérios últimos de Deus não se acham "abertos ao debate". A decifração de Seu código secreto é uma arte que o homem não pode comunicar a outro homem; aqui, só o Senhor é o Mestre". 










O riso sereno de Yogananda momentos antes de sua morte.

REFERÊNCIAS

(*) Livros que podem ter relação filosófica com o Livro "Autobiografia de um Iogue":

 "Mistérios e Magias do Tibete" de Chiang Sing. Acessar: 
https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2017/07/misterios-e-magias-do-tibete-de-chiang.html

"A Vida Mística de Jesus" de H. Spencer Lewis. Acessar:
https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2019/04/a-vida-mistica-de-jesus-de-h-spencer.html

(**) Crônica "A vaca e o bezerro sedentos"
Acessar:
https://martinsmilton.blogspot.com/2009/03/renuncia-carne-animais-brutalizados.html


domingo, 26 de janeiro de 2020

ENEIDA de Públio Virgílio Maro

Livro 68



















(V. obs. no final)

A ENEIDA é um poema épico que conta a história de Enéias, troiano que escapou da guerra de Troia, como herói mesmo sendo seus exércitos derrotados pelos gregos que conseguiram entrar na cidade com o famoso cavalo de madeira ("o presente de gregos").

Nesse cavalo de madeira, de proporções, se escondiam militares gregos que praticamente destruíram Troia.


O exemplar que tenho de Eneida é em prosa, não em verso, como se constitui a obra de Virgílio, edição dos primeiros anos da década de 1940.


A obra de Virgílio foi publicada há mais de 2000 anos, pouco tempo antes do surgimento do cristianismo.


Concluí como mero ledor, não estudioso das obras gregas, que de Homero há dois livros fundamentais, Pela ordem os interessados deveriam começar pela Ilíada (*), obra densa, com cerca de 500 páginas, depois a Odisseia (**) e, por fim, o obra Eneida.


Isso porque pelo que constato, na Ilíada se encontra o relato da guerra de Troia, sua origem e mesmo a tragédia dos embates. 

Na Odisseia a obra relata os dissabores de Ulisses após a vencida a guerra de Troia até conseguir voltar ao lar depois de 20 anos ausente. 

E na Eneida, a figura de Enéias, guerreiro heroico de Troia e suas lutas para se instalar no Lácio, Itália.

Também ele vence obstáculos de toda natureza, o ódio e as ciladas da deusa Juno. 


Mas, o livro tem cenas de amor, de suicídio por amor e muitas lutas violentas, a poder de lanças e flechas. Essas lutas ou guerras tinham por objetivo, além de conseguir extensões da Itália para fundarem os troianos comandados por Enéias uma nova cidade também, por elas  a conquista de Lavínia noiva que lhe fora prometida pelo rei Latino mas que seria depois seu inimigo na guerra por injunção de Turno.

Na obra Eneida há também, como na Odisseia de Homero, monstros. Destaco as harpias que voando dos montes, batendo suas asas com "horripilante ruído", roubam as iguarias "sujam  tudo com seu imundo contato" e exalam mau cheiro e seus gritos selváticos.

A heroína: Camila, de peitos nus, luta bravamente ao lado de Turno, mas é morta em combate. 



Virgílio na "Divina Comédia" de Dante Alighieri, foi seu guia 

e instrutor quando da "visita" ao "Inferno" e ao Purgatório" 

(***)

Enéias com a ajuda de sua mãe, a deusa Vênus, escapa de Troia devastada pela gregos. No trajeto da fuga, na qual o acompanha seu filho Ascânio, desaparece sua esposa Creusa por ordem dos deuses do Olimpo.

Mas, qual a causa central dessa guerra? O rapto pelo troiano Páris, da linda espartana Helena, esposa de Menelau. Teria sido rapto ou fora uma decisão dela em fugir com o amado? São perguntas que os estudiosos fazem até hoje.

Na obra Eneida, se lê:

"Não lances a culpa à formosa e odiada Helena nem a Páris tampouco; foi a inclemência dos deuses que destruiu a poderosa Troia."

Quando conseguiu, com seus navios se afastar da região de Troia devastada, por má influência da deusa Juno, os ventos soprados pelo deus Eólio fazendo o mar revolto, os troianos aportam sem o saber nas terras Líbias, na cidade de Cartago na qual a bela Dido, a rainha, vinha construindo.

Enéias e seu grupo são bem recebidos em Cartago. Enéias  relata a Dido todas as suas aventuras, as batalhas em Troia destruída e incendiada, evitado o reino de Ítaca, berço do cruel Ulisses, a morte brutal do velho Priamo, rei troiano...

Por obra de Citereia (Vênus), atacada por Cupido disfarçado, Dido se apaixona por Eneias e pensa em retê-lo para com ele viver. Se entrega a ele, mas Júpiter ordena que seja Enéias, avisado pelo mensageiro Mercúrico que não seria Cartago o seu destino e o obriga a viajar nos rumos do seus destino (fados) a Itália.

Eneias se emociona em deixar Dido. Esta, perdida de amor e  pela fuga de seu amante, envergonhada, se suicida.

















Chegando à Sicília, em homenagem a seu pai, Anquises, promove jogos fúnebres mas as mulheres troiana, cansadas das viagens e por sugestão de Juno, incendeiam navios. Então Eneias, funda a cidade de Acesta, deixando lá as mulheres e os inválidos, seguindo seu destino.

Aporta então Cumas e lá se encontra com Sibila, aquela que "inspira o furor divino e revela o futuro". Com ela desce aos infernos para ver a sombra" do pai, Anquises. Nesse ambiente sombrio constata todo o sofrimento daqueles que em vida pecaram gravemente, as desgraças que afetam os mortais, horríveis monstros...

Chegam na caminhada num ambiente mais sereno, nos "Campos Fortunados" onde se reúnem aqueles  heróis, "dos que em peleja morreram pela pátria, os sacerdotes puros durante a vida, os vates piedosos, que disseram coisas dignas de Apolo, os que inventaram artes para  melhorar a vida..."

Eneias encontrou a sombra do pai. Tenta abraçá-lo mas sendo uma sombra escapa pelos seus braços.

Anquises então explica ao filho o modo de renascer na terra, muita semelhança com os que pensam em reencarnação. São "almas depuradas" as que voltam à vida, "para que deslembrados do passado, tornem a ver a face da terra e queiram voltar aos novos corpos".

Prosseguindo na viagem chega à foz do Rio Tibre.

O rei Latino percebe a presença de estrangeiros e que pretendiam se apossar de extensões da Itália.

Nessa perspectiva estava Lavínia acendendo as chamas dos altares dos deuses ao lado do seu pai quando um prodígio se realizou ampliando-se o fogo por todo o recinto e queimando parte dos longos cabelos dela.

Foi considerado um presságio.

Então Latino consultou um oráculo. Este confirmou que um estrangeiro ilustre  chegaria e deveria desposar sua filha Lavínia.

Latino recebeu Enéias e sua comitiva muito bem. Ofereceu área para que construísse uma cidade e ofereceu sua filha em casamento.

Eis que Juno, esposa de Júpiter que odiava os troianos, interveio para, por uma divindade do mal, "envenenar" Amata que cuidava do casamento de Lavínia com Turno.

Ela não convence Latino a romper com o prometido a Enéias e então o ódio e transferido a Turno que declara guerra os troianos, buscando somar ao exército italiano outros facções de reinos vizinhas.

Enéias, por sua vez, ao saber da guerra declarada também busca outros aliados. Orientado pelo deus Tiberino busca Arcade e pede o apoio do rei Evandro.

Evandro aceita ajudar destacando seu filho Palante para comandar o seu exército em apoio a Enéias.

Os combates violentos são descritos por Virgílio de modo realista, como neste trecho:

"Ouvem-se os gemidos dos moribundos, na sangueira rolam armas, cadáveres e cavalos a morrer acende-se áspera batalha".

Latino se arrepende muito de não ter mantido a promessa feita a Enéias, aceitando a guerra proclamada por Turno também pretendente de sua filha Lavínia.

Turno é auxiliado por sua irmã Juturna que pode ter ferido Enéias com uma flecha (a obra não revela isso) mas ele se recupera logo com a ajuda de Vênus.

Enéias e Turno eram exímios lutadores e praticamente venciam todos os adversários a frente.

Na luta final entre Enéias e Turno, havia a sensação de que este seria ele morto pelo adversário.

Turno permanece indeciso, medroso e a distância. Enéias, então, atira de longe a lança que trespassa a coxa de Turno que se ajoelha indo ao chão aquele corpo avantajado (v. a imagem da capa do livro).

Ao se aproximar do adversário caído, Enéias até vacilava em matá-lo, ouve dele que Lavínia lhe pertence, que ele vencera a guerra,  mas vê nos ombros despojos do jovem Palante - filho de seu aliado Evandro - morto por Turno e, então, cheio de ira, "impetuoso embebe a espada no peito do inimigo".

MORAL DA HISTÓRIA

Não se subestime a fé dos mortais nesses poemas épicos aos seus deuses pagãos, porque as orações nos momentos difíceis eram as mesmas de hoje nas quais os crentes rezam para Deus ou suas Divindades: as orações dos mortais gregos e troianos pediam aos deuses, a vitória, a preservação da vida nas batalhas e nas intempéries, realização de desejos...

Então, nem se estranhe a presença permanentes dos deuses do Olimpo muitas vezes se relacionando com os mortais, porque tantos são os que creem que Deus e as Divindades de hoje também agem respondendo orações piedosas.

Há inclusive o cumprimento dos fados (do destino) que Júpiter reluta em mudar ao pedido que ajudasse Enéias nas batalhas.


Referências


Observação: Esta resenha / comentários está melhor desenvolvida no reunião das três obras, Ilíada e Odisseia de Homero e Eneida de Virgílio. Os textos foram revisados e ampliados.

Acessar: ILÍADA, ODISSEIA E ENEIDA



segunda-feira, 23 de dezembro de 2019

AS PORTAS DA PERCEPÇÃO e O CÉU E INFERNO de Aldous Huxley

Livro 67

Resultado de imagem para as portas da percepção


Esse livro ou os dois livros são de meados da década de 50. Não é novo, mas ao lê-lo, fiz minhas reflexões situando-o nestes tempos atuais conturbados.

Desde logo vou informando que o Autor se submeteu à experiência de ingerir mescalina, um subproduto do peiote (peyote), um cactus baixo, sem espinhos, que se enfeita com uma flor rosa, muito conhecido no México. Mas, pela exploração comercial, a planta está ameaçada de desaparecer.

Lophophora williamsii pm.jpg

Aldous Huxley é o Autor do livro sempre lembrado, "Admirável Mundo Novo" que faz parte deste meu acervo (*).

Por sua vez, o livro "Admirável Mundo Novo" foi escrito no começo da década de 30 e o Autor já demonstrava interesse pelas drogas "recuperadoras da alma", naquele ambiente fechado do mundo novo controlado que imaginou e, para isso, existia a droga "soma":

O "soma" era a droga contra todos os males da "alma": da angústia, da depressão, da tristeza, da dúvida. Uma dose da droga anestesiava a mente do usuário, sobrevindo um estado de euforia, de felicidade, sem os mal estares de outras drogas quando passasse seu efeito. 

Então, falando em "outras drogas", segundo o Autor, a mescalina produzia seus efeitos alucinógenos por um certo tempo e não viciava como o cigarro, a maconha, a cocaína e o crack, todos esses, drogas com graus de vício moderado ou trágico à vida e ao psiquismo dos viciados, destacando-se como devastador em todos os sentidos, o crack.

Ao consumir a mescalina é transportado o Autor para uma "região" a que denominou "outro mundo". 

Sob os efeitos da droga descreve um simples vaso de flores sem atrativo, que passou a ver, "agora, aquilo mesmo que Adão vira no dia de sua criação - o milagre do inteiro desabrochar da existência, em toda sua nudez"

Um "ramalhete de flores a brilhar com sua própria luz interior..."

Explica Huxley que "o cérebro é dotado de um certo número de sistema enzimático que serve para coordenar seu funcionamento."

A mescalina, inibindo a produção dessas enzimas, diminui a quantidade de glicose" no cérebro gerando estas reações:

> Não afeta a capacidade de lembrar-se e de raciocinar corretamente;

> A capacidade de visão é intensificada. O interesse pelo espaço diminui e importância do tempo cai quase a zero;

> O intelecto nada sofre e a percepção é aumentada, mas a vontade é afetada e o individuo que ingeriu a mescalina não vê razão para fazer seja o que for. E deixa de ser uma preocupação nesse estágio porque passa a ter melhores coisas para pensar;

> As melhores coisas com a mescalina, podem ser aproveitadas, como diz o Autor, "lá fora, aqui dentro ou em ambos os mundos - o interior e exterior simultaneamente ou sucessivamente."

Há pessoas que sob os efeitos da droga apreendem que TUDO está em todas as coisas ampliando a possibilidade da mente em "aperceber-se de tudo o que está acontecendo em qualquer parte do universo."

Esses são os efeitos básicos da mescalina.

O Autor também envereda para a pintura de certos artistas que em seus quadros parecem alcançar as cores e precisões desse outro mundo. Não se refere a Leonardo Da Vinci que por tudo o que deixou especialmente suas obras primas, em qual escala do "outro mundo" teria agido. (**)

Esses artistas podem ter obtido imagens que o observador atento percebe se situar no "outro mundo" que diz respeito dos "antípodas de sua própria mente". [antípoda: do outro lado, do lado oposto].

Refere-se à música, o enlevo que provocava sob os efeitos da mescalina mas há revelação interessante sobre a esquizofrenia. Sob os efeitos da droga, diz ele, os pacientes "experimentam apenas as sensações celestiais da esquizofrenia".

Mas, a esquizofrenia, num estágio ainda intermediário, num momento de lucidez pode captar imagens de grande beleza nesse "outro mundo", mas muitos esquizofrênicos "passam a maior parte de seu tempo em um lugar que não é a terra, o céu, nem tampouco o inferno, mas sim um mundo cinzento e umbroso, povoado de fantasmas e quimeras". 

CÉU E INFERNO

No segundo livro do mesmo volume, o "Céu e o Inferno" o Autor passa a se referir sobre supostas manifestações humanas que vão progredindo na busca da luz (de iluminação ambiental), a luz de vela substituída por tipo mais eficiente de iluminação, o fogo como manifestação de luz - elemento de meditação -, as obras de arte com cores incomuns que não podem ter sido captadas neste mundo, mas no "outro mundo". 

O jejum pelos efeitos que produz no cérebro desnutrido, pode gerar os mesmos efeitos de visões fantásticas, nos padrões do consumo da mescalina.

O brilho das pedras preciosas que sempre encantam os seres humanos e os jardins:


"Deus primeiro plantou um jardim". Essa afirmação encerra uma profunda verdade psicológica." A floricultura tem sua origem no "outro mundo."

Destaca o Autor, terras maravilhosas dos "outro mundos", perfeitas, cheias de lagos, vegetação, de luz e de ouro.

O uso do vidro inspirou outras magníficas manifestações artísticas como se conhece na Catedral de Chartres - França, os seus vitrais:

Resultado de imagem para catedral de chartres

Mas, por fim, a iluminação elétrica. Pergunta-se a propósito, em que escala do "outro mundo" transitou Nikola Tesla tanta sua engenhosidade nessa matéria.

Nestes tempos o Autor que até divaga sobre a iluminação com base em sua experiência com a mescalina pode-se mencionar Nova York como referência às luzes intensas que a caracterizam, encanto dos turistas. 

O Autor, então, revela que até aquele momento se dedicara à experiência visionária bem-aventurada de sua experiência com a mescalina, referindo-se à teologia e a arte como manifestações, digamos, "celestes", desse "outro mundo".

Mas, no tocante ao inferno, a mescalina terá efeito perverso quando o paciente apresenta emoções negativas, falta de confiança, o ódio, a ira  e a maldade - "que elimina o amor" - fazem a experiência se tornar aterradora.

Vou concluindo, lembrando Carlos Castaneda nos seus livros que discorrem sobre o uso do "mescalito" - de uso corrente entre indígenas no México - sendo o Autor, orientado pelo bruxo Dom Juan. 

No seu livro "A Erva do Diabo" - o nome já se apresenta significativo - entre o que pode ser ficção ou realidade, sua experiência com o mescalito - assim denominado nos seus livros - muito negativa.

Pelo que ele revela também no livro "Uma estranha realidade", há sempre dúvidas em relação aos ensinamento de Dom Juan fato que quando da experiência, não estivesse o Autor preparado até pelo ambiente "mágico" em que se encontrava, com a mente dirigida pelo seu mestre, situação que pode ter provocado as severas distorções das visões que, como como diz Huxley, podem ser celestiais ou infernais.

Tudo muito interessante. Livro com 130 páginas, mas repleto de conclusões do Autor - mas ele divaga um pouco. 


Referências:

(*) "Admirável mundo novo" (Livro 13) do mesmo Autor, acessar:
https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2017/07/13-admiravel-mundo-novo-de-aldous-huxley.html

(**) "Leonardo da Vinci" de Walter Isaacson (livro 60), acessar:
https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2019/06/leonardo-da-vinci-de-walter-isaacson.html


segunda-feira, 25 de novembro de 2019

O RETRATO DE DORIAN GRAY de Oscar Wilde

LIVRO Nº 66




















"O retrato de Dorian Grey" foi escrito em 1890/1891.

O nome completo do seu Autor, irlandês, que viveu de 1854 a 1900: Oscar Fingal O'Flahertie Wills Wilde.

Considerado um poeta e escritor genial, mesmo com poucos recursos, frequentou a alta sociedade inglesa. Viajou para os Estados Unidos, para a França num período de sucesso de suas obras, embora algumas sem êxito.

Preso por homossexualidade em 25 de janeiro maio de 1895 pelas suas relações com um "belo jovem", Alfred Douglas (Bosie), este homossexual assumido, provocando ataques de seu pai a Wilde que por causa disso o processou por difamação. O processo não fora desfavorável ao escritor resultando em sua prisão por sodomia. 

Seus livros foram retirados da prateleiras, suas peças do mesmo modo e ele caiu no ostracismo. 

Ao sair da prisão em 19 de maio de 1897 foi morar na França, continuou escrevendo, voltou por um tempo a se relacionar com Bosie até que, em 1900 dores de cabeça se tornaram insuportáveis. 

Operado do ouvido, uma melhora momentânea  até que em  30 de novembro, entrou em coma e faleceu, "mas seu último desejo havia sido atendido: ser recebido na Igreja Católica Romana".



“O Retrato de Dorian Gray” teria por inspiração a lenda do alemão Johann George Faust (data imprecisa do nascimento e morte 1480/1540) médico, mago e alquimista que se desiludira com os conhecimentos de sua época. Fizera, então, um pacto com diabo para se superar no conhecimento e não envelhecer.

Eu nada li sobre "Fausto", essas são informações de fácil manejo na internet, mas um dia pretendo desvendar lendo alguma obra sobre ele.

O conhecimento era realmente difícil naqueles idos. Basta conhecer um pouco a história de Leonardo da Vinci, na Itália, contemporâneo de Faust (Fausto), alemão, para que se constate como buscou ele (Leonardo) o conhecimento quebrando paradigmas no seu tempo com suas experiências e pesquisas além de quadros que pertencem à humanidade como é, entre outros, Mona Lisa. E sem pacto com o demo...




Dorian Gray era um jovem de beleza "sublime", "incomum", "apaixonante", esses podem ser os qualificativos dados por Wilde ao seu personagem.

E por essa beleza, servia ele de modelo, posando para o pintor Basílio Hallaward que se apaixonara por Gray e sua beleza.

O quadro pintado fora a obra prima de Basílio.

Esse quadro perfeito fora dado a Dorian Gray.

Mas, com a presença de Lord Henry Wotton [seria o alter-ego do Autor?], amigo de Basílio, num dado momento começou uma discussão sobre a velhice período em que todas as belezas físicas desvanecem.

Uma frase de Henry, bem a propósito: 

- Para se voltar à juventude, basta repetir as suas loucuras." 

Esse perspectiva da idade que avança e suas consequências físicas, passou a preocupar o jovem Dorian Gray que invoca o desejo de permanecer sempre jovem.

Todos pertencentes à elite londrina, levam uma vida de faustosa, entre jantares, reuniões e teatros. E Grey com períodos colecionando futilidades.

Mas, algum tempo depois, sempre ouvindo as considerações de Lord Henry, Gray sai em busca de "aventuras" e se dirige à periferia de Londres.

Para na frente dum pequeno teatro onde a peça interpretada era "Romeu e Julieta".

Resolveu entrar e assistir pelo menos o primeiro ato.

E então se depara com a Julieta, a "criatura mais adorável que eu jamais tinha visto em minha vida".

Era a jovem Sybil Vane, menina de dezessete anos. 

Ele se apaixona por ela que também por ele se apaixona e Grey fala até em casamento.

O irmão de Sybil, James Vane se preocupa com a paixão da irmã e promete sérias intervenções se fosse ela magoada pelo seu "príncipe encantador".

Mas, a paixão que se assenhoreou de Sybil a fez interpretar muito mal a mesma peça num outro dia, tendo na plateia Basílio e Henry convidados de Grey. Ela fora apupada pela plateia. Sua decepção foi tão grande que resolve interromper seu romance com ela.

Sybil desesperada, perdida na paixão, estirada no chão, lhe pede perdão.

Mas, ele se afasta. Ao chegar em casa, se depara com o seu quadro e constata que a expressão de seu rosto estava diferente. "Parecia haver um laivo de crueldade em sua boca. Era realmente estranho."

Que relação poderia haver entre a pintura e sua alma? Como se dera aquela mudança no quadro.

Pensou em voltar para Sybil, pedir-lhe perdão. Acordara muito tarde. Não houvera tempo. 

Pelo desgosto a jovem se suicidara. Dorian Grey se desespera mas a tragédia estava consumada.

Seguindo com a sua culpa as transformações no retrato assumira contornos animalescos. Então, ele esconde o quadro.

Passou-se o tempo e Dorian Gray passa a ser evitado por muitos membro da elite londrina, com fama de levar vida devassa, não detalhando a obra quais seriam os seus atos para tanto, apenas insinuações, mas ele frequentava lugares sórdidos buscando doses de ópio.

Um dia Basílio Hallaward o visita de surpresa expondo ao seu antigo modelo tudo o que de ruim dele se falava. Pede para ver o quadro. Ao contrário do que prometera, agora pretendia expô-lo num exposição em Paris. 
À negativa terminante de Grey, ele explica, por fim, que não poderia realmente expô-lo publicamente porque notara algo estranho na pintura que fizera e concluiu:

- Como disse Harry certa vez, você foi feito para ser adorado.

A personalidade de Dorian Grey afetava a personalidade do pintor. Basílio demonstra ciúmes em relação a Henry...

Tempos depois, bem tarde da noite, Basílio, na rua encontra Grey. Informa que passaria uns seis meses em Paris.

Rumam para a casa de Grey. Basílio volta a questionar Grey sobre relatos perversos que circulavam sobre ele.

Pede para ver o quadro. Grey finalmente permite que o pintor veja sua obra constatando então que se apresentava não aquele retrato de rosto perfeito, mas uma figura demoníaca.

Disse Grey que era o retrato de sua alma.

Basílio fala em fazerem oração em busca do perdão.

E, então, voltado-se Dorian Grey para o quadro num acesso de ódio esfaqueia o pintor mortalmente.

O pintor não fora visto entrando na casa de Grey e ficaria por cerca de 6 meses em Paris. Até ser descoberto o seu desaparecimento e o porquê, ninguém desconfiaria de Grey. 

Num episódio meio inexplicado, Grey chama e Alan Campbell, seu amigo de outrora que então o repudiava, químico experiente é chantageando, não sendo esclarecida qual a chantagem, obrigando-o a diluir o corpo do pintor com produtos químicos naquele sótão local no mínimo inapropriado. 

Depois de cinco horas, o corpo havia desaparecido. Naquele aposento, o cheiro insuportável de ácido nítrico.

Tempos depois, Campbell se suicidaria mas nada com esse trabalho sórdido que fora obrigado a praticar para salvar Dorian Grey da forca.

James Vane, por duas vezes tentou se vingar da morte da irmã Sybil. Da primeira vez escapara porque da morte da jovem haviam se passado 18 anos e ele Grey era ainda "muito jovem" para ser o culpado. James foi informado do erro que cometera pela aparência de Grey. 

Tempos depois, numa caçada, um companheiro de Grey atira em direção a um moita tentando atingir um coelho, mas acerta um homem escondido, exatamente James Vane que o espreitava ante de o atacar.

Dorian Grey exultou com a morte de James, porque dele se livrara sem culpa. 

O final da história, um "grito horrendo" após golpear com a mesma faca o retrato foi Grey encontrado estendido no chão, com a faca enterrada no seu coração. Era velho e cheio de rugas e "seu rosto causava repugnância".

E o quadro o apresentava com aquela beleza deslumbrante de sua juventude.


MORAL DA HISTÓRIA

Aquele "instante maldito" que o levara  "a implorar que o retrato suportasse o peso de seus dias" conservando imaculada a "eterna juventude" tem muito a ver com os recursos cosméticos e cirúrgicos, de preservar a juventude nos dias de hoje.

O tempo é inexorável. Com toda essa maquiagem passageira ou cirúrgica, não nos afasta de, num espelho, de corpo inteiro, olho no olho descobrirmos um pouco de nossa alma e o que ela realmente carrega de nossas culpas.

Basta experimentar.
 


























quarta-feira, 23 de outubro de 2019

A REVOLUÇÃO DOS BICHOS de George Orwell


LIVRO 65







"A Revolução dos Bichos" é um livro de 1945.

Se o leitor se puser a ler, como fiz eu, sem ler a contra capa e nada pesquisar, o seu desenrolar, embora protagonistas fossem os bichos da uma granja começa a perceber que simboliza gradativamente a instituição de um regime totalitário, ditatorial.  

O proprietário humano era o sr. Jones  Ele submetia todos os bichos ao trabalho penoso, aos maus tratos e pouca ração..

O velho porco Major, muito respeitado na granja, após um sonho que tivera lembra, numa reunião com todos os bichos,  que suas vidas eram miseráveis com muito trabalho até a última parcela das suas forças e quando enfraquecidos pelos tempo, seu fim não era natural mas cruelmente trucidados:

"Que fazer, então? Trabalhar dia e noite, de corpo e alma, para a derrubada do gênero humano. Esta é a mensagem que eu vos trago, camaradas, rebelião!

E ensina a melodia "Bichos da Inglaterra" que aprendera com sua mãe ainda como um leitãozinho em cuja letra enaltecia a liberdade dos bichos. Uma estrofe:

"Mais hoje, mais amanhã,
O Tirano vem ao chão,
E os campos da Inglaterra.
Só os bichos pisarão."

O porco Major logo morre de causas naturais, Afinal, fora ele um animal premiado.

Essas ideias passaram a fervilhar na mente dos animais até que um dia de revolta expulsaram da granja, violentamente, o sr. Jones e os demais humanos que com ele trabalhavam.

Dominada a granja pelos bichos, os mandamentos do animalismo eram sete, elaborados pelos porcos Bola-de-Neve e Napoleão:

1. Qualquer coisa que ande sobre duas pernas é inimigo;
2. O que andar sobre quatro pernas, ou tiver asas, é amigo,
3. Nenhum animal usará roupa;
4. Nenhum animal dormirá em cama;
5. Nenhum animal beberá álcool;
6. Nenhum animal matará outro animal;
7. Todos os animais são iguais.

E é fundada a Granja dos Bichos.

Bola-de-Neve e Napoleão enviavam pombos para outras granjas para que informassem sobre a rebelião que se dera na Granja dos Bichos ensinando a melodia do "Bichos da Inglaterra.

Então os bichos começaram a trabalhar muito, aumentando a ração de cada um.

Mas, já divisando a liderança absoluta da Granja, o porco Napoleão, incomodado com a influência de Bola-de-Neve que projetava construir um moinho de vento que, na sua concepção melhoraria a vida de todos, um dia lançou seus cachorros bravos contra ele. 

Bola-de-Neve fugiu da Granja e ao certo não se sabia do seu paradeiro. Estaria aliado com algum estancieiro vizinho?

Tudo o que de ruim acontecia, era obra clandestina do traidor Bola-de-Neve.

O porco Garganta, porta-voz de Napoleão e depois da casta dos porcos dirigentes sempre se referia à traição do porco expulso da comunidade.

A mudança mesmo da história porque Garganta fazia acreditar que Bola-de-Neve, herói da revolução fora nada mais que um oportunista.

Mas, sem mais Bola-de-Neve, Napoleão determinou que o projeto do moinho de vento fosse em frente, exigindo trabalho estafante dos animais que precisavam puxar pedras para suas paredes. Nessa tarefa o cavalo Sansão era um trabalhador incansável.

A Granja dos Bichos foi atacada pelos humanos enciumados pelos êxitos obtidos, inclusive do antigo dono, o sr. Jones, mas os animais venceram.

Então, Napoleão, porque os porcos eram os animais mais inteligentes, assumiu a liderança da Granja e passou a contrariar e modificar os mandamentos do animalismo; vestiu roupas que pertenciam ao sr. Jones,  arrumou umas insígnias fixando-as no peito, passou a dormir na cama da sede da granja - os outros animais continuavam dormindo nos estábulos sobre palha -, passou a consumir álcool "mas sem excesso" e alguns animais foram executados acusados de traição e por terrem mantido contato com Bola-de-Neve.

Por ordem de Napoleão, a Granja dos Bichos passou a fazer negócios com humanos (de duas pernas) vendendo parte da produção obrigando os animais todos a trabalharem mais e receberem menos ração.

A vida se tornara melhor ou pior se comparada aos tempos do sr. Jones? A ração era maior, a mesma ou menor do que a concedida pelo sr. Jones? Havia ou não mais tempo de trabalho?

Para surpresa geral dos animais os porcos dirigente começarem a andar sobre duas pernas (quem andasse sobre duas pernas era inimigo!)

Sansão que laborara tanto no carregamento das pedras para construção do moinho de vento, sentiu-se mal e foi encontrado estendido no chão. Seus colegas animais o socorreram e esperavam que Napoleão providenciasse ajuda médica para sua recuperação e depois, sua aposentadoria num terreno existente na granja.

Mas, para decepção geral, o carro que veio buscá-lo fora o do matadouro.

Mas, Garganta garantiu que aquele carro não era mais do matadouro, mas de socorro.

Mais tarde, anunciaria a morte de Sansão...

Por fim, os porcos dirigentes já aproximados dos humanos a ponto de fazerem recepções na casa grande.

Numa dessas recepções houve uma briga generalizada entre o humano sr. Pilkington numa trapaça havida num jogo de cartas.

Assim,

"As criaturas de fora olhavam de um porco para um homem, de um homem para um porco e de um porco para um homem outra vez, mas já era impossível distinguir quem era homem, quem era porco."

Motivações

Na edição que li, só se vai descobrir a inspiração real da história pelo posfácio e no prefácio do próprio Autor inserido no final do livro.

Quanto aos animais, o Autor se inspirou num cavalo de porte bastante chicoteado por um menino quando o animal vacilava nos caminhos a seguir. 

Se esse animal tivesse consciência da força que tem não aceitaria esse tratamento... desumano!

No tocante à transformação política que se dera na granja seguira o Autor o que se dera na União Soviética: o porco Napoleão representaria Josef Stalin, com toda sua truculência e assassinatos. 

Bola-de-Neve representaria o dissidente Leon Trotsky, rival de Stalin no comando do Partido Comunista. Trotsky foi assassinado em 1940 a mando de Stalin, no México onde se exilara, E Stalin morreu em 1953 por causa de hemorragia cerebral.

1984

Muitos dos episódios da Revolução dos Bichos  se assemelham a cenas do romance distópico "1984" do mesmo Orwell.

"1984" foi escrito em 1949. Desta série "1984" é o livro 12, podendo ser acessado por este link:

https://resenhadoslivrosqueli.blogspot.com/2017/07/12-1984-de-george-orwell.html










quinta-feira, 3 de outubro de 2019

TUPARI de Franz Caspar (Entre os índios nas florestas brasileiras)

LIVRO 64





Capa do livro.

Legenda da foto: Os feiticeiros acompanham, atentos, o comportamento dos espíritos
















Este livro está comigo há muito. Resolvi lê-lo sem o compromisso de o incluir neste blog porque a motivação fora apenas obter elementos da vida de indígenas brasileiros, após dar uma folheada em algumas de suas páginas.

Resolvi, incluir aqui, porque gostei muito do relato do Autor, um suíço "encantado" com os índios brasileiros e, com os Tupari viveu por quatro meses todos os usos e costumes da tribo. Esse convívio se deu na segunda metade do ano de 1948. 

O livro foi publicado por aqui pela "Melhoramentos", pelos idos dos primeiros anos da década de 50.

Franz Caspar era suíço, nascido em 17.09.1916 e falecido na Áustria em 13.04.1977, de modo inopinado, embora residisse em Zurique, Suíça.

Relata o Autor que naquele ano de 1948 estava na Bolívia e num estalo, resolvera conhecer e até conviver em aldeias indígenas conhecer índios verdadeiros.

Veio até o lado brasileiro e, após longa viagem, seguindo o traçado do rio Guaporé Mato Grosso (que deságua no rio Mamoré em Rondônia).



Minhas indicações: o quadro da esquerda localiza a aldeia Tupari do ponto de apoio do rio Guaporé; o quadro da direita, a localização a partir do rio Branco.

A legenda no livro desse quadro 2 (da direita) tem a seguinte explanação no livro: "Esboço do itinerário da marcha de São Luis para os Tupari. Como modelo, serviu de rascunho de Pedro, o criado preto. A linha tracejada assinala uma segunda rota, não percorrida pelo autor."



Pelo rio Branco chega à aldeia Tupari, que contava com duas malocas, com cerca de 200 indivíduos.

Recebido no começo com reservas porque se apresentara vestido numa população toda nua, homens e mulheres, com o tempo passou a fazer parte da comunidade, sendo muito querido.

Com Waitó, o cacique e pajé, o Autor firmara amizade de valor. As amizades que se estenderam aos demais membros da comunidade indígena pode constatar Caspar como eram bons e puros os indígenas.

Os tuparis trabalhavam muito em suas plantações de milho, mandioca, inhame e amendoim, tarefas que o Autor se integrou totalmente, como se membro fosse da tribo.

Saíam à caça e Caspar com sua espingarda ajuda a derrubar macacos, cuja carne é saborosa e, pelo que se soube no decorrer do relato, as práticas de canibalismo do passado revelavam que a carne humana tinha sabor bem semelhante ao do animal...

Nessas caçadas, são relatadas cenas de crueldade contra os animais abatidos mas que não chegam nem perto dos abatedouros de sempre.

Então, a alimentação básica, era a carne dos animais abatidos, milho, aipim (mandioca) e amendoim.

Para preparação de suas culturas, havia com muita regularidade, desmatamentos e até mesmo incêndios perigosos mas que não avançavam, pelo que se depreende do relato do Autor, além do "planejado".

Disse Waitó:

"- Essas fagulhas são perigosas: uma vez, elas queimaram a choça e as plantações de Tokürüru. Perderam-se mesmo as redes e o pessoal teve de dormir no chão, por muito tempo. Até uma criancinha morreu queimada".

[A comunicação se dava pelo português precário aprendido por alguns dos indígenas e pelas palavras que ia aprendendo o Autor dos tuparis].

Um relato dos trabalhos de abertura de terreno para o plantio:

"Nas últimas semanas, haviam trabalhado com afã. Calculei a floresta derrubada em cerca de dois hectares. Uns trinta homens se ocupavam no trabalho. Cada um usava um machado de ferro, alguns dos quais já eram bem gastos."

[Machados, facões e outras ferramentas eram obtidas dos "homens brancos" após prestarem os indígenas pequenos trabalhos de carregamento incluindo porções da borracha extraída em grande quantidade das seringueiras].





Legenda da foto no livro: "O Autor com a filhinha de Waitó, Kabátoa e a pequena vizinha Nyänkiab. Fotógrafo: cacique Waitó












A importância do milho e do aipim na produção da chicha

A chicha, produzida em grande quantidade, não poderia faltar na tribo, era uma bebida fermentada preparada com o sumo do milho esmagado e mandioca.

O Autor não explicou como se dava a fermentação. 

Vez por outra, na obra ele qualificava a chicha como "cerveja".

Então, com a produção permanente de chicha, a bebida era servida em inúmeras festas dando-se verdadeira bebedeira coletiva. 

Alguns bebiam até não aguentarem mais, mas então provocavam vômito para continuar bebendo!

A bebedeira ocasionalmente poderia produzir violência contra a mulher.

Quando estava o Autor já cansado da vida 'selvagem', no que se refere ao consumo de chicha disse:

"Havia outras coisas que se estavam tornando intoleráveis. As bebedeiras me enojavam cada vez mais."

Nudez

Com exceções, homens e mulheres tuparis naqueles idos de final da década de 40, andavam nus e não revelou o Autor abusos sexuais.

Mas, claro que havia o assédio, quem sabe o "amor" escondido por aquelas matas.

Mas o casamento era uma "instituição" que era quebrada se, depois de um tempo, o casal não tivesse filho.

Tanto carinho recebeu o Autor que a tribo toda pedia que ele ficasse para sempre entre os tuparis, se casasse e esquecesse sua aldeia de outras terras.

Então, tanto o cacique como sua esposa se esforçaram muito para que ele aceitasse e se casasse com Tonga, uma índia já madura, vesga mas muito carinhosa.

E ela própria o assediava a ponto de deitar uns instantes em sua rede.

Mas, ele resistiu o quanto pode e ao se despedir ouviu de Tonga uma frase que disse jamais ter esquecido:

"Queria dar-lhe, pois, à despedida, uma pequena lembrança.

- O que você quer das minhas coisas? perguntei-lhe, um espelho, um pente ou o quê?

Tonga olhou-me com seus olhos vesgos e respondeu-me baixinho:

- Para que você quer dar-me alguma coisa? Você vai embora e eu vou morrer aqui.

Com lágrimas o Autor foi se despedindo e ao olhar para trás todos os tuparis estavam reunidos e acenando com as mãos, flechas, espadas... Francisco, Francisco...

A origem da humanidade

O relato inicial da origem da humanidade é curioso porque antigamente a terra não era povoada e no céu não havia nenhum Kiad-pod (pajés primitivos).

Havia somente um grande bloco de pedra. Esse bloco era uma mulher que se abriu e entre torrentes de sangue, deu à luz um homem, a Waledjád. Mais uma vez o bloco se abriu e nasceu um outro homem. Chamou-se Wab. Ambos eram pajés.

Como não tinham mulher, mataram um aguti (uma das espécies de roedores, gambá) e com os dentes da frente do animal, esculpiram uma companheira para cada um deles e, dai nasceram os outros pajés primitivos os Wamoa-pod.

Waledjád era muito mal e ao se zangar chovia copiosamente a ponto de inundar toda a terra, morrendo afogados Wamoa-pod.

E aí, o meio encontrado para se livrar de Waledjád foi desterrá-lo a um lugar ao norte vivendo numa choça de pedra.

Mesmo assim, quando se zanga faz chover muito nas terras Tupari,

Os que se interessarem em expandir esse tema, sugiro acessar o portal abaixo que até mesmo transcreve páginas do livro de Franz Caspar:
https://pib.socioambiental.org/pt/Povo:Tupari



Diz o Autor que quando conviveu com os indígenas, eram certa de 200 indivíduos da aldeia Tupari. Quando voltou em 1955 não contou mais do que 60 sobreviventes, vítimas de epidemia de sarampo. E todos vestidos.


O livro é muito mais do que ora relato.

O que posso dizer é que gostei muito.

Tenho comigo obras do sertanista Willy Aureli que vou reler e ler e, com o tempo, farei a resenha, quem sabe, de mais de uma obra reunidas.